Extracção parcial do Plenário de 15 de Junho de 1978

 

Presidente Carlos Assunção: Está reaberta a sessão.

Vamos prosseguir com o projecto de lei sobre a venda, exposição e exibição públicas de material pornográfico e obsceno.

Este projecto de lei, depois de apreciado por uma sub-comissão, foi visto pela Comissão de Administração Pública e Autarquias Locais e veio hoje à apreciação do Plenário.

Está aberto o debate na generalidade.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Rangel.

Jorge Rangel: Queria fazer uma observação que me parece pertinente.

Já que se fez uma alteração de fundo quanto à ideia inicial do diploma, gostava de dizer que adoptámos a legislação vigente em Portugal relativamente a esta matéria e adaptámo-la à realidade de Macau. Foi criada uma sub-comissão que apreciou a matéria e na última reunião, em que não estive presente, parece ter sido adoptado um critério diferente daquele em que tínhamos acordado no início.

Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Diamantino Ferreira.

Diamantino Ferreira: Sr. Presidente.

Hoje, não me sinto inspirado para fazer uso da palavra, já que estou fatigado mas, ainda assim, gostaria de dizer que o que este projecto pretende é combater a venda, exposição e exibição pública de material pornográfico e obsceno, mas de uma forma eficiente.

Só o vamos conseguir se seguirmos a via que está presente no projecto, que até pode desagradar a muitos sectores mas, sejamos realistas: não nos podemos esquecer do artigo 37.º da Constituição da República, sobre a liberdade de expressão e informação. Também não nos podemos esquecer que este Território está sujeito à Constituição portuguesa.

Presidente: Creio que todos sabemos que a Assembleia não se livrará de algumas críticas quanto este diploma for aprovado. Talvez possamos dizer no preâmbulo que não interessam as taxas e que a sua única função é dar eficácia à própria lei.

Se o Plenário achar que há conveniência em que estejam presentes os Deputados chineses para que se pronunciem, podem requerer o adiamento desta proposta para sessão ulterior, e passamos à contribuição predial.

Diamantino Ferreira: Sr. Presidente, eu formalizo essa proposta de adiamento, até porque só dispomos de 60 minutos. Possivelmente, não conseguiremos aprovar este diploma em 60 minutos.

Kwong Bing Yun: Sr. Presidente, Srs. Deputados,

Peço desculpa, vou ter que roubar-vos alguns minutos.

Do meu ponto de vista, acho que, entre o Ocidente e o Oriente, existe uma grande discrepância nos valores da moral. Por outras palavras, enquanto que, para os ocidentais, esta questão não é contra o pudor público, para os do Oriente, nomeadamente para nós, chineses, esta é uma coisa muito má. Concordo com aquilo que foi dito pelo Sr. Deputado Peter Pan, ou seja, para os chineses de Macau, a pornografia em filmes, publicações ou até em jornais á considerada nociva. Por outro lado, para o bem dos nossos jovens, devemos condicionar ou proibir a pornografia através da feitura de legislações bem rígidas e duras, independentemente da metodologia ou forma. Além disso, para o bom nome de Macau, é necessário proibir seriamente os materiais pornográficos. Vou dar um exemplo: No mês passado, aconteceu-me uma coisa que fez me sentir muito triste. Veio a Macau uma delegação religiosa de Hong Kong, e disseram-me, na altura, que em Macau há duas coisas muito famosas. Até lá não sabia de que é que estavam a falar, por isso, fui perguntar a eles que coisas são. Responderam-me que são duas coisas salgadas: filmes "salgados" (i.e. pornográficos) e água salgada. Através disto podemos ver que o nome de Macau está prejudicado. Daí, acho que devemos ter legislações mais duras para condicionar ou vedar as publicações ou filmes pornográficos. São estas as minhas opiniões.

Desculpem-me por ter roubado o vosso tempo.

Jorge Rangel: Sr. Presidente, dá-me licença que abuse mais um pouco da sua paciência?

Vou ser muito breve.

Em relação ao que o Sr. Deputado Peter Pan disse, que 99% da população chinesa é contra os artigos pornográficos, isso talvez seja verdade mas, às vezes, fico com dúvidas sobre isso. Vejo que as casas de espectáculos apresentam filmes considerados impróprios por esses 99% da população, mas elas estão cheias! Quem enche as casas de espectáculos são pessoas de nacionalidade chinesa.

Posso citar um caso muito concreto e que respeita a uma pessoa que, por cinco vezes, protestou perante mim, na qualidade de presidente da Comissão de Assuntos de Espectáculos, contra a exibição de filmes pornográficos e que continua a ver filmes pornográficos. Essa pessoa, que até tem algumas responsabilidades pela profissão que desempenha, foi ver três vezes um filme, de que muito se falou, e que passou em Macau há algum tempo, sendo exibido pelas 11 horas da noite sempre com casa cheia. Não faltou sequer gente de Hong Kong para o ver. No entanto, protestou cinco vezes contra a exibição deste tipo de filmes. Quando lhe perguntei por que razão o foi ver três vezes, disse-me que gostava de ver esse tipo de filmes, ainda que não concordasse com a sua exibição.

A melhor solução para acabar com a exibição de filmes pornográficos em Macau passa por esses 99% de pessoas que não gostam de artigos e filmes pornográficos não consumirem esse tipo de produtos. Se assim fizerem, os produtos dessa natureza desaparecerão das lojas e as empresas que exploram as casas de espectáculos não exibirão mais filmes pornográficos, por tal representar um grande prejuízo para si, o que não acontece actualmente.

Presidente: Queria apontar o seguinte.

As razões apresentadas para se propôr o adiamento da discussão deste projecto, ainda que com interesse, não garantem que na próxima sessão plenária tenhamos aqui a imprensa chinesa ou outros Deputados chineses. Parece-me que a solução seria requerer, nos termos do artigo 60.º do Regimento, a alteração da sequência das matérias. Qualquer Deputado pode requerer ao Plenário, sem expôr o motivo, a alteração da sequência das matérias fixadas para cada reunião.

Se o Plenário assim o entender, poderá deliberar nesse sentido.

Portanto, em vez de deliberarmos que isto fica dependente daqueles factos já apresentados, limitávamo-nos apenas a alterar a sequência das matérias fixadas. Creio que é mais fácil e se chega ao mesmo resultado.

Se quiserem nesse sentido formular um requerimento...

Diamantino Ferreira: Queria esclarecer que não estamos aqui a angariar mais votantes. Estamos à espera de mais opiniões. Fique claro o meu requerimento. Não pretendo arranjar o maior número de pessoas para votar esta lei. Pretendo, isso sim, ouvir opiniões dos Srs. Deputados, porque aqui há um factor que importa considerar. Já que falamos de desníveis em matérias salariais, há aqui também um desnível em matéria etária, uma vez que há Deputados menos novos que nós e que podem dar uma contribuição importante. Quanto a nós, talvez devido à idade, tenhamos uma maneira diferente de ver o problema. Não estamos aqui em campanha eleitoral.

Presidente: Bom. Sim, faz favor.

Mário Isaac: Realmente, quando fiz a observação, não pretendia vincular a Assembleia a números ou percentagens. Parece-me evidente que toda a gente percebeu isso.

Acho muito feliz a solução que o Sr. Presidente pretende que a Assembleia dê ao caso.

Evidentemente, pode andar sempre na Ordem do Dia e pode ser sempre alterada a posição.

Simplesmente, devo lembrar ao Dr. Diamantino Ferreira que, nestes assuntos de pornografia e erotismo, os mais velhos são, normalmente, conservadores. Aceito já, de caras, que os mais velhos que agora faltam nesta reunião representam votos contra.

Muito obrigado.

Presidente: Vou pôr à votação a alteração da sequência das matérias.

Os Srs. Deputados que concordam, deixem-se estar como estão. Os que discordam, queiram levantar o braço.

(O Plenário procedeu à votação)

Presidente: Foi aprovada.

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Em virtude dos problemas verificados aquando das gravação, resultou a impossibilidade de passar a escrito a acta da intervenção.