COMISSAO DE JUSTICA E SEGURANCA

Parecer n.º 2/96

Assunto: Aprovacao na especialidade dos projectos de lei sobre: “Jogo ilícito”, “Ilícitos penais relacionados com corridas de animais” e “Alteracoes às Leis n.ºs 1/78/M, de 4 de Fevereiro e 4/85/M, de 25 de Novembro, ao Decreto-Lei n.º 30/92/M, de 22 de Junho, ao Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 16/93/M, de 28 de Abril e à Lei n.º 2/93M, de 17 de Maio”.

Os projectos de lei em epígrafe foram aprovados, na generalidade, por votacao unanime dos Senhores Deputado presentes na reuniao plenária de 27 de Junho de 1996, tendo no mesmo Plenário sido deliberado, ao abrigo do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento da Assembleia Legislativa, submeter à comissao competente a votacao na especialidade dos mesmos projectos de lei.

A Comissao de Justica e Seguranca deu cumprimento a esta deliberacao em reuniao efectuada no dia 28 de Junho e que contou com a presenca de um representante do Executivo.

 

I.

1. No que respeita ao projecto de lei relativo ao jogo ilícito a Comissao aprovou, por unanimidade, o texto em apreciacao alterando apenas a epígrafe do artigo 9.º, no texto original idêntica ao título do Capítulo II “Lotarias e apostas mútuas ilícitas”, que passa a ter a seguinte redaccao: “(Organizacao ilícita)”.

2. O texto aprovado pela Comissao pode ser enviado ao Plenário para votacao final global.

3. A Comissao gostaria de transmitir ao Executivo uma preocupacao, veiculada por um dos seus membros, dando conta do desconhecimento da populacao sobre alguns conceitos técnicos a que se faz apelo nesta lei, designadamente, o conceito de “apostas mútuas”, pelo que recomenda vivamente que, no uso da faculdade prevista no projectado artigo 23.º, a Direccao de Inspeccao e Coordenacao de Jogos, como forma de prevenir eventuais ilícitos relacionados com o jogo, divulgue junto da populacao a lei aprovada e esclareca quais as condutas ilegais de acordo com a nova lei.

 

II.

O texto relativo aos “ilícitos penais relacionados com corridas de animais” foi unanime e integralmente aprovado, na especialidade, pela Comissao, estando em condicoes para ser enviado a Plenário para votacao final global.

 

III.

1. O projecto de lei de “Alteracoes às Leis n.ºs 1/78/M, de 4 de Fevereiro e 4/85/m, de 25 de Novembro, ao Decreto-Lei n.º 30/92/M, de 22 de Junho, ao Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 16/93/M, de 28 de Abril e à Lei n.º 2/93/M, de 17 de Maio”, foi objecto de algumas alteracoes, na sequência de uma proposta do Executivo transmitida à Comissao após a entrada formal do projecto de lei na Assembleia Legislativa, e de observacoes feitas pelo representante do Executivo, no Plenário em que se procedeu à votacao na generalidade do projecto de lei em apreciacao e que foram consideradas relevantes atentos os interesses a proteger.

2. Assim, em resposta a uma preocupacao manifestada pelo Gabinete do Senhor Secretário-Adjunto para a Seguranca, relacionada com dificuldades de procedimento penal nos casos de ofensas corporais perpetradas a rogo de organizacoes vocacionadas para a prática de actividades delituosas quando esse procedimento dependa de queixa do ofendido, a Comissao aprovou a repristinacao do artigo 14.º da Lei n.º 1/78/M, de 4 de Fevereiro, revogado pela alínea m) do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 58/95/M, de 14 de Novembro, que aprovou o Código Penal de Macau.

2.1. O artigo 14.º ora repristinado foi objecto de harmonizacao com a nova disciplina penal, expurgando-o da referência à pena de prisao maior e da remissao legislativa desactualizada, e considerando o crime nele previsto crime público.

2.2. Esta alteracao passa a constar do artigo 2.º do projecto de lei em apreciacao, sendo renumerados os artigos seguintes em conformidade.

A redaccao aprovada na Comissao para o artigo 2.º é a seguinte:

 

Artigo 2.º

É repristinado o artigo 14.º da Lei n.º 1/78/M, de 4 de Fevereiro, com a seguinte redaccao:

 

Artigo 14.º

(Ofensas corporais qualificadas)

1. As ofensas corporais cometidas por dois ou mais indivíduos, actuando concertadamente, com armas proibidas ou outros meios que possam por em risco a vida ou a saúde ao ofendido, sao punidas, consoante os seus resultados caibam na previsao dos artigos 137.º ou 138.º do Código penal, com a pena aplicável ao crime respectivo agravada de um terco nos seus limites mínimo e máximo.

2. O procedimento penal nao depende de queixa.”

3. O teor do novo artigo 2.º e as restantes alteracoes à Lei 1/78/M, constantes do projecto em apreciacao, tal como as alteracoes propostas para a Lei n.º 4/85/M, foram objecto de aprovacao unanime na especialidade.

4. No que respeita às alteracoes propostas para o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 30/92/M, de 22 de Junho, foram novamente suscitadas as reservas manifestadas aquando da aprovacao na generalidade do projecto de lei em análise, defendendo-se a manutencao da insubstituibilidade da pena de prisao por multa nos casos de especulacao de títulos de transporte.

4.1. Sobre esta matéria a Comissao teve presente a proposta de lei n.º 7/V/95, para aprovacao de um novo regime jurídico das infraccoes antieconómicas e contra a saúde pública, apresentada pelo Executivo em 30 de Maio de 1995, da qual constava a proposta de revogacao do Decreto-Lei n.º 30/92/M e se pretendia dar nova disciplina à especulacao sobre títulos de transporte.

4.2. No n.º 5 do artigo 33.º da referida proposta de lei, previa-se a insubstituibilidade da pena de prisao por multa apenas “quando a infraccao for praticada com o concurso da circunstancia prevista na alínea d) do artigo 5..º”,norma que por sua vez dispunha “ter o infractor aproveitado o estado de premente carência do adquirente, consumidor ou vendedor”.

4.3. A Comissao competente considerou nao ser pertinente a inclusao desta matéria no regime jurídico supramencionado, alertando contudo para a necessidade de harmonizacao deste normativo legal com o novo Código Penal, tarefa a que a Comissao de Justica e Seguranca nao se escusou.

4.4. Tendo em atencao a abertura indiciada no texto proposto pelo Executivo para a possibilidade de fornecer ao juiz maior margem de manobra na escolha da medida punitiva mais adequada ao caso concreto, impondo a regra da insubstituibilidade apenas no caso referido na mencionada alínea d) do artigo 5.º, a Comissao optou pela aplicacao da regra geral da substituibilidade da pena de prisao por multa, opcao que entendia consubstanciar uma mais perfeita harmonizacao com a nova filosofia penal.

4.5. Contudo, reconhecendo a excepcionalidade do regime em causa tendo em atencao o objectivo propugnado, de combate ao crime organizado, a Comissao entendeu rever a sua posicao tendo aprovado a manutencao da insubstituibilidade da pena de prisao por pena de multa, donde resulta a seguinte redaccao para o n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 30/92/M, de 22 de Junho:

 

“Artigo 1.º

1. Quem vender ou revender títulos de transporte de passageiros entre Macau e o exterior, ou documentos suficientes à sua obtencao, por preco superior ao preco aprovado pela entidade competente, é punido com a pena de prisao até três anos insubstituível por multa.”

4.6. A Comissao pronunciou-se ainda sobre a necessidade de adequar a remissao do direito subsidiário aplicável constante do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 30/92/M, tendo em atencao a nova designacao proposta pela Comissao de Economia e Financas para a proposta de lei que regula as infraccoes económicas, a qual foi objecto de aprovacao na generalidade no Plenário de 25 de Junho.

4,7. Foi aprovado o seguinte texto para o artigo 4.º do Decreto-lei supramencionado:

 

“Artigo 4.º

(Direito subsidiário)

É subsidiariamente aplicável o Regime jurídico das Infraccoes contra a Saúde Pública e a Economia.”

5. Introduzidas as alteracoes enunciadas, os artigos do projecto de lei relativos ao Decreto-Lei n.º 30/92/M, foram unanimemente aprovados, na especialidade.

6. A fixacao em dias das penas de multa aplicáveis às contravencoes previstas no Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 16/93/M, de 28 de Abril, suscitaria viva reaccao do Executivo, que defende a manutencao do regime vigente, que fixa as penas de multa em quantia, por limitar a margem de discricionariedade do juiz que aprecia o ilícito contravencional, entendendo que a fixacao das multas em dias poderia atingir valores excessivos e desconformes com a gravidade das infraccoes no caso do infractor dispor de boas condicoes económicas e financeiras.

6.1. O Executivo lembrou a resistência inicialmente oposta à aprovacao do Código da Estrada que viu a sua vigência sucessivamente adiada por falta de condicoes para a sua implementacao.

6.2. Esta questao nao pode deixar de relacionar-se com a opcao de política criminal assumida no Código da Estrada e, num ambito mais geral, no direito penal vigente no Território, de atribuir natureza contravencional ao tipo de ilícitos objecto de alteracao. Em Portugal a caracterizacao deste tipo de ilícito como contra-ordenacao permite o sancionamento através da aplicacao de coimas, opcao que poderia ter sido seguida em Macau.

6.3. No entanto, apesar da referência que feita na alínea d) do n.º 1 do artigo 31.º do Estatuto Organico de Macau aos ilícitos de mera ordenacao social, nunca a Assembleia Legislativa ou o Governador procederam à regulamentacao deste tipo de ilícitos, pelo que à luz do Código Penal vigente, as penas de multa sao fixadas em dias quando se trate de ilícitos criminais ou contravencionais e em quantia quando se trate de ilícitos administrativos.

6.4. A Comissao, norteada pelo propósito de harmonizacao do diploma em referência com o novo regime penal, propos a reformulacao das penas de multa, reconhecendo, todavia, que nalguns casos os limites fixados podem atingir valores demasiado elevados. No entanto, no decorrer do processo legislativo, esses limites podem ser modificados, nao esquecendo que nos casos em que nao se regista a intervencao valorativa do juiz está garantida a aplicacao da multa pelo seu valor mínimo por forca do disposto no artigo 80.º n.º 2 do Código da Estrada.

6.5. O Executivo considera, contudo, preferível a manutencao do actual sistema de fixacao das penas de multa em quantia e, com a moldura vigente, uma vez que se trata de valores aceites pela comunidade depois de uma ampla participacao de vários sectores da sociedade local na sua determinacao.

6.6. A Comissao analisou a hipótese de fixar valores únicos para as penas de multa mas considerando salvaguardada a margem de discricionaridade das autoridades administrativas no caso de pagamento voluntário das penas aplicadas a contravencoes nao puníveis com pena de prisao, nao vê inconveniente na subsistência do actual regime.

6.7. Assim sendo, ponderados os argumentos invocados pelo Executivo, pese embora o desvio à regra da fixacao das multas em dias perfilhada pelo Código Penal no que respeita aos ilícitos contravencionais, a Comissao deliberou eliminar as alteracoes anteriormente propostas em matéria de multas, donde resultam as seguintes alteracoes ao projecto de lei em apreciacao:

a) Mantém-se a epígrafe e o aditamento de um n.º 5 ao artigo 68.º do Código da Estrada, nao se introduzindo outras alteracoes à disposicao em vigor;

b) Nao se propoe qualquer alteracao ao artigo 69.º do Código da Estrada, transpondo as redaccoes propostas no projecto de lei para os números 2, 3 e 4 deste artigo para um novo artigo, a aditar ao Código da Estrada, com o número 64:o-A que passa a constar do artigo 6.º do projecto de lei em apreciacao e que merecendo a aprovacao unanime da Comissao, se transcreve:

 

“Artigo 6.º

É aditado um artigo 64.º-A ao Código da Estrada aprovado pelo Decreto-Lei n.º 16/93/M, de 28 de Abril, com a seguinte redaccao:

 

Artigo 64.º-A

(Ocupacao perigosa da via pública)

1. Quem, sem autorizacao da autoridade competente, organizar na via pública corridas de velocidade ou outras provas desportivas de veículos com motor, criando com essa conduta perigo para a vida, perigo grave para a integridade física de outrem ou perigo para bens patrimoniais alheios de valor elevado, é punido com pena de prisao até 3 anos, se outra pena mais grave lhe nao couber por forca de outra disposicao legal.

2. Quem participar nas corridas ou provas desportivas referidas no número anterior conduzindo veículo com motor é punido com pena de prisao até 3 anos, se outra mais grave lhe nao couber por forca de outra disposicao penal.

3. Quem for encontrado em lugar onde se realizem as corridas ou provas desportivas referidas no n.º1 e por causa delas, é punido com pena de prisao até 2 anos ou com pena de multa.”

c) Foram eliminadas as alteracoes propostas para os artigos n.ºs 70.º e 72.º que mantêm a redaccao em vigor.

7. Aprovadas as relatadas alteracoes ao Código da Estrada, a Comissao de Justica e Seguranca, considera o texto final aprovado para o projecto de lei em apreciacao em condicoes de ser enviado ao Plenário para votacao final global.

8. Fazendo eco das dúvidas suscitadas em Portugal pelo regime aplicável às provas obtidas através de aparelhos de controlo de velocidade colocados nas vias de circulacao, de duvidosa constitucionalidade, a Comissao sugere ao Executivo que para melhor assegurar a fiabilidade de tais aparelhos, se cometa a uma entidade exterior à Polícia de Seguranca Pública a sua fiscalizacao e controlo.

9. Concluida a votacao na especialidade dos três projectos de lei supra-referenciados, a Comissao de Justica e Seguranca anexa os textos aprovados para votacao final global em Plenário, sugerindo a utilizacao da faculdade prevista no n.º 2 do artigo 37.º do EOM.

Macau, aos 3 de Julho de 1996.

A Comissao, Rui Afonso (Presidente) –– Raimundo do Rosário –– Lau Cheock Va –– Peter Pan –– António Correia (Secretário).