NOTA JUSTIFICATIVA

Nos termos da lei civil vigente em Macau, a alienação e a oneração de bens imóveis têm de ser efectuadas através da celebração de escritura pública.

Acontece, porém, que, na realidade, actos de alienação e hipoteca de propriedade de imóveis têm vindo a ser efectuados, em grande número, mediante a assinatura de um documento contratual entre o comprador, o vendedor e o banco, documento este que é denominado "contrato tripartido".

Dado que o "contrato tripartido" não é um meio formal previsto legalmente para adquirir a propriedade de um imóvel, nem tão pouco pode servir de título para proceder ao registo definitivo dos direitos sobre imóveis, a segurança dos direitos das partes não se encontra protegida pela lei vigente, no caso de surgir um conflito de direitos.

Apesar de se tratar de um modo de transacção de imóveis não formalmente previsto pelo regime jurídico vigente, o recurso aos "contratos tripartidos" tem vindo a ser bastante generalizado, desde há longo tempo. Para proteger a segurança e a estabilidade do mercado de imóveis, que constitui um dos principais pilares económicos de Macau, salvaguardar os direitos e interesses das partes envolvidas nas transacções, assegurar a confiança dos investidores do exterior e, ao mesmo tempo, adaptar a aplicação do novo regime jurídico que transforma o imposto da sisa em imposto do selo, elabora-se a presente proposta de lei, na esperança de que, dando cumprimento aos princípios fundamentais do regime jurídico da lei civil em vigor, se consagram disposições mais claras quanto à natureza, conteúdo, forma e efeitos dos "contratos tripartidos", de modo a assegurar uma maior protecção conferida pelo regime jurídico aos direitos das partes envolvidas.

 


 

REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU

Lei n.º /2001

(Proposta de Lei)

Promessas de alienação e oneração hipotecária de imóveis

A Assembleia Legislativa decreta, nos termos da alínea 1) do artigo 71.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau, para valer como lei, o seguinte:

 

Artigo 1.º

Nomen iuris e estrutura típica

Designa-se contrato de mútuo com promessa de compra e venda e promessa de constituição de hipoteca voluntária, doravante apenas "contrato de mútuo com promessas", o contrato-tipo trilateral, de conteúdo misto, que compreende, cumulativa e exclusivamente, as seguintes relações jurídicas:

1) Uma promessa bilateral de compra e venda de imóvel;

2) Um mútuo, destinado a financiar a aquisição do imóvel objecto da promessa de compra e venda, celebrado com o promitente-comprador, na qualidade de mutuário; e

3) Uma promessa, celebrada entre o mutuante e o mutuário, de constituição, a favor do mutuante e para garantia do mútuo, de hipoteca voluntária sobre o imóvel objecto de compra e venda.

 

Artigo 2.º

Forma

1. O contrato de mútuo com promessas é celebrado por simples documento particular.

2. As assinaturas dos contraentes são objecto de reconhecimento notarial.

3. Sendo qualquer dos contraentes pessoa colectiva, a qualidade e os poderes do seu representante são verificados nos termos gerais.

 

Artigo 3.º

Efeitos

1. A atribuição de eficácia real às promessas do contrato referido no artigo 1.º depende da declaração expressa e inscrição no registo, nos termos do n.º 1 do artigo 407.º do Código Civil.

2. Ao contrato de mútuo com promessas não se aplica o disposto no n.º 2 do artigo 407.º do Código Civil.

3. O mutuante tem a faculdade de se sub-rogar ao mutuário no exercício dos direitos previstos no artigo 820.º do Código Civil que a este assistem, na qualidade de promitente-comprador fiel, contra o promitente-vendedor faltoso.

 

Artigo 4.º

Registo

1. Os factos previstos nas alíneas 1) e 3) do artigo 1.º estão sujeitos a registo, o qual é efectuado em simultâneo com base em contrato de mútuo com promessas.

2. O registo efectua-se, respectivamente, através de inscrição das promessas de alienação e de oneração, nos termos e para os efeitos da alínea f) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do Registo Predial, obrigatoriamente, em simultâneo.

3. O extracto de qualquer das inscrições previstas no número anterior deve conter, para além das menções gerais e especiais estabelecidas, respectivamente, no artigo 88.º e na alínea d) do n.º 1 do artigo 90.º do Código do Registo Predial:

1) A menção de que o facto inscrito emerge de contrato de mútuo com promessas, e que este foi celebrado ao abrigo do regime estabelecido na presente lei; e

2) A identificação de todos os outorgantes e da data da celebração desse contrato.

4. O extracto da inscrição da promessa de oneração hipotecária emergente de contrato de mútuo com promessas deve conter, ainda, as menções especiais previstas no artigo 91.º do Código do Registo Predial, com as devidas adaptações.

5. O cancelamento da inscrição da promessa de aquisição depende de autorização escrita e prévia do mutuante com reconhecimento presencial de assinatura.

6. Os contratos prometidos de compra e venda e de constituição de hipoteca são registados por averbamento às respectivas inscrições de promessa.

 

Artigo 5.º

Contratos prometidos

1. Os contratos prometidos de compra e venda e de constituição de hipoteca são sempre celebrados em conjunto, sem prejuízo do disposto no número seguinte.

2. É nulo o contrato prometido de compra e venda desacompanhado da constituição de hipoteca, salvo autorização escrita e prévia do mutuante, constante ou não do contrato de mútuo com promessas, e da qual é feita menção expressa na escritura pública de compra e venda.

3. O contrato prometido de constituição de hipoteca voluntária pode destinar-se ainda a garantir outras facilidades de crédito que venham, até à sua celebração, a ser acordadas entre o mutuante e o mutuário.

 

Artigo 6.º

Obrigações fiscais e emolumentos registrais

1. Sobre o contrato de mútuo com promessas apenas incide imposto do selo que é cobrado de acordo com o Regulamento do Imposto do Selo.

2. Pelo registo de contrato de mútuo com promessas e dos factos a ele relacionados, são devidos emolumentos de acordo com a Tabela de Emolumentos do Registo Predial.

 

Artigo 7.º

Direito inter-temporal

1. Com as especialidades estabelecidas no número seguinte, a presente lei pode aplicar-se a todos os contratos de pretérito que, preenchendo os requisitos previstos no artigo 1.º, ainda não tenham sido integralmente cumpridos.

2. A atribuição de eficácia real às promessas de compra e venda e de constituição de hipoteca constantes dos contratos de pretérito depende da verificação das condições previstas no n.º 1 do artigo 3.º da presente lei, podendo a declaração ser feita por documento avulso com reconhecimento notarial de assinatura dos contraentes.

 

Artigo 8.º

Contratos de promessa de compra e venda

A presente lei aplica-se, com as necessárias adaptações, a todos os contratos de promessa de compra e venda de imóveis.

 

Artigo 9.º

Alteração ao Código do Registo Predial

1. O artigo 2.º do Código do Registo Predial passa a ter a seguinte redacção:

 

Artigo 2.º

Factos sujeitos ao registo

1. (…)

a) (…)

b) (…)

c) (…)

d) (…)

e) (…)

f) A promessa de alienação ou oneração, os pactos de preferência e a disposição testamentária de preferência, se lhes tiver sido atribuído eficácia real;

g) (…)

h) (…)

i) (…)

j) (…)

k) (…)

l) (…)

m)(…)

n) (…)

o) (…)

p) (…)

q) (…)

2. (…)

2. São aditados os n.º 5 e n.º 6 ao artigo 13.º do Código do Registo Predial:

 

Artigo 13.º

Prazos especiais de caducidade

1. (…)

2. (…)

3. (…)

4. (…)

5. Os registos de promessa de alienação e oneração, previstos na alínea f) do n.º 1 do artigo 2.º, caducam decorridos 3 anos.

6. Os registos referidos no número anterior podem ser renovados, por 2 únicos períodos sucessivos de 1 ano, a pedido dos respectivos promitentes, mediante documento que comprove a razão da sua subsistência.

 

Artigo 10.º

Direito subsidiário

Ao regime jurídico estabelecido na presente lei aplica-se, em tudo quanto não contrariar a natureza especial daquele, o disposto no Código Civil e no Código do Registo Predial.

 

Artigo 11.º

Revisão

A presente lei será revista dentro de dois anos a contar da data da sua entrada em vigor.

 

Artigo 12.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Aprovada em de de 2001.

A Presidente da Assembleia Legislativa, Susana Chou.

Assinada em de de 2001.

Publique-se.

O Chefe do Executivo, Ho Hau Wah.