Extracção parcial do Plenário de 16 de Junho de 1978

 

Presidente Carlos Assunção: Está aberta a sessão.

Não havendo oradores inscritos para o período antes da Ordem do Dia, passamos já à matéria da Ordem do Dia, que consta hoje de dois assuntos.

O primeiro, respeitante ao projecto de lei sobre a venda, exposição e exibição públicas de material pornográfico e obsceno. O segundo, para a apreciação do projecto do regulamento de construção predial urbana.

Ponho, em primeiro lugar, à apreciação na generalidade, o projecto de lei relativo à venda, exposição e exibição públicas de material pornográfico e obsceno.

Este projecto foi apresentado na sessão legislativa do ano passado e não pôde ser ainda apreciado pelo Plenário em virtude de outras leis que se consideraram mais urgentes, especificadamente, a reforma tributária, que esta Assembleia resolveu desdobrar em 4 projectos diferentes, um para cada um dos impostos directos: contribuição industrial; imposto profissional; contribuição predial urbana e imposto complementar de rendimentos.

Está, portanto, aberto o debate na generalidade do referido projecto de lei.

Tem a palavra o Deputado Ma Man Kei.

Ma Man Kei: Sr. Presidente,

Depois do debate de ontem, sobre a questão da venda pública do material pornográfico e obsceno, já hoje, os jornais estão a comentar. Por outro lado, um grupo de pessoas que se preocupam com a moral pública de Macau, apresentou algumas opiniões, dizendo que este projecto de lei não prevê quaisquer medidas sérias que proíbam a venda de publicações pornográficas, permitindo ainda a exibição de filmes. Portanto, deseja que esta Assembleia Legislativa tome medidas concretas para que as publicações e os filmes pornográficos não venham a inundar a cidade de Macau.

Há pouco, eu, o Sr. Deputado Peter Pan e outros Deputados, estivémos a discutir este assunto, ou seja, sabendo que, nos termos do artigo 37º da Constituição Portuguesa não é permitida a proibição total da edição dessas publicações. Assim, como é que esta Assembleia vai conseguir legislar para que as publicações e filmes pornográficos deixam de ser vendidos ou exibidos em Macau? Penso que a melhor forma não é senão proibí-los. Se nos termos constitucionais não é possível adoptar a proibição então, penso que podemos utilizar as competências desta Assembleia para dificultar a sua comercialização, por exemplo, na alínea 3 do artigo 3º, mencionar que a taxa é equivalente ao triplo da taxa fixada para a 1ª classe; e se pretendermos proibí-los, pelo menos, teremos que elevar até cem vezes. Claro que, não podemos contrariar a Lei Constitucional, mas se pudessemos estabelecer para o triplo porquê não poderíamos estabelecer para trezentas vezes mais? A segunda questão é sobre a taxa especial a pagar por cada sessão. Julgo que podemos obrigar que seja paga uma quantia de dez mil a cinquenta mil. Acho que temos esta competência. Por outro lado, em relação às horas de exibição, aqui, prevê-se as 21H30, e se for só a partir das 23H30? Por isso, temos que dificultar aqueles indivíduos que querem prejudicar a Sociedade e só assim, é que, consegue esta Assembleia manifestar a determinação na proibição da pornografia.

Esta é a minha opinião pessoal.

Presidente: Tem a palavra o Deputado Ho Yin.

Ho Yin: As publicações e os filmes pornográficos, de facto, são factores que prejudicam a nova geração local. Se bem que não podemos violar a Constituição, podemos, segundo a nossa dignidade, analisar a questão em conjunto e aprovar uma legislação adequada à situação local. Temos que dificultar o exercício desta actividade, assim, mesmo que alguém queira explorá-la, não haverá de conseguir com facilidades.

Concordo com a proposta do Sr. Deputado Ma Man Kei. Podemos trabalhar um pouco mais nos artigos 3º e 4º. Na alínea 3 do artigo 3º, podemos elevar a taxa da contribuição industrial para superior àquela que se encontra prevista, ou seja, o triplo da taxa para a 1ªclasse da rubrica 332. Sobre o artigo 4º, penso que, pelo menos, deverá obrigar o pagamento de uma taxa de dez mil patacas para a exibição de filmes classificados pornográficos, sem permitindo o aumento do preço dos bilhetes, e o horário da exibição deverá ser para mais tarde, a partir das 23H00 ou 24H00. Julgo que com isto, os empresários das casas de cinemas não vão conseguir exibir este tipo de filmes. Chegámos a ver a situação e acho que aqueles que querem exibir este tipo de filmes pretendem obter lucros com isto. Creio que, em Macau, não deve ter muitos cinemas que pretendem exibir este tipo de filmes. No entanto, se todos não fazem não vai haver problemas, mas se um deles exibir, os outros ficarão prejudicados, ou sem negócio. Os trabalhadores e os responsáveis também vão ter opiniões. Por isso, a aprovação desta legislação será, de certeza, vantajosa para resolver todos os problemas.

Todos nós, aqui presentes, somos adultos. Devemos ter a nossa consciência e não permitir que os jovens sejam levados pelo mau. Temos as nossas preocupações. Caso, em todos os lados, hajam materiais pornográficos, penso que não será vantajoso nem para nós próprios nem para os outros. Julgo que, os Senhores Deputados também vão concordar com a minha opinião. Espero que possamos em conjunto resolver esta questão de moral pública.

Presidente: Queria, desde já, frisar, se bem interpreto a opinião da Comissão de Administração Pública e Autarquias Locais e dos autores do projecto, que estamos todos de acordo com as palavras dos Deputados Ho Yin e Ma Man Kei.

A intenção desta Assembleia é, de facto, a de proibir a venda, exposição e exibição públicas de material pornográfico e obsceno. Esta, suponho eu, é a intenção de todos os Deputados e desta Assembleia. A proibição, porém, em termos absolutos, poderá suscitar dúvidas sérias sobre a constitucionalidade da lei que virá a ser votada. Temos aqui, efectivamente, aspectos mais ou menos análogos àqueles que foram considerados quando esta Assembleia votou a lei de repressão das chamadas associações secretas.

Como ontem referiu aqui, durante o debate na generalidade, o Deputado Diamantino Ferreira, o artigo 37.º da Constituição da República Portuguesa consagra o Princípio da Liberdade de Expressão e Informação e, como todos sabem, a autonomia administrativa económica, financeira e legislativa de que goza o Território está condicionada, nos termos do artigo 2.º do nosso Estatuto Orgânico, aos princípios estabelecidos nas leis constitucionais e da República. Quer dizer que esta Assembleia não pode ir contra os princípios estabelecidos na Constituição da República Portuguesa. É preciso não esquecer que esta Assembleia apenas vota a lei, cabendo ao Executivo a vigilância da sua observância e cabendo aos tribunais a aplicação da lei. Como os tribunais gozam, salutarmente, de independência em relação aos poderes legislativo e executivo, se porventura os tribunais entenderem que a lei que esta Assembleia votar é inconstitucional, os efeitos da lei serão altamente negativos. Foi por isso que os autores do projecto, a subcomissão que o apreciou e também a comissão da Administração Pública que agora apresenta o projecto à apreciação do Plenário, tiveram como uma das preocupações fundamentais salvaguardar a constitucionalidade da lei que viria a ser votada por esta Assembleia.

Este projecto aproxima-se bastante do Decreto-Lei n.º 254/76 do Governo da República pelas razões acima enunciadas. Esta aproximação acontece porque até hoje, este diploma, promulgado em 7 de Abril de 1976 e vigente em Portugal desde então, não foi arguido de inconstitucionalidade.

Na medida em que seguirmos esta solução habilidosa de que se serviu o governo da República, podemos estar seguros de que esta Assembleia não votará uma lei inconstitucional.

Devo acrescentar, conforme foi referido na última sessão plenária, que esta lei publicada em Portugal e aí vigente, teve os seus efeitos positivos.

Outro aspecto que me parece importante aqui salientar é que o combate eficaz à pornografia depende menos da lei do que da educação cívica e moral dos cidadãos. De pouco valerá uma lei se alguns cidadãos continuarem a patrocinar a exibição de filmes pornográficos. O combate eficaz e radical depende, em última instância e essencialmente, da população. Se os cidadãos não comprarem bilhetes para esses filmes, estou certo que as empresas acabarão por não os exibir.

O último aspecto que eu desejo apontar, e este será um ponto a ser debatido depois na especialidade, é o que respeita ao agravamento da taxa de contribuição industrial e a uma taxa especial por cada sessão que forem exibidos filmes pornográficos.

Neste domínio, eu posso ser intérprete do pensamento da Comissão, afirmando que a Comissão teve, e tem, muito receio de que este procedimento ou esta solução legislativa, que visa, precisamente, evitar a existência de estabelecimentos que vendam artigos pornográficos ou a exibição de filmes obscenos, possa ser mal interpretada por certo sector do público, ou possa mesmo ser intencionalmente deturpada por certo sector do público, no sentido de que a Assembleia queira proporcionar ao Estado mais receitas, através da exibição de filmes pornográficos. A Assembleia receia que a sua intenção clara, no sentido de proibir ou limitar a exibição de filmes pornográficos e a actividade de estabelecimentos que se dediquem à venda de artigos pornográficos, possa ser, errada ou intencionalmente, deturpada, vindo depois dizer que a Assembleia quer encher os cofres do Estado à custa da exibição de filmes pornográficos ou da venda de artigos pornográficos. Como disse, a intenção é só uma: combater eficazmente a pornografia.

Não sei se alguém mais quer usar da palavra, na generalidade.

Tem a palavra o Deputado Diamantino Ferreira

Diamantino Ferreira: Sr. Presidente

Srs. Deputados

Acho que, em primeiro lugar, devemos congratular-nos com a presença da televisão de Hong Kong, aqui representada pela Hong Kong TVB e pela CTV, mas talvez, porque o que está em causa é a liberdade de expressão do pensamento pela imagem e não pela palavra, parece-nos que as duas estações de televisão de Hong Kong estiveram mais preocupadas coma fotogenia dos Deputados, ou seja, com o retrato dos Srs. Deputados, do que propriamente com as palavras que eles vão proferir.

Congratulamo-nos porque gostaríamos de ver mais vezes na bancada dos órgãos de comunicação social, não só os representantes da imprensa chinesa e portuguesa de Macau, como também os representantes dos órgãos de comunicação social de Hong Kong que, às vezes, em relação a estes assuntos, dão uma imagem que não corresponde exactamente à realidade dos factos.

Entrando agora no tema que nos preocupa, falou-se do artigo 37.º da Constituição da República que diz: "Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de se informar, sem impedimentos nem discriminações".

Por vezes, quando aqui em Macau se fala da Constituição, fala-se nas lacunas legais. Ora a Constituição, em alguns aspectos, não é uma lei travão, no sentido usado pelo nosso saudoso Afonso Costa. Embora haja, como sabemos, e ouvimos há dias dizer por qualificado representante de um partido político nacional, partidos políticos portugueses empenhados em rever a Constituição em 1980, naqueles aspectos que parecem menos conformes com a maneira de ser do povo português, parece-me, Srs. Deputados, que a doutrina do artigo 37.º subsistirá, porque esta doutrina mais não é do que a transposição para o direito pátrio do princípio aprovado na Declaração Universal dos Direitos do Homem da Organização das Nações Unidas em Dezembro de 1948.

Portanto, 30 anos depois da Declaração Universal, não iremos voltar atrás nesse aspecto. Este será um dos princípios constitucionais que há-de resistir e terá de resistir, mau-grado, às vezes, certas forças políticas ou económicas não desejarem a afirmação de um princípio com toda esta latitude.

Então, poderia eu explicar aqui toda a filosofia política contida no artigo 37.º da Constituição.

Julgo não dever espraiar-me em considerações que excedem esta Assembleia, que está aqui ocupada, afinal de contas, com um problema que é mais de administração do Território do que, propriamente, um problema de política geral.

Ora, o artigo 37.º existe porque foi, precisamente, a falta de liberdade de expressão e informação, ou seja, a existência de uma censura que acautelava mais os interesses políticos do que os interesses da saúde moral do povo, que se chegou até onde se chegou hoje. Foi precisamente isso, Srs. Deputados, pelo menos os Deputados de língua portuguesa têm consciência disso, e talvez os outros Srs. Deputados devam compreender, que impediu durante anos um debate ao nível nacional da questão ultramarina e que levou a situações que o povo português não desejou. Isto não absolve aqueles que não cumpriram integralmente o compromisso assumido no programa do Movimento das Forças Armadas Portuguesas, anunciado em 25 de Abril de 1974.

Portanto, é nesse aspecto, nesta filosofia política, Srs. Deputados, que nós devemos procurar uma explicação para certos factos e para certos fenómenos.

Como o Sr. Presidente disse, e com razão, este diploma legal, já no seu artigo 1.º, com a proibição geral, é de constitucionalidade discutível.

Afinal de contas, iríamos fazer uma lei que, em lugar de combater a pornografia, iria, precisamente, favorecer a pornografia. Porquê? Porque, afirmado o princípio da independência dos órgãos judiciais, afirmado o princípio da obrigatória submissão às leis constitucionais, um diploma que, pura e simplesmente, proíba a livre expressão de pensamento, sem a condicionar, seria uma obra inútil. É por isso que aparece o artigo 3.º, mas o artigo 3.º condiciona de tal forma essa liberdade que, podemos dizê-lo, conseguimos ultrapassar a barreira constitucional. O exemplo está no que se passou em Portugal.

Além de que, é preciso não esquecê-lo, Srs. Deputados, antes do 25 de Abril havia censura mas, porventura, não havia livre venda, exposição e exibição de material pornográfico e obsceno? Havia. Há 2 ou 3 Deputados aqui nesta sala que sabem que havia. Pelo menos aqueles Deputados que estiveram ligados aos tribunais. Portanto, o facto de antigamente haver censura e de haver repressão, não impediu o florescimento dessa actividade.

Portanto, o que nós pretendemos é que, dentro da competência legislativa que temos em matéria penal, legislar de forma eficaz, mas absolutamente eficaz no combate a essa praga.

Há outros aspectos que eu não queria deixar de referir, mas sobre eles, creio que a Assembleia não ponderou propriamente até agora. Por exemplo, quanto ao conceito de pornografia e quanto aos meios mais eficazes de combate a essa pornografia.

Como disse, e bem, o Sr. Presidente, não é só pela via legislativa que se combate a pornografia.

Ontem, o Sr. Deputado Kwong Bing Yun assinalou certos aspectos relacionados com a juventude. Devo dizer que, antes de conhecer o Sr. Deputado nesta Assembleia, tive o ensejo de o ouvir como orador convidado num jantar do Lions Club de Macau, em que falou da juventude. Sei que o Sr. Deputado se preocupa com este assunto. Também é nossa preocupação.

Em relação aos adultos, temos de ter uma concepção que seja desinibida e franca sobre este aspecto mas, em relação à juventude, são necessários cuidados.

Falou o Sr. Presidente que não é só pela via legislativa que se combate a pornografia e isso é verdade. Embora, talvez por falta de tempo e porque não adivinhasse o empolamento que o assunto iria obter, não vim especialmente preparado para falar, de forma fundamentada, sobre este assunto e, por isso, socorro-me de uma publicação em relação à qual ninguém tem dúvidas que interpreta o sentimento moral, ou determinada concepção, do povo. Refiro-me à revista "Família Cristã", edição de Março de 1978, publicação da Sociedade S. Paulo, ou seja, dos paulistas. Evidentemente, esta revista, que é publicada em várias línguas, uma das quais a portuguesa, não é o jornal oficial do Vaticano mas é curioso que neste número tenha vários artigos relacionados com o tema que agora discutimos. Por exemplo, um artigo combate acerrimamente o aborto legalizado e traz outro que é uma resposta e um comentário a uma carta de uma leitora sobre as revistas pornográficas. A leitora manifestou à revista a sua repulsa pelo facto de os colegas de trabalho lhe terem colocado na gaveta da sua secretária uma revista pornográfica. Sobre esta carta, a revista teceu considerações e presto homenagem ao comentador pela forma desassombrada e progressista como tratou a questão, forma que interpreta as ideias renovadoras da igreja católica iniciadas no Vaticano II. Diz a revista, secundando, afinal, o Sr. Presidente, que a maneira de combater o florescimento da indústria de material pornográfico está, antes de mais, numa educação sexual e afectiva conveniente e, secundariamente, na sociedade que dela se deverá defender pelos meios disponíveis.

Esta é que é a realidade dos factos. O resto serão lirismos porque, repetindo o ensinamento de Antunes Varela, aquando dessa obra jurídica que foi o Código Civil, "a lei não vale pela força dos seus comandos, a lei vale pelo influxo psicológico das ideias que consegue transmitir".

Parece-nos que, em relação a esses temas, há certas ideias pré-concebidas que é necessário combater e afastar porque, como todos os conceitos, também o conceito de pornografia comporta vários graus. Não confundamos o erotismo com a pornografia, ou seja, com a exploração ou práticas sexuais absolutamente aberrantes, como sejam as práticas masoquistas e sadistas.

Recordo-me, Srs. Deputados, enquanto estudante do 5.º ano do liceu, dos Lusíadas, a maior glória do povo português, que vinham amputados de uma das partes mais belas, a respeitante à célebre Ilha dos Amores, por pudor dos censores. Considerávamos Camões como o símbolo, que efectivamente é, da Pátria portuguesa.

Tudo isto para verem em que medida é que, por vezes, os escrúpulos morais são, afinal de contas, absolutamente cínicos. Os censores podem levar gerações, como a minha, a não poderem acompanhar sequer aquele que era considerado o maior poeta português.

Já para não falar de outros países, como a Inglaterra, os Estados Unidos e outros, onde livros de alto valor literário foram proibidos porque se entendia que eram pornográficos. Na verdade, só dentro da miopia dos censores é que o eram, pois para o comum dos cidadãos assim não acontecia.

Falou-se aqui da sujidade. O sexo como sujidade. Novamente, dou a palavra ao escritor da revista "Família Cristã". Diz ele: "Pode acontecer, como acontece efectivamente com muita gente, que nunca te tenhas desligado totalmente da associação inevitável na infância entre zona genital e órgãos sexuais e sujidade. Basta lembrar a complexa e difícil aprendizagem de hábitos regulares de higiene. Com o avançar da idade e da educação, cada um deve ir-se convencendo de que só é sujo aquilo que não se lava e que os órgãos sexuais e a sua actividade não são sujos. São apenas órgãos reservados à intimidade com aquele ou aquela com o qual ou a qual cada um, eventualmente, se vier a comprometer a ser uma só carne, nas palavras do Génesis".

São estes conceitos, Srs. Deputados, que importa ponderar. Importa ponderar também certos conceitos, como seja este que aqui está referido.

Em que medida é que o erotismo ou a pornografia, mas não naquele sentido da aberração, mas no sentido menos violento, pode também significar para a saúde espiritual e física dos cidadãos. Aqui tem a palavra, novamente, o autor: "O grande perigo da repulsa sexual, mais ou menos manifesta ou latente, meio vencida, está sobretudo no facto de puder desencadear uma crise de desinteresse sexual. Isto costuma acontecer com frequência nas desilusões amorosas e sexuais, que podem provocar o aparecimento de impotência no homem e de frigidez na mulher".

Portanto, este factor que, se por um lado tem aspectos manifestamente negativos, quando explorado nos seus aspectos de perversão, quando, digamos, transmitidos a quem ainda não tem consciência perfeita dos factos, como as crianças, representa, por outro lado, um factor estabilizador na sociedade conjugal. Isso é inegável. Já o Relatório Mckinsey o dizia. Já o nosso Egas Moniz, o único Prémio Nobel português, o dizia num livro científico que também foi proibido, por considerado pornográfico.

Há aqui aspectos que temos de enfrentar, mostrando uma largueza de espírito, mas aqui, claro, estou a invadir um aspecto que é já de especialidade. Qual é o conceito de pornografia que temos? Porventura, vemos sujidade em tudo? Parece que não.

Afinal de contas, o acto sexual, como todos nós sabemos, é o elemento vital básico, para a procriação e para o desenvolvimento da humanidade.

Portanto, o que nós queremos proibir é a exploração comercial de um acto de intimidade que deve ser visto nos seus aspectos positivos e nunca numa perspectiva comercial.

Este é um tema que dava para estarmos aqui dias inteiros a discutir mas o que queremos é transmitir à Assembleia Legislativa e à opinião pública, aqui representada pelos jornais, que não temos ideias estreitas. Queremos evitar, sim, a perversão da juventude e os lucros fáceis através da exploração de factos que deviam ficar no recato da intimidade. Não podemos, de forma alguma, considerar sujos, actos humanos. Devemos preservar a intimidade e evitar que ela seja explorada publicamente. Tencionamos, através de uma forma, chamemos-lhe assim, habilidosa, de conciliar interesses que aparentemente seriam inconciliáveis.

Uma palavra é devida aos filmes, pois não são apenas os filmes pornográficos que fazem mal. Mais mal fazem os filmes violentos em que, não havendo exibição de órgãos sexuais, no entanto promovem a violência. Esses sim, são filmes muito mais perniciosos...

Aí é que está a origem da violência que nós encontramos, a origem das sociedades secretas e outros quejandos, porque esses filmes fazem a apologia da violência e contam histórias em que aparecem sociedades secretas.

Outros aspecto que importa e que foi já referido ontem, deve ser referido novamente. A liberdade de expressão do pensamento não impediu em Portugal, como nos países em que vigora, que exista uma auto-censura. Há jornais que, embora declarando-se independentes, estão mais ou menos conotados com certas forças políticas e então fazem o que se chama a auto-censura. Isto leva até que se diga que a liberdade de imprensa não existe. Se sim ou se não, a verdade é que importa transpôr para aqui o seguinte: vê-se os jornais criticarem acerrimamente o Governo pela proliferação de filmes pornográficos. Nós também somos críticos, por vezes, da Administração, como já o revelámos, mas nesse ponto fazemos justiça. Por Deus, a Administração enriquecer à custa da exibição de filmes pornográficos?! Obter mais turistas à custa de filmes pornográficos?! Mas isto, porventura, caberá na cabeça de alguém?! Que se critique a Administração por tentar obter mais receitas através de uma reforma tributária, ainda vá que não vá, mas passa pela cabeça de alguém que, não havendo aqui industrialização de filmes ou de revistas, o Governo algum dia possa beneficiar disso? É uma ideia errónea que é necessário desfazer.

Isto vem a propósito do seguinte facto: a liberdade de expressão e informação não afasta a auto-censura, porque a liberdade mal exercida traz a sua própria destruição. Até hoje, não temos visto a mínima censura às empresas cinematográficas, as principais responsáveis pela exibição dos filmes. Vemos que muitos desses filmes vêm, digamos assim, clandestinamente, e é sintomáticos que nem legendas em chinês trazem. Quer dizer que não passaram pelo crivo de Hong Kong. Porque é que essas empresas cinematográficas, à frente das quais estarão porventura cidadãos ilustres, não se impõe a si próprias uma censura, colaborando com as entidades escolares, numa verdadeira difusão da cultura, apresentando filmes de qualidade e pedindo até subsídios ao Governo. Se o Governo concede subsídios às escolas particulares com fins não lucrativos, estou certo que, e creio falar pelo Sr. Deputado Rangel e outros que superintendem sobre esses assuntos, também um dia podemos conceder subsídios aos filmes que a Comissão de Espectáculos considere de qualidade, tal qual como em Portugal. Vemos com muito desagrado, filmes ligeiros, como o último do "James Bond", cuja técnica cinematográfica foi tão perfeita que a televisão não pára de mostrar como é que foi feito, ou outros como o "MacArthur", ficarem dois ou três dias, enquanto aquele subproduto chamado "Vanessa" ficou várias semanas. Este aspecto é que nós não podemos compreender.

Portanto, como disse, peço desculpa pelo tempo que tirei a esta Assembleia pois podíamos estar aqui o dia inteiro a discutir.

Em conclusão, julgo que esta Assembleia quer, honestamente, enfrentar este problema e acabar com a exploração comercial do sexo e acho que sem a colaboração do público e daqueles que interpretam o pensar do público, ou seja, dos órgãos de comunicação social, nada disso poderá ser possível. Esperamos, portanto, uma palavra de apoio, uma palavra de mentalização por parte dos órgãos de comunicação social do Território para que transmitam a verdadeira intenção desta Assembleia Legislativa ao trazer a Plenário para discussão, este diploma. Não temos reserva mental e não procuramos aqui permitir a pornografia, nem pensamos em lucros para o Estado. Queremos é enfrentar o problema e enfrentá-lo em termos eficazes. Não é fazer leis que depois não sejam cumpridas ou não possam ser cumpridas. Esta lei pode ser cumprida, agora quanto à execução da lei, a Assembleia espera das autoridades competentes o seu exacto cumprimento, mas isso é um aspecto que já não cabe à Assembleia. À Assembleia cabe abrir o caminho para todos puderem utilizá-lo.

Peço desculpa pelo tempo roubado.

Muito obrigado.

Presidente: Tem a palavra o Deputado Ma Man Kei.

Ma Man Kei: Sr. Presidente,

Há pouco o Sr. Deputado Diamantino Ferreira apresentou, de forma detalhada, muitas opiniões valiosas em relação a esta lei sobre a venda, exposição e exibição públicas de material pornográfico e obsceno. A meu ver, também o Sr. Deputado Diamantino Ferreira quer, através destas opiniões, que este tipo de filmes e publicações, prejudicador da moral social, sejam adequadamente proibidos. Estou de acordo com aquilo que disse sobre a educação da questão sexual, isto é, o ensino correcto mediante manuais pedagógicos. Devemos aceitar esta opinião. Enquanto que as publicações e os filmes pornográficos para fins lucrativos são aspectos diferentes. O projecto de lei que está em discussão visa combater precisamente este problema alarmante e danificador da população jovem, pelo que, hoje, quando as pessoas leram as notícias da imprensa, manifestaram a sua alta preocupação. Tal como foi referido pelo Sr. Presidente, a dificuldade consiste no antagonismo existente entre o artigo 37º da Constituição e a presente proibição. Situação semelhante àquela que existe na proposta de lei sobre associações secretas. Por tanto, tal como o Sr. Deputado Ho Yin disse, o que pretendemos não é contrariar a Lei Constitucional mas sim utilizar os poderes desta Assembleia para prevenir ou condicionar, o máximo possível, a exploração de actividades respeitantes a publicações e filmes nocivos, em Macau.

O Sr. Presidente tinha referido que, este problema não poderá ser resolvida apenas por actos legislativos, mas também temos que ter a colaboração da população e de diversas partes. Acho que este ponto é bastante correcto. Só que, nós, sendo um órgão legislativo, devemos envidar todos os nossos esforços; tal como, o consumo de droga, também temos a legislação que o proíbe. Com certeza que, também temos que ter a conjugação de factores como a sensibilização e divulgação. Se esta Assembleia deixasse-o passar, estaria a criar oportunidades para danificar a sociedade. E quanto aos comentários de que a Assembleia pretende com a pretense legislação aumentar as receitas do Governo, acho que o mais importante é frisar a nossa posição. Das medidas propostas, tais como, determinar a cobrança de uma taxa de dez mil por cada sessão, sem permitindo as casas de espectáculos aumentarem o preço dos bilhetes, pois, no fundamental, não quero que eles lucram, bem como determinar que o horário de exibição seja só a partir das vinte e três horas e trinta minutos, para que as pessoas acharem não muito conveniente por ser tarde de mais, dão para reflectir a nossa posição.

No tocante à questão de contribuição industrial, achamos que não deve ser o triplo mas sim cem vezes mais, para que os vendedores das publicações pornográficas não possam cobrir os prejuízos e daí sem hipóteses de explorar este tipo de negócio nocivo à socidade.

Creio que os Senhores Deputados têm a mesma filosofia e a mesma fé que eu, e que todos querem contribuir para a nova geração, proibindo realmente as situações danificadoras.

Neste contexto, espero que, dentro das nossas possibilidades, sejam estabelecidas certas dificuldades, nomeadamente nos artigos 3º e 4º, para aqueles que pretendam explorar este tipo de comércio.

São estas as minhas opiniões complementares.

Presidente: Creio que o Plenário já está mais do que esclarecido sobre esta matéria.

Tem a palavra o Deputado Jorge Rangel.

Jorge Rangel: Vou ser bastante breve, uma vez que ontem já usei da palavra sobre esta matéria.

Queria voltar a salientar dois ou três aspectos que julgo relativamente importantes em relação ao que ontem já disse.

Antes disso, queria felicitar o Sr. Deputado Diamantino Ferreira pela forma brilhante como expôs o assunto. Temos todos de reconhecer que foi uma intervenção muito esclarecedora e oportuna, na medida em que conseguiu apresentar esta matéria, que é muito delicada, de uma forma bastante completa e clara.

Quando ontem pedi a palavra depois de ser aberta a discussão sobre esta matéria, quis chamar a atenção para uma diferença fundamental que existia entre o diploma inicial, que foi elaborado com a minha participação activa, e o diploma como veio apresentado ao Plenário. Esta última versão que foi entregue a todos os Deputados...o projecto inicial não fazia qualquer menção a estabelecimentos próprios para venda destes artigos considerados pornográficos, apenas fazendo referência à necessidade de se proibir a sua venda pública, bem como à exibição e exposição de qualquer artigo de conteúdo pornográfico, fossem eles impressos, filmes, fotografias ou quaisquer outros objectos eventualmente considerados pornográficos. Portanto, esta versão apresenta uma inovação relativamente ao projecto inicial, mencionando a possibilidade de criação de estabelecimentos próprios, as chamadas sex shops. Sobre este assunto, eu e vários outros Deputados tivemos a oportunidade de dizer qualquer coisa, pelo que não interessa repetir o que já se disse.

Outra inovação que o diploma apresenta é a inclusão de um artigo referente à exibição de filmes pornográficos. Concordo que é preciso encontrar formas de impôr restrições à exibição destes filmes, indo tão longe quanto possível e dentro dos limites impostos pela Constituição e até pela nossa própria maneira de ser e pensar. Porém, em relação a este aspecto, gostaria de, quando chegarmos à discussão na especialidade, propor algumas pequenas alterações para dar um aspecto diferente daquele que aparece aqui no artigo como ele vem escrito.

Em relação ao artigo 3.º, que é aquele que me parece o mais polémico, compreendo todas as razões que foram aqui apresentadas, ontem e hoje, mas, como já receava, isso deu já azo a especulações de vária ordem. Houve, talvez, uma certa precipitação em informar o público de que a Assembleia ia autorizar a livre exibição de filmes pornográficos e a criação de casa especializadas. Verifico que, embora se tenha incluído este artigo 3.º no projecto, não é essa a intenção dos Deputados aqui presentes. É com grande satisfação que registo estes facto, por verificar que a intenção dos autores do projecto, que é a correspondência à opinião pública para impôr restrições à venda de artigos pornográficos, se mantém e que è a mesma da própria Comissão de Administração Pública que apresentou esta versão final.

É absolutamente falso e descabido dizer-se lá fora que a Assembleia está a procurar autorizar a criação de casas especializadas para este tipo de artigos.

O que me parece importante é encontrar uma forma eficaz de por cobro a essa venda que, durante algum tempo, foi bastante desenfreada, embora em Macau não tivesse atingido a gravidade que atingiu noutros países.

Não sei até que ponto, porque não tive oportunidade de receber traduções da imprensa chinesa sobre esta matéria, os artigos publicados hoje na imprensa e as reportagens na televisão desvirtuaram a intenção dos Deputados ao discutirem esta matéria. Sei apenas que estes assuntos foram tratados na imprensa e na televisão.

Ainda há um bocado, o Sr. Deputado Diamantino Ferreira salientou que havia todo o interesse em vermos aqui a imprensa mais vezes para acompanhar de perto os debates, não bastando que a televisão apresente imagens. É necessário que ouçam a opinião das pessoas porque ver caras é muito pouco. Todos nós defendemos a liberdade de informar mas temos, necessariamente, de lamentar que essa liberdade de informar se transforme, muitas vezes, em liberdade de especular. Às vezes, quando se especula, e normalmente no mau sentido, o trabalho dos próprios Deputados numa assembleia deste tipo pode ser afectado e a opinião pública, erradamente preparada, pode constituir, de certa forma, uma depressão nem sempre justificada em relação às intenções dos Deputados. Creio que nós e a imprensa devemos aguardar serenamente que os assuntos se esclareçam, para puder ser transmitida a verdade à opinião pública.

Juntando a minha voz à do Sr. Deputado, manifesto a minha satisfação por ver que, neste assunto, termos a imprensa a acompanhar-nos. É a única forma de puder depois transmitir aquilo que aqui foi dito e discutido com claridade e objectividade.

Sem querer alongar-me sobre a matéria, queria manifestar que seria preferível, realmente, não incluir este artigo 3.º na sua forma actual. Vamos ver se será possível encontrar uma forma diferente de controlar o problema.

Quando os autores do projecto fizeram o diploma e não mencionaram a criação de casas especializadas, não queriam, naturalmente, dizer que esses objectos poderiam depois ser vendidos em qualquer estabelecimento desde que não fossem expostos ao público. A intenção era deixar ao Executivo a possibilidade de legislar sobre esta matéria, de acordo com o espírito do diploma, que visava proibir a sua venda pública, ou então, mesmo que o Executivo não legislasse sobre esta matéria, ficava entregue a possibilidade de tomar medidas sempre que um caso desses surgisse. Se conseguíssemos proibir a sua venda pública, creio que , e como compete ao Executivo zelar pelo cumprimento das leis, o próprio Executivo poderia, sempre que aparecesse algum interessado em explorara um negócio deste género, tomar as medidas adequadas. Realmente, não sei se é necessário introduzir o artigo 3.º no diploma.

Sem prejuízo de a ele me referir quando chegar a discussão na especialidade, julgo que este artigo 3.º introduz uma alteração de fundo no diploma. Parece-me que o aspecto que se tornou preocupante para o público e para alguns Deputados, foi o facto de se mencionar na lei que podem ser criados estabelecimentos próprios para venda destes artigos. Creio ter sido este o aspecto que mais polémica suscitou.

Se fosse possível contornar esta matéria e não mencionarmos a possibilidade de criação de casas especializadas, penso que encontraríamos uma forma mais própria de resolvermos a questão. Também não faz sentido dizermos que podem ser criados estabelecimentos para o exercício desta actividade se depois vamos criar restrições que impeçam esse exercício. Na minha opinião pessoal, isso não faz sentido, nomeadamente, a criação de taxas muito elevadas ou a proibição que esses estabelecimentos sejam criados a menos de 500 metros de escolas, jardins ou templos. Penso que, então, entraríamos em contradição com a própria Assembleia que, por um lado, autoriza a criação de casas especializadas e, por outro, faz uma lei de tal modo complicada, que estas casas não poderão, na prática, aparecer. Não sei se essa será a solução mais correcta para a Assembleia. Ou autorizamos que elas apareçam, e é um critério que adoptamos, ou não fazemos menção do facto.

Esta é a minha opinião porque, como disse, acho que é contraditório estarmos a autorizar e depois impormos restrições que inviabilizam a actividade destas casas.

Como ontem foi dito, se dissermos na lei que numa área de 300 ou 500 metros à volta de uma escola, igreja ou jardim público, não puder aparecer uma casa deste género, essas casas poderão aparecer facilmente nas ilhas, onde há poucas escolas, igrejas ou jardins. Por outro lado, se dissermos que essas casas não se podem instalar nas ilhas, não sei qual é o interesse do artigo 3.º.

Para já, eram estas as considerações que queria fazer, visto que o artigo 3.º é que introduz uma alteração de fundo.

Gostava de perguntar à Comissão de Administração Pública se há alguma possibilidade de, sem fugir aos limites impostos pela Constituição, aprovarmos esta lei sem fazer menção de estabelecimentos próprios para venda de artigos pornográficos.

Presidente: Faça favor.

Diamantino Ferreira: Só duas palavras, Sr. Deputado Rangel.

Como disse, embora possa parecer contraditório e curioso, no entender da Comissão, o artigo 3.º é que dá força ao n.º 1 do artigo 1.º.

O Sr. Deputado Rangel levantou aqui um problema muito pertinente.

Havia uma forma muito simples de resolver o problema e como estamos em época de campeonato do mundo de futebol, pois seja-me permitida esta imagem: passávamos a bola ao Conselho Consultivo. Dizíamos apenas, "sem prejuízo daquilo que vier a ser regulamentado sobre a matéria, é proibido isto e aquilo". Neste caso, a bola era passada para o Sr. Governador e para o órgão que o apoia. Acho que a Assembleia Legislativa não pretende propriamente isso, embora, como lei que é, ela não possa dispensar necessariamente a sua regulamentação. Essa sim, como regulamento, terá de ser feita pelo Executivo.

A ideia da Comissão é precisamente salvaguardar a utilidade do diploma. Em termos futebolísticos, defender bem a baliza. Senão, temos um guarda-redes aparentemente muito eficaz mas que, depois, cometerá muitos "frangos", ou seja, deixará entrar muitas bolas.

Esta é a filosofia do diploma. Isto é que tem de ser compreendido! Julgo que esta é que é a ideia que tem de ser compreendida. Não podendo proibir em absoluto, vamos condicionar de tal forma que havemos de conseguir o resultado prático que desejamos.

Este diploma foi inspirado no de Portugal que, se não estamos em erro, foi seu relator um juristas bastante perspicaz e bom político, que conseguiu ultrapassar as dificuldades. É o que nós pretendemos fazer aqui.

Era muito cómodo para a Assembleia prometer no artigo 3.º a possibilidade de criação destas sex shops, dando, por tanto, a entender que se respeitaram os princípios básicos que não podemos, nem queremos, ofender. Porém, julgo que não era a forma correcta de o fazer.

É esta a intenção da Comissão.

Presidente: Tem a palavra o Deputado Ma Man Kei..

Ma Man Kei: Só uma pequena achega.

O Sr. Deputado Diamantino Ferreira falou sobre o problema de filmes de violência e disse que é também um aspecto prejudicial para a sociedade, ponto de vista que também concordo. Só que, a proposta de lei que temos não prevê isto. Caso o Executivo possa introduzí-lo nesta proposta de lei será ideal, mas se for muito complicado, então, concordo que seja aguardado para apreciação posterior. Isto é, os filmes de violência, as cenas de agressão e de assassínio são nocivos para a ética e a moral públicas, mas parece-me que a presente proposta de lei não prevê este caso de violência. Se limitassemos em introduzir palavras, não valeria a pena, prefiro aguardar para uma outra oportunidade. Portanto, concordo com as palavras do Sr. Deputado Diamantino Ferreira.

Jorge Rangel: Nós poderíamos deixar ao Executivo a tarefa de regulamentar esta matéria, mas se o artigo 3.º diz que é autorizada a criação de estabelecimentos deste género, também vamos, mesmo sem querer, passar a bola ao Executivo, que terá depois o papel desagradável de estar a criar restrições maiores quando regulamentar esta matéria.

Quer dizer, em lei, nós dizemos que as casas estão autorizadas e depois, ao regulamentar, o Executivo vai fazer a coisa de modo a que estas coisas não possam aparecer.

Sendo assim, pergunto se não seria melhor que nós, no artigo 1.º, em respeito à Constituição, disséssemos que em locais públicos não é autorizada a venda e exibição de quaisquer artigos deste género. Caberá depois ao Executivo tomar as medidas adequadas para que esta lei seja cumprida ou regulamentar esta lei com outras medidas, autorizando, ou não, a criação de casas especializadas para o efeito.

Estou convencido que, mesmo sem este artigo 3.º, pelo menos a autoridade policial poderá actuar, proibindo que em locais públicos, como a Avenida Almeida Ribeiro, ou locais frequentados por turistas, como a Penha e as Portas do Cerco, apareçam artigos desse género.

Por outro lado, talvez não seja contrário à Constituição portuguesa o facto de mencionarmos que em locais públicos essa venda é proibida. Não dizemos que é proibida em absoluto, dizemos só que não é autorizada em locais públicos.

Presidente: São considerações na generalidade.

O Sr. Deputado Kwong Bing Yun quer usar da palavra? Desejava perguntar se é uma referência na generalidade ou se é uma referência específica a algum dos artigos. É que mais tarde vamos ter oportunidade de discutir na especialidade, cada um dos artigos.

Quer falar na generalidade ou na especialidade?

Kwong Bing Yun: Sr. Presidente, Srs. Deputados,

Antes do mais, agradeço a intervenção do Sr. Deputado Diamantino Ferreira, no que respeita ao Lion Club, eu próprio quase não me lembrava do assunto.

Não quero roubar-vos muito tempo, porém, quero repetir as opiniões que apresentei ontem. Isto é, os valores da ética e da moral existente na civilização ocidental e na oriental são diferentes. Não podemos negar que Macau é um território com fortes características da civilização oriental. Desta forma, tanto em relação a esta questão de pornografia como no que respeita a outras questões gerais previstas nesta proposta de lei, eu, pessoalmente, acho que, qualquer que seja a forma, temos que tomar medidas para a proibir ou a condicionar, de maneira que os efeitos negativos sejam reduzidos. O Sr. Presidente e o Sr. Deputado Diamantino Ferreira disseram que a educação cívica é muito importante, contudo não podemos ignorar que a educação sexual e os espectáculos pornográficos— é obvio que são incluídos os filmes e demais instrumentos— são dois casos diferentes. Não estamos a afirmar que os filmes pornográficos são uma educação sexual, nunca podemos confundí-los. Porque, estes filmes contêm algo que envenena a nova geração. Por isso, aquando da apreciação na generalidade, insisto em não abrir caminhos (oportunidades) para os comerciantes de material pornográfico. Estou inteiramente de acordo com as opiniões do Sr. Deputado Jorge Rangel, sobre o artigo 3º, no que respeita à determinação de que tipo de coisas poderá ser vendida por que tipos de lojas. Antigamente, em Macau, proibíamos formalmente o ópio, mas existiu uma entidade própria para a venda do ópio. Penso que, quando chegarmos ao debate em pormenor, irei apoiar naquilo que foi proposto pelo Sr. Deputado Jorge Rangel. Em relação ao artigo 3º temos que pensar muito bem.

Muito Obrigado.

Presidente: Antes de pôr à votação na generalidade este projecto de lei, até porque falta aqui um dos Srs. Deputados, o Sr. Deputado Rangel, desejava fazer uma observação sobre o que disse o Deputado Kwong Bing Yun.

(Pausa)

Presidente: São conceitos idênticos. Os meus conhecimentos são bastante limitados e, pelo menos no que toca a Portugal, posso dizer que não há nenhuma diferença entre estes conceitos. Desde sempre, em Portugal foi punido o ultraje ou ofensa ao pudor público ou à moral pública. Sem me reportar às Ordenações Manuelinas e Filipinas, que datam da Idade Média, posso esclarecer o Sr. Deputado Kwong Bing Yun que, desde que se publicou o Código Penal, que o ultraje ao pudor público e à moral pública é punido. Portanto, desde 1852 até hoje. Esta matéria consta dos artigo 390.º e 420.º do Código Penal que está em vigor.

Em excepção ao apontamento, uma informação para o Sr. Deputado Kwong Bing Yun.

Vou então pôr à votação, na generalidade, o projecto de lei.

Os Srs. Deputados que concordarem, deixam-se estar como estão. Os Deputados que discordarem, queiram levantar o braço. Os que desejarem abster-se, podem declará-lo.

Está aprovado na generalidade.

Ponho agora à apreciação, na especialidade, o artigo 1.º.

Tem a palavra o Deputado Kwong Bing Yun.

Kwong Bing Yun: *

Presidente: A rubrica do artigo?

Kwong Bing Yun: *

Presidente: O que é que o Sr. Deputado não percebe? Não estou a perceber.

Não compreende o quê?

Jorge Rangel: Suponho que é por causa do título, Sr. Presidente.

Presidente: O Sr. Deputado Kwong Bing Yun já é Deputado há dois anos.

A Assembleia tem uma Lei de Formulário que foi votada, salvo o erro, em Novembro de 76, e nessa Lei do Formulário diz-se que as leis da Assembleia devem ter um título que dê a entender o conteúdo da lei. Por exemplo, a Lei das Associações Secretas, a Lei da Contribuição Industrial, a Lei do Imposto Profissional ou a Lei do Serviço de Secretaria da Assembleia. Quer dizer, é um título que dê a entender o conteúdo. Por via de regra, o título costuma ser adoptado pela Comissão de Redacção que, neste caso, é a Comissão de Administração Pública, que já se pronunciou sobre o projecto e que depois dará o retoque final à redacção da lei que vier a ser votada.

Não estou a perceber porque é que não percebe o título.

Jorge Rangel: Sr. Presidente, julgo que entendi a dúvida...

Presidente: Talvez ouvir a opinião.

Porque é que não percebe o título?

Kwong Bing Yun: *

Jorge Rangel: Sr. Presidente, eu suponho que a dúvida está no título, porque queria pôr no título a palavra "proibição", porque no....

Presidente: Queria pôr no título a palavra "proibição".

Creio que também não está nas "Associações Secretas" e todo o mundo percebeu.

Quando a Assembleia votou a Lei das Associações Secretas, não pôs lá "Lei de Proibição das Associações Secretas". Creio que só pôs "Lei das Associações Secretas". Não sei se estou bem recordado. Lei n.º tal, "Associação de Malfeitores", mais nada!

O que é que queria pôr como título da lei?

Kwong Bing Yun: *

Presidente: Isso é uma coisa para ser considerada pela Comissão de Redacção.

A palavra própria não era "proibição" ou "restrição". A palavra própria seria "repressão", mas isso será uma coisa que a Comissão de Redacção fará depois.

Isso não tem nada a ver com o que eu coloquei à discussão, que foi o artigo 1.º da lei. Quanto ao título, a Comissão de Redacção disso se encarregará, mas é uma sugestão que fica. Pessoalmente, acho que seria "repressão".

Kwong Bing Yun: *

Presidente: Muito bem.

Está em discussão o artigo 1.º.

Jorge Rangel: Sr. Presidente, queria só propor a inclusão da palavra "filmes", que foi tirada do diploma inicial, porque há também aqueles filmes de 8 milímetros e de 16 milímetros que se vendem e é preciso que esteja previsto nesta lei que a sua venda em público é proibida.

Presidente: Seria depois da palavra "diapositivos", não é? Ficaria "fotografias, diapositivos, filmes...". Depois, no n.º 2, queria deixar a sua matéria em suspenso para se conjugar com a aprovação do artigo 3.º e 4.º. Só depois de aprovados estes artigos é que se pode optar pelo n.º 2.

Já agora, sem querer antecipar-me à apreciação do artigo 3.º, queria recordar o Plenário sobre aquilo que tive a ocasião de dizer ontem. É que, se dissermos que é proibido afixar, vender, expor ou dar publicidade a cartazes em locais públicos, sem mais nada, como a Lei Penal é sempre de interpretação restritiva, a conclusão que se tira é que a instalação de estabelecimentos de venda de artigos pornográficos será livre, não obedecendo a nenhuma restrição. Se dissermos apenas isso, porque se trata de um estabelecimento que pode as portas fechadas, seria permitida a livre instalação.

Portanto, se todos estiverem esclarecidos, eu vou por à votação o n.º 1 do artigo 1.º. O n.º 2 ficará dependente da posição que esta Assembleia tomar relativamente aos artigos 3.º e 4.º. Quanto ao n.º 1, existe uma proposta de acrescentamento da palavra "filmes a seguir a "diapositivos".

Os Srs. Deputados que concordarem, deixam-se estar como estão. Os que discordarem, queiram levantar o braço.

Está aprovado o n.º 1 do artigo 1.º.

(Pausa)

Presidente: Ponho agora à apreciação o artigo 2.º.

Jorge Rangel: Sr. Presidente, queria chamar a atenção para uma pequena alteração que foi feita na alínea a). Na nossa proposta a alínea a) é ligeiramente diferente.

Presidente: Está bem, está correcto, foi uma gralha. É "representação".

Jorge Rangel: Ah, foi uma gralha.

Presidente: É "representação’ e não "apresentação".

Jorge Rangel: Também foi omitida uma palavra. Não sei se houve alguma intenção particular na eliminação dessa palavra. Tinha dito "representação ou descrição ostensiva de actos sexuais".

Presidente: É que, como a palavra "ostensiva" configurava uma restrição e como se trata, anteriormente, do pudor público e que supõe uma certa publicidade, entendeu-se que essa palavra limitava o conceito. Tal facto daria ao intérprete, ao julgador, uma dificuldade de interpretar e saber quando é que seria ostensiva e quando é que não o seria. Assim, eliminando a palavra, a representação ou descrição de actos sexuais, desde que ofendendo o pudor público ou a moral pública, constitui logo uma infracção. Foi esta ideia que levou a retirar a palavra "ostensiva". Se estou a dizer mal, peço à Comissão que me corrija.

Jorge Rangel: Quando pusemos a palavra "ostensiva", pensámos que há casos em que a mera descrição do acto sexual pode não ser pornográfica mas, se esta representação for muito visível ou a descrição do acto for muito completa, então podemos considerar que seja pornográfico. Porém, a mera descrição ou uma representação fugaz não é necessariamente pornográfica.

Presidente: Mas é que não bastam esses elementos para ser pornográfica. Esses elementos têm de ser conjugados com a ofensa à moral pública ou ao pudor público. Por isso é que eu tenho dúvidas quanto ao n.º 2, quanto ao seu início. O essencial é que os objectos ou meios referidos no artigo anterior contenham palavras, descrições ou imagens que ultrajem ou ofendam o pudor público. Quando, depois, se fala na descrição de actos sexuais ou na representação de actos sexuais, é necessário que esta representação ou descrição ultraja ou ofendam o pudor público ou a moral pública. Para isso, têm necessariamente de ser ostensivas, ou então, sugestivas de forma a que o consenso geral da população seja no sentido da sua ofensa.

Jorge Rangel: Concordo, Sr. Presidente, só que, na prática, fica ao critério do agente da autoridade decidir se é pornografia ou não. Pode, segundo o seu critério pessoal, considerar que um filme ou qualquer artigo seja pornográfico e, depois, verificar-se que não é.

De qualquer forma, concordo com o conceito aqui expresso. Aliás, a ideia é precisamente esta.

Inicialmente, a palavra "ostensiva" não aparecia. Depois, resolvemos colocá-la para evitar dúvidas por parte de quem vai fiscalizar, ou seja, o agente da polícia que pode não entender a ideia que pretendemos transmitir com este artigo. Poderia considerar qualquer acto sexual, em qualquer circunstância e em qualquer situação, como pornográfico nos termos do n.º 2. Talvez não seja necessário acrescentar e ficar como está.

Presidente: Para já, existe aqui uma questão de redacção no n.º 2. Deve ser utilizado o verbo no singular ou no plural, dizendo "São, designadamente, abrangidas neste conceito"?. Parece que deve ser no plural.

Outra ideia que tenho é a busca de uma forma mais própria para entender que integram um conceito, mas não são o conceito completo. Tem de haver ofensa à moral pública ou ao pudor público, embora os casos sejam quase sempre evidentes. No entanto, parece-me indispensável alterar a redacção. Talvez possamos dizer que "São, designadamente, compreendidas neste conceito a representação ou descrição de actos sexuais...".

Diamantino Ferreira: Sr. Presidente, subscrevo esta proposta e parece-me que não é demais assinalar aquilo que os Srs. Deputados devem ter verificado: a enumeração do n.º 2 do artigo 2.º é meramente exemplificativa, não sendo taxativa. Embora o saibamos pela utilização do qualificativo "designadamente", convém que fique aqui bem expresso: além das 3 alíneas, poderão ser considerados pornográficos e obscenos, outros objectos ou meios, desde que ofendam o pudor público ou a moral pública.

Em contrapartida, como disse o Sr. Presidente e o Sr. Deputado Rangel, a representação ou descrição de actos sexuais podem, num caso concreto, não ofenderem o pudor ou a moral pública.

Evidentemente, trata-se de matéria reservada à competência dos tribunais, sendo impossível encontrar uma definição que dê cobertura a todas as situações. É por isso que, além de uma definição de certa latitude no n.º 1, se chega ao pormenor no n.º 2.

Seja como for, gostava de deixar bem claro que esta enumeração é meramente exemplificativa. Além destes casos, haverá outros.

Presidente: Acho sempre conveniente que fique registado nos trabalhos preparatórios da lei, que serão as actas desta sessão, o pensamento exacto da Assembleia Legislativa, assim como, por exemplo, outros conceitos que têm dado origem a discussões nos tribunais, o "pudor público" e a "moral pública". Tem-se entendido que o "pudor público" não se refere a um sentimento de vergonha que certas pessoas têm ou a sentimento de vergonha individual, mas sim, a um sentimento de vergonha da média das pessoas em determinada época e em dada sociedade. Também o conceito de "moral pública" é um conceito da média das pessoas, das suas concepções ético-sociais, que em dado momento vigoram em dada sociedade. É por isso que se fala em "moral pública" e em "pudor público".

Se todos estiverem esclarecidos, passo à votação.

Ponho à votação o artigo 2.º.

Tem a palavra o Deputado Kwong Bing Yun.

Kwong Bing Yun: *

Presidente: Suponhamos um livro de medicina, numa livraria, e que tem os órgãos genitais expostos, ou aquelas fotografias do corpo humano que surgem em determinadas revistas. São proibidas ou não? É que esta referência final parece-me extremamente feliz, ao acrescentar que é num contexto de pura exibição sexual. Só então é que, de facto, existe o tal ultraje ou ofensa à moral pública.

Não podemos proibir, por exemplo, que numa livraria apreça uma fotografia do corpo humano totalmente nú. Eventualmente, destinar-se-á a estudantes de medicina ou de ciências naturais. Por outro lado, quando se expõem os órgãos genitais em cartazes, anúncios ou outros suportes, num contexto de exibição sexual, isto sim, constitui o tal conceito de pornografia relevante para efeitos penais.

Diamantino Ferreira: Sr. Presidente, dá-me licença que dê mais achega.

Não apenas em livros de medicina.

Parece-me relativamente perigosa a sugestão do Sr. Deputado no sentido de eliminarmos a segunda parte da alínea b) do n.º 2.

Há publicações de muita utilidade – as tais que ajudam a resolver o problema da sexualidade, mas em termos honestos e eficazes – que se chamam enciclopédias da vida sexual. Estão divididas em várias edições: a 1.ª edição vai até aos 10 anos de idade; a 2.ª, dos 10 anos aos 14 anos; a 3.ª, dos 14 anos aos 18 anos e a 4.ª, dos 18 anos em diante. São um instrumento útil para os pais e educadores e são obras de muita seriedade escritas por educadores de infância, psicólogos e outros técnicos. Nestas obras há exposição de órgãos genitais e uma determinada descrição de actos sexuais para explicar, digamos, às crianças e mais velhos, o acto sexual. Estas obras impedem que as crianças atinjam a maioridade na mais completa ignorância sobre o assunto, cometendo erros graves por causa disso. Muitas vezes, a falta de uma correcta educação sexual é responsável pela existência de tantos filhos ilegítimos.

Através de processos extraordinários, comparando até a vida sexual dos homens com a vida sexual dos animais, estas obras conseguem explicar às crianças e aos adolescentes o acto sexual, atingindo uma sã preparação sexual do menor.

Nestes casos, estaríamos a interditar esses livros, que são de uma utilidade extraordinária, uma vez que são feitos para ajudar, não havendo qualquer interesse na exploração da sexualidade. O único interesse é educativo.

Falo também como pai, considerando esses livros extremamente úteis.

Creio que esses livros cairiam nessa alçada...

Presidente: Desculpe a interrupção, mas eu queria apontar, e acho que é conveniente termos bem presente, o artigo 2.º, n.º 1. Este número diz que, "São considerados pornográficos ou obscenos, os objectos ou meios referidos no artigo anterior que contenham palavras, descrições ou imagens que ultrajem ou ofendam o pudor público ou a moral pública.". Esta é que é a parte essencial da lei. Repito que não se trata do pudor individual, mas sim, o pudor da comunidade, em certa época. Este é que é o conceito fundamental.

O n.º 2 contém, apenas, alguns exemplos, alguns casos para ajudar quem vai aplicar a lei a compreender o pensamento de quem legislou. Quer dizer que, além dos casos do n.º 2, haverá muitos outros. Todos aqueles que ofenderem o pudor público ou a moral pública.

Para este facto chamou a atenção o Dr. Diamantino Ferreira, quando disse que a palavra "designadamente" significa "exemplificativamente". Estes casos são mencionados a título de exemplo. O essencial é o n.º 1.

Tem a palavra o Deputado Kwong Bing Yun.

Kwong Bing Yun: *

Presidente: Pois. Se puser a palavra "principalmente".

Isto quer dizer que, mesmo fora do contexto de pura exibição sexual, também constitui uma exposição pornográfica. Neste caso, um livro de medicina numa livraria, porque expõe os órgãos genitais, pode levar o dono da livraria à cadeia por 6 meses. Creio que não é este o propósito da lei.

Como aqui se trata de um exemplo, não faz mal nenhum. Isto é um exemplo, não é um caso! Daqui não se pode inferir que não haverá outros casos de exposição de órgãos genitais que caiam na alçada do conceito de pornografia. Também podem cair, desde que ofendam o pudor público ou a moral pública. Isso é suficiente.

Por outro lado, se puser ali a palavra "principalmente", a conclusão é outra. O que se conclui é que qualquer caso de exposição é punível. Ora, nem sempre os casos devem ser punidos.

Não sei se fui claro na explicação.

Tem a palavra o Deputado Jorge Rangel.

Jorge Rangel: Tenho uma dúvida.

É que isto traz-me novamente a preocupação que apresentei há pouco em relação à alínea a). Esta descrição pode ser feita num contexto completamente diferente e seria desagradável que o agente da autoridade apreendesse o material que tivesse esta descrição só pelo facto de descrever o acto sexual. Esta descrição pode ser feita com uma finalidade completamente diferente. Por exemplo, os tais livros de educação sexual ou até uma representação do acto em circunstâncias diferentes de um contexto sexual.

Se ficar só assim, corremos o risco de permitir que o agente da autoridade apreenda artigos apenas por conter a descrição do acto sexual, até como uma justificação, como é o caso do que o Sr. Deputado Diamantino Ferreira citou há pouco, quanto aos livros de educação sexual.

Presidente: Precisamente, nesses casos não se ofende o pudor público.

Parece-me indispensável, e por isso não considero a redacção do artigo como completamente feliz, uma correcção. De outra forma, pode levar a concluir que certas situações, ainda que não ofendam o pudor público, ainda assim constituem crime. Não é isto que diz a hipótese. A hipótese diz que só há crime quando o pudor público é ofendido.

Jorge Rangel: Na alínea b) e c) não há dúvidas, mas a alínea a) pode suscitar esta dúvida.

Presidente: Qual?

Jorge Rangel: Na alínea a) pode ser suscitada a dúvida de saber se ofende, ou não, a moral pública. Nas alíneas b) e c) é explícito que se trata de um contexto próprio de pura exibição sexual, não havendo qualquer problema quanto a estas alíneas.

Na alínea a) vislumbro que pode levantar problemas. Quando colocámos a palavra "ostensiva", não encontrámos melhor forma de explicar o conceito. Porém, se for possível acrescentar mais qualquer coisa e explicar, talvez, o contexto e a finalidade, tenho a impressão que esse risco desaparecerá.

Ficando como está, pode dar azo a interpretações diferentes daquela que aqui estamos a dar neste momento.

Presidente: Tem a palavra o Deputado Patrício Guterres

José Patrício Guterres: (a intervenção é imperceptível porque o microfone estava desligado/ the intervention could not be reproduced because the microphone was switched off)

Presidente: Por isso é que considero extremamente feliz a inclusão dessa parte final.

É importante porque se tratam de orientações para quem vai executar a lei, sendo conveniente que tenham um fio condutor da sua acção.

Quanto à alínea a), a palavra "ostensiva" não traduz toda a ideia, porque pode não ser ostensiva e, porventura, ser mais grave e ofensiva da moral pública. Pode até ser meramente sugestiva do acto sexual, mas mais repugnante que a ostensiva. A representação sugestiva pode ser mais perniciosa e mais grave que a que seja ostensiva. A palavra "ostensiva" é, por um lado, limitativa, e, por outro, põe de parte a hipótese da representação sugestiva. Como sabemos, pode oferecer perigos morais mais graves, chocando mais que a ostentação.

Acho que se poderia pensar numa outra palavra.

Quanto às alíneas b) e c), creio que são exemplos claros e inequívocos do que é pornográfico ou obsceno. Quanto à alínea a), permanece a dúvida.

Não sei se alguém tem alguma ideia, alguma sugestão.

Não sei se o Sr. Deputado Kwong Bing Yun quer apresentar uma proposta de alteração à alínea b), no que respeita à introdução da palavra "principalmente". Não sei se acha necessário acrescentar essa palavra.

Quanto à alínea a), não sei se há alguma sugestão ou proposta de alteração.

Diamantino Ferreira: Talvez, Sr. Presidente, possamos dizer, "a representação e descrição impúdica de actos sexuais.", mesmo que sejamos repetitivos.

Este conceito pode variar de juiz para juiz. Há pouco, o Sr. Presidente mencionou os livros de medicina e eu mencionei as enciclopédias de educação sexual destinadas a crianças e adolescentes, mas lembrei-me de outra categoria de livros: livros escritos por autores estrangeiros, principalmente americanos, que são médicos psiquiatras ou psicólogos e que tratam os temas sexuais com uma seriedade extrema. Acontece que esses livros destinam-se a educar as pessoas e a propiciar uma vida conjugal estável. Incluem imagens sugestivas, sob a forma de desenhos, que representam o acto sexual nas suas diversas cambiantes. Em que medida é que podem ser considerados como obras pornográficas? Parece-me que nenhum juiz fará tal classificação.

Depois, há ainda os pseudo-livros de educação sexual, que não oferecem dúvidas nenhumas.

Quanto aos primeiros, temos, por exemplo, "A Vida Sexual", de Egas Moniz, bem como o universalmente conhecido "Relatório Mckinsey". Julgo que estas obras não podem ser consideradas obras pornográficas, embora revelem aspectos que podem chocar certas pessoas e até ofender o pudor de certas sensibilidades.

Quanto a este tipo de livros, o acto sexual é representado de forma explícita, mas não são pornográficos, cabendo, pois, a cada juiz, classificar o que é pornográfico ou obsceno. A Assembleia limita-se a legislar e não podemos estabelecer balizas demasiado rígidas ao julgador quanto tratamos de conceitos tão fluidos. Assim sendo, talvez seja de acrescentar mais qualquer coisa à alínea a).

Presidente: Não sei se haverá alguma proposta quanto à alínea a), de molde a torná-la mais explícita.

Jorge Rangel: Sr. Presidente, não sei se poderíamos votar a inclusão da palavra impúdicas" e, depois, se entretanto a Comissão de Redacção Final encontrar outra que melhor traduza a ideia, poderia ser substituída. O que é preciso é acrescentar algo que especifique melhor o conceito.

Presidente: Vou por à votação o artigo 2.º, com o acrescento da palavra "impúdicas" na alínea a) a seguir a "descrição". A Comissão de Redacção fica encarregue de pensar num adjectivo mais próprio, evitando que se considere pornográfico ou obsceno a descrição ou representação de actos sexuais contido em, por exemplo, livros de divulgação, de estudo, enciclopédias, etc.

Os Srs. Deputados que concordarem com o artigo 2.º, deixam-se estar como estão; os que discordarem, queiram levantar o braço.

Está aprovado o artigo 2.º.

Ponho à apreciação a matéria do artigo 3.º, que se trata de um dos artigos de fundo desta lei.

Uma vez que estamos a tratar de artigos em relação aos quais alguns Deputados já levantaram objecções, tinha pensado que, se alguém assim quiser sugerir, podíamos apreciar todos os restantes artigos e deixar os artigos 3.º e 4.º, bem como o n.º 2 do artigo 1.º, para a próxima sessão plenária. Continuaríamos depois com a contribuição predial.

Interrompo a sessão por 10 minutos.

(A sessão foi interrompida por 10 minutos)

Presidente: Vou por à apreciação o artigo 3.º do projecto.

Tem a palavra o Deputado Diamantino Ferreira.

Diamantino Ferreira: Sr. Presidente, em nome da Comissão, proponho que seja sustada a discussão e aprovação dos artigos 3.º e 4.º do projecto, continuando a discussão relativa aos artigo 5.º, 6.º, 7.º e 8.º. Proponho, pois, que seja dado mais algum tempo para reflectir sobre a matéria dos artigos 3.º e 4.º. Além de alguns Deputados estarem ausentes, foram apresentadas sugestões e ideias que merecem a nossa ponderação. De qualquer forma, não há uma urgência absoluta em passar a lei ainda hoje, pelo que, numa próxima sessão, poderemos debruçar-nos melhor sobre estes dois artigos.

Presidente: Queria explicar ao Sr. Dr. Mário Isaac que, na apreciação na especialidade, aprovámos o n.º 1 do artigo 1.º. O n.º 2, por conter matéria mais delicada, ficou para ser analisado conjuntamente com a solução que venha a ser dada aos artigos 3.º e 4.º.

Quanto aos artigos 3.º e 4.º, o Deputado Diamantino Ferreira acaba de requerer o adiamento da sua discussão, de molde a permitir a cada Deputado uma melhor ponderação sobre esta matéria. Partimos do pressuposto que esta é a opinião dos Deputados presentes e dos ausentes.

Vou por à votação do Plenário o requerimento feito pelo Deputado Diamantino Ferreira, no sentido de ser sustada a apreciação dos artigos 3.º e 4.º, continuando com a apreciação dos artigos 5.º a 8.º do projecto.

Os Srs. Deputados que concordarem, deixam-se estar como estão; os que discordarem, queiram levantar o braço. Foi aprovado.

Passamos agora ao artigo 5.º, que trata das penalidades.

Jorge Rangel: Dá-me licença, Sr. Presidente?

Presidente: Tem a palavra.

Jorge Rangel: Verifico que houve uma alteração no artigo 5.º.

O texto inicial mencionava os casos de reincidência. Não sei se está melhor assim ou se devíamos manter o que estava proposto.

Presidente: Acho que sim. Creio que é de acrescentar a reincidência, para evitar a possibilidade da conversão da pena de prisão em multa. O decreto de Portugal também estabelece que, em caso de reincidência, a pena não poderá ser remível.

A menos que entendamos que há um risco de dizer que, em caso de reincidência a pena não pode ser remível, constituindo como que uma indicação para o julgador remir a pena em todos os casos em que não haja reincidência, parece--me útil acrescentar-se a referência expressa à reincidência.

Outro aspecto que queria ponderar quanto ao n.º 1, é que este número, que é punitivo, fala na "infracção do disposto na presente lei", portanto abrange todas as situações dos artigos anteriores. A primeira coisa que me ocorre, dependendo da aprovação do artigo 4.º e do artigo 5.º, é saber se, para além desta pena de prisão de 6 meses e multa correspondente, não deverá ressalvar-se o caso de certas situações e outros delitos que possam ser punidos por lei especial. Refiro-me, especificamente, ao caso da corrupção ou depravação de menores. Quer dizer, pode haver infracção ao disposto nesta lei e, concomitantemente, haver alguém que fique em curso na corrupção e depravação de menores. Suponhamos, por exemplo, uma casa clandestina que se dedica à venda de material e artigos pornográficos e se venha a apurar que durante meses andou a fornecer esse material a menores de 18 anos. Pode acontecer que, além desta incriminação específica, haja lugar a aplicação de uma outra pena. Parece-me de ressalvar estas situações.

O decreto de Portugal tinha uma redacção um pouco diferente. Dizia o seguinte: "A infracção ao disposto no presente diploma para a qual nele não se preveja pena especial, fará incorrer os seus autores na pena de prisão de 6 meses".

Quer dizer, dava a entender que se o diploma prevê pena especial é essa que se aplica, se não prevê, então são os tais 6 meses.

Aqui, não é só o caso do diploma, é também o caso da lei geral penal e o caso das leis especiais. Assim sendo, podíamos adoptar uma redacção parecida e concebida nestes termos: "A infracção do disposto na presente lei para a qual se não preveja pena especial, fará incorrer os seus autores...". Em alternativa, podemos dizer, no n.º 4, o seguinte: "O disposto neste artigo revoga as normas penais incriminadoras de condutas que não estejam previstas mas relacionadas com elas.". Uma redacção parecida com a das sociedades secretas. Nem obstará à aplicação de penas mais graves que, porventura, existam na legislação em vigor.

Não sei se me fiz perceber, mas isto daria uma maior cobertura legal ao texto.

Não sei se alguém quer subscrever esta solução.

Portanto, teríamos o n.º 2 que diria que, em caso de reincidência, a pena não poderia ser remível. O n.º 3 seria o actual n.º 2. O n.º 4 seria o actual n.º 3 e o n.º 5 diria que o disposto neste artigo não obsta à aplicação de outras penas mais graves que, porventura, sejam previstas na legislação em vigor.

Diamantino Ferreira: Se me dá licença, gostava de explicar porque é que não acautelámos a hipótese da reincidência. Quisemos deixar isso ao arbítrio do julgador, com a aplicação das regras gerais.

Por outro lado, já que este diploma é anterior à entrada em vigor da Constituição, ou pelo menos, coincide com ela, não sabemos em que medida é que pode colidir com o princípio constitucional de que as penas de multa não são conversíveis em prisão, embora saibamos que a lei ordinária arranjou um mecanismo especial que garante, pelo menos, o pagamento das multas. Sei que em muitos diplomas é usada a norma imperativa em que, em caso de reincidência, fica vedado ao julgador o recurso único à multa, tendo de ser aplicada uma pena de prisão.

Esta a razão porque não se entrou nesta matéria melindrosa...

Presidente: O que interessava focar é que, em caso de reincidência, a pena de prisão não poderá ser substituída por multa. Como o funcionamento da reincidência daria lugar ao aumento da pena, a primeira pena era de 6 meses de prisão e a segunda seria de 9 meses, se não estou em erro. O que pretende dizer é que não se pode converter a pena de prisão em multa. Tal como está, o juiz pode sempre substituir a prisão por multa.

O último número seria aquele que ressalvaria as situações especiais de acumulação de infracções e a hipótese de pena mais grave para o delito cometido.

Vou por o artigo à votação, com os aditamentos propostos. Acrescenta-se que, em caso de reincidência, a pena não poderá ser declarada remível e acrescentava-se um outro número a ressalvar penas mais graves, porventura aplicáveis nos termos da legislação vigente.

Os Srs. Deputados que concordarem, deixam-se estar como estão; os que discordarem, queiram levantar o braço. Está aprovado o artigo 5.º.

Ponho agora à apreciação, na especialidade, o artigo 6.º.

Não sei se alguém quer usar da palavra sobre esta matéria.

Se não houver dúvidas, passo à votação.

Os Srs. Deputados que concordarem, deixam-se estar como estão; os que discordarem, queiram levantar o braço. Está aprovado o artigo 6.º.

Ponho à apreciação o artigo 7.º.

Tem a palavra o Deputado Patrício Guterres.

Patrício Guterres: Este artigo 7.º, qual a ... que tem aqui presente?

Diz: "...terão o destino que for determinado pela competente sentença especial." Estará aqui prevista a hipótese de os objectos serem apreendidos e depois não haver julgamento?

Presidente: Não haver julgamento?

Patrício Guterres: Sim. Pode dar-se o caso de a polícia apreender determinado material considerado pornográfico ou obsceno e o juiz do competente tribunal, por qualquer motivo, não proceder a julgamento. Não havendo julgamento, não há sentença.

Presidente: Mas haverá um despacho com o mesmo efeito de uma sentença, a declarar que não há motivo para julgamento. Como se trata de um caso de processo correccional, o juiz, na sentença, dirá que absolve as pessoas, ou então, se antes disso o juiz de instrução criminal entender que a matéria não é crime, há um despacho que equivale a uma sentença, que dirá que o material foi mal apreendido porque não há infracção a esta lei. Assim, o material será devolvido.

Há aqui várias hipóteses a considerar. Se achar que é conveniente evitar dúvidas, talvez se possa dizer que, "terá o destino que for determinado pela competente decisão judicial". Talvez seja mais amplo que palavra "sentença", que tem o sentido restrito de sentença no final de um processo. Se quisermos, podemos falar em "decisão de autoridade judicial", porque se trata de um juiz de instrução criminal.

Jorge Rangel: Sr. Presidente, não se menciona aqui, portanto, que os objectos serão destruídos.

Presidente: O juiz é que determinará o seu destino.

Também surgiu aqui uma dúvida, da parte da Comissão, que resultou, precisamente, do artigo 51.º do Estatuto Orgânico de Macau, onde se diz que a administração da Justiça era da competência dos órgãos de soberania da República. Uma vez que esta matéria é ligada ao processo penal, entendeu-se que era mais prudente a Assembleia não entrar neste domínio. A matéria do destino dos objectos do crime costuma vir regulamentada no Código Penal, já sendo matéria de direito substantivo. No entanto, no dia de amanhã, poderá haver discussão à volta disto, a determinação se é direito substantivo ou direito adjectivo. Na hipótese de ser adjectivo, logo se argui de inconstitucional. Trata--se, portanto, de uma questão de prudência a falta de referência quanto à destruição.

Diamantino Ferreira: Parece-me que sim, Sr. Presidente.

Parece-me que o tribunal judicial determinará a destruição, não sendo necessário fazer qualquer recomendação ao poder judicial. A solução normal é a destruição

Não sei se...não, creio que não haverá museu de criminologia para esses casos, a não ser instrumentos sado-masoquistas que podem fazer parte de um museu de criminologia. Até é uma hipótese a acautelar.

Acho que a decisão judicial encarregar-se-á de determinar isso. Julgo que não devemos ir tão longe. Quanto menos limitações estabelecermos à actuação judicial, melhor será.

Presidente: Estou a ver aqui no Código Penal o artigo 75.º, que estabelece os efeitos da condenação, e que diz: "O réu efectivamente condenado, qualquer que seja a pena, incorre na perda a favor do Estado dos instrumentos do crime". Ora bem, não sei o não dizer nada, levará o juiz a considerar isto como perdido favor do Estado, quando a ideia deve ser, precisamente, a destruição.

Lembro-me que no decreto dos estupefacientes, matéria legislada em Portugal, se diz expressamente que os estupefacientes apreendidos serão destruídos na presença das entidades oficiais.

Tem a palavra.

Diamantino Ferreira: Uma observação do Sr. Rosa Nunes levou-me a pensar no seguinte: é que nem todos os objectos utilizados para esses fins indecorosos são destruídos. Alguns, creio eu, são vendidos em hasta pública. Refiro-me, concretamente, aos projectores dos filmes que não são, objectivamente, material pornográfico. Não vejo porque é que o Sr. Dr. Juiz os mandará destruir. Com toda a certeza, tal material ficará na posse da Secção de Património dos Serviços de Finanças para venda em hasta pública, a exemplo do que tem acontecido até hoje.

Jorge Rangel: A destruição é só dos objectos pornográficos, não será da máquina, obviamente.

Diamantino Ferreira: Não. É instrumento, é instrumento.

Presidente: Diz aqui: "Os objectos e meios de conteúdo pornográfico e obsceno encontrados...".

Temos ainda três preceitos para serem apreciados oportunamente, o que não impede, evidentemente, que na altura da sua apreciação, se possa pensar em qualquer outra solução.

Ponho à votação o artigo 7.º, tal como se acha concebido, com a alteração da palavra "sentença" para "decisão".

Os que concordarem, deixam-se estar como estão. Os que discordarem, queiram levantar o braço. Está aprovado.

Ponho à apreciação o artigo 8.º.

Diamantino Ferreira: Sr. Presidente, dá-me licença?

Creio eu que o artigo 8.º está largamente dependente da aprovação dos outros artigos, ainda que não haja uma dependência, digamos, doutrinária. Trata-se de uma dependência de ordem temporal. Só podemos fixar o começo de vigência da lei, quando a tivermos completamente aprovada.

Não sei se concorda com este ponto de vista, Sr. Presidente.

Presidente: Entendia que, para mostrar a preocupação desta Assembleia, o grande alcance, por exemplo, no evitar a exibição de filmes pornográficos, seria conveniente a entrada imediata em vigor da lei. Isto obrigaria qualquer cinema, a partir da publicação no Boletim Oficial, a ter de, na hipótese de vir a ser aprovado o artigo 4.º, pagar por cada sessão uma quantia determinada, logo após a classificação do filme como pornográfico pela Comissão de Espectáculos.

É uma hipótese mas, de qualquer maneira, acho que, se o Plenário concordar, fica o artigo 8.º também para ser apreciado e votado conjuntamente com os artigos 3.º, 4.º e com o n.º 1 do artigo 1.º.

Ponho essa proposta à votação.

Os que concordarem, deixam-se estar como estão. Os que discordarem, queiram levantar o braço. Foi aprovado.

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Em virtude dos problemas verificados aquando das gravação, resultou a impossibilidade de passar a escrito a acta da intervenção.