– Anexam-se
Documentos vários à presente Colectânea dada a sua importância para o Tema *
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* Alguns dos documentos não se encontram identificados quanto à sua autoria.
Projecto prévio tendo em vista a elaboração de um Projecto de Lei referente ao crime organizado.
Sugestões de alteração (em Itálico) formuladas nos Gabinetes dos Secretário-Adjuntos para a Justiça e Segurança
1. Para efeitos do disposto na presente lei consideram-se associações ou sociedades secretas, as organizações clandestinamente formadas ou legalmente constituidas, para cometerem infracções penais e cuja existência se manifeste por convenção ou quaisquer outros factos, designadamente pela prática, cumulativa ou não, dos seguintes ilícitos:
a) .................................................................................................
o) Importação, exportação, compra, venda, fabrico, uso, porte e detenção de armas proibidas e substâncias explosivas, ou ainda quaisquer engenhos ou artefactos adequados à prática dos crimes a que se referem os artigos 264.º e 265.º do Código Penal.
t) ..................................................................................................
2. A conjugação de esforços e vontades que se dirija à prática intencionalmente reiterada dos crimes constantes do n.º 1 constituem presunção da existência de uma associação ou sociedade secreta..
3. Para a existência das associações referidas nos números anteriores não é necessário:
a) Que tenham sede ou lugar determinado para reuniões,
b) Que os membros se conheçam entre si e se reunam periodicamente,
c) Que tenham comando, direcção, ou hierarquia organizada que lhes dê unidade e impulso;
d) Que tenham convenção escrita reguladora da sua constituição, actividade ou distribuição dos seus encargos e lucros.
1. Constituem presunções legais da qualidade de membro de uma associação ou sociedade secreta, os seguinets factos.
a) A prática dos crimes a que se refere o n.º 1 do artigo 1.º, com excepção dos referidos nas alíneas a) e i);
b) ... ... ... (alínea a) do projecto) ... ....
c) ... ... ... (alínea b) do projecto) ... ....
d) ... ... ... (alínea c) do projecto) ... ....
e) ... ... ... (alínea d) do projecto) ... ....
f) ... ... ... (alínea e) do projecto) ... ....
g) Os obtidos em face de cadastro policial ou registo criminal provenientes de entidades competentes de outros países ou territórios;
h) A posse de património manifestamente desproporcional aos rendimentos expectáveis das actividades profissionais ou económicas desenvolvidas;
i) A posse de meios técnicos susceptíveis de se intrometerem sem consentimento, passiva ou activamente, no conteúdo das comunicações das forças e serviços de segurança, ou dele tomarem conhecimento.
2 . .................................................................................................
São desde já declaradas associações ou sociedades secretas as usualmente designadas por:
a) 14 Kilates;
b) Wo On Lock, aliàs Soi Fong, aliàs Gasosa;
c) Wo Seng I, aliàs Seng I;
d) Iau Lun.
Com excepção do disposto no artigo 4º, as penas de prisão aplicadas pela prática dos crimes a que se referem os artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º, e 9.º, não podem ser suspensas.
1 ................................, e bem assim incapacitado para integrar, por si ou por interposta pessoa, os órgãos sociais de quaisquer pessoas colectivas de direito público ou privado.
2 ................................
3 . ...............................
4 ................................
1. Quem invocar relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta é punido com pena de prisão até 3 anos.
2. Se essa invocação for de forma a provocar medo ou inquietação noutra pessoa, lhe causar prejuízo ou afectar a liberdade de determinação, designadamente constrangendo-a a uma acção ou omissão ou a suportar uma actividade, o agente é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos.
O procedimento criminal pelos crimes previstos na presente lei não depende de queixa.
Nos casos de condenação em reincidência, pelos crimes previstos nos artigo 3.º, 6.º, 7.º, 8.º, e 9.º não é permitida a colocação em liberdade condicional, devendo a pena de prisão ser cumprida integralmente.
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1 Deve ser eliminado o n.º 2 do artigo 7.º
A medida de internamento em instituto educacional, aplicada a menor de 16 anos pela prática de quaisquer dos factos descritos nos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º, e 9.º da presente lei, cessa logo que o menor atinja 21 anos de idade, sem prejuizo de antes o tribunal lhe pôr termo em virtude de ele se mostrar socialmente readaptado.
1. A autoridade judiciária só ordenará a junção ao processo do relato a que se refere o n.º 4 do artigo anterior se a reputar absolutamente indispensável em termos probatórios e se for garantida a protecção do segredo sobre a identidade do funcionário ou do terceiro.
2 . .
3 . ........................................, devendo garantir-se a ocultação da imagem, voz e identidade do funcionário ou do terceiro.
4. Para efeitos do número anterior, o conhecimento de quaisquer elementos que possam conduzir à revelação da identidade do funcionário ou do terceiro, é reservado àautoridade judiciária.
1. São admitidos como meios de prova, para efeitos de instrução dos processos referentes aos crimes previstos na presente lei, os registos criminais ou cadastro policial, cohidos junto de entidades competentes do país ou território de origem.
2. São igualmente admitidos como meios de prova os registos informáticos, videográficos ou magnetofónicos, mesmo que obtidos em locais de acesso público reservado.
1
2. Havendo fundadas razões para crer que o ofendido, uma testemunha, o assistente, a parte civil ou perito, possam, por temor de represálias, vir a deslocar-se para o exterior, ou de qualquer forma manifestar impossibilidade de ser ouvidas em julgamento, procede-se àtomada de declarações para memória futura na presença exclusiva do Ministério Público e do Juiz de Instrução.
3 ........................................., devendo, porém, adoptar-se os procedimentos de protecção de identidade, voz e imagem nos referidos no artigo anterior.
4. É permitida a leitura em audiência de declarações do ofendido, do assistente, de testemunha, de perito ou da parte civil mesmo que prestadas perante o Ministério Público ou órgão de policia criminal quando o juíz o entender como necessário para a descoberta da verdade material.
Aos arguidos dos crimes previstos nos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º, e 9.º, o Juiz deve aplicar a medida de prisão preventiva.
Para efeitos do disposto na presente lei, os orgãos de policia criminal podem, nos termos previstos no nº 3 do artigo 233º do Código de Processo Penal, conduzir as pessoas ao posto policial e compeli-las a permanecer ali por um período em caso algum superior a 24 horas.
1 . ... ... ... ... ... ... ... ... ... ....
2 . ... ... ... ... ... ... ... ... ... ....
3 . ... ... ... ... ... ... ... ... ... ....
4 . .... ... ... ... ... ... ... ... ... ....
5. São declarados perdidos a favor do Território os bens, depósitos ou valores apreendidos nos termos do n.º 1, desde que não seja provada a licitude da sua origem.
O Conselho Judiciário pode, justificando-se por razões de excepcional segurança pessoal, autorizar que todos os actos de processo, incluindo o julgamento, decorram sem que a identidade e imagem das autoridades judiciárias intervenientes sejam reveladas, para tanto fazendo uso dos meios vídeo e magnetofónicos entendidos por adequados.
1. A protecção da identidade e imagem dos intervenientes processuais especialmente tratados no âmbito da presente lei, mantem-se em segredo de justiça, mesmo após o trânsito em julgado da decisão final, incluindo a de arquivamento, por um período de 10 anos.
2. Quem ilegitimamente revelar factos ou actos de processo que corram seus termos ao abrigo do regime especial da presente lei, cobertos pelo segredo de justiça, é punido com a pena de prisão de 1 a 5 anos.
2. O funcionário que pratique os factos a que se refere o número anterior constitui-se em infracção disciplinar muito grave incompatível com o exercício de funções públicas.
Projecto prévio tendo em vista a elaboração de um Projecto de Lei referente ao crime organizado.
Sugestões de alteração (em Itálico) formuladas no Gabinete do Secretário-Adjuntos para a Segurança
1. Para efeitos do disposto na presente lei consideram-se associações ou, sociedades secretas, as organizações clandestinamente formadas ou legalmente constituidas para cometerem infracções penais e cuja existência se manifeste por convenção ou quaisquer outros factos, designadamente pela prática, cumulativa ou não dos seguintes ilícitos:
a) .................................................................................................
o) Importação, exportação, compra, venda, fabrico, uso, porte e detenção de armas proibidas e substâncias explosivas, ou ainda quaisquer engenhos ou artefactos adequados à prática dos crimes a que se referem os artigos 264.º e 265.º do Código Penal.
t) ..................................................................................................
2. A conjugação de esforços e vontades que se dirija à prática intencionalmente reiterada dos crimes constantes do n.º 1 constituem presunção da existência de uma asociação ou sociedade secreta.
3. Para a existência das associações referidas nos números anteriores não é necessário:
a) Que tenham sede ou lugar determinado para reuniões;
b) Que os membros se conheçam entre si e se reunam periodicament;
c Que tenham comando, direcção ou hierarquiorganizada que lhes dê unidade e impulso
d) Que tenham convenção escrita reguladora da sua constituição, actividade ou distribuição dos seus encargos e lucros
1. Constituem presunções legais da qualidade de membro de uma associação ou sociedade secreta, os seguintes factos:
a) A prática dos crimes a que se refere o n.º 1 do artigo 1.º, com excepção dos referidos nas alíneas a) e i)
b) ... ... ... . (alínea a do projecto) ... ... ...
c) ... ... ... . (alínea b do projecto) ... ... ...
d) ... ... ... . (alínea c do projecto) ... ... ...
e) ... ... ... . (alinea d do projecto) ... ... ...
f) ... ... ... . (alínea e do projecto) ... ... ...
g) Os obtidos em face de cadastro policial ou registo criminal provenientes de entidades competentes de outros países ou territórios.
h Os colhidos de registos videográficos ou magnetofónicos obtidos em locais de acesso público, mesmo que reservado.
i) Os que resultem da exposição de bens de fortuna manifestamente desproporcionais aos ganhos expectáveis das actividades ou meios económicos desenvolvidos.
2 .......................
São desde já declaradas associações ou sociedades secretas as usualmente designadas por:
a) 14 Kilates
b) Wo On Lock, aliás Soi Fong, aliás Gasosa
c) Wo Seng I, aliàs Seng I
d) Iau Lun
Artigo 4.º-A
(Proibição de suspensão da pena de prisão)
Com excepção do disposto no artigo 4.º as penas de prisão aplicadas pela prática dos crimes a que se referem os artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º não podem ser suspensas na sua execução
1. ........, e bem assim incapacitado para integrar, por si ou por interposta pessoa, os órgãos sociais de quaisquer pessoas colectivas de direito público ou privado.
2. .............................................................
1. Quem invocar a relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta de forma a provocar medo ou inquitação noutra pessoa ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, designadamente, constrangendo-a a uma acção ou omissão ou a suportar uma actividade, é punido com a pena de prisão até três anos.
2. . ......................
1. . ......................
2 . .......................
3. Não é permitido o recurso ao instituto da liberdade condicional., devendo a pena de prisão ser cumprida até ao seu termo, nos casos de condenação pelos crimes a que se referem os números anteriores.
Os menores de 16 anos que pratiquem quaisquer dos crimes previstos nos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º, uma vez atingida a maioridade, podem ver prorrogada, até 3 anos, a medida tutelar imposta, verificando-se inadequada reinserção ou conduta reveladora de perigosidade social.
1. A autoridade judiciária só ordenará a junção ao processo do relato a que se refere o n.º 4 do artigo anterior se a reputar absolutamente indispensável em termos probatórios e se for garantida a protecção do segredo sobre a identidade do interveniente.
2. .................................................................................................
3. ........., devendo garantir-se a ocultação da imagem, voz e identidade do interveniente.
4. Para efeitos do número anterior o conhecimento de quaisquer elementos que possam conduzir à revelação da identidade do interveniente é exclusivo da autoridade judiciária.
1. .................................................................................................
2. Havendo fundadas razões para crer que o ofendido, uma testemunha, o assistente, a partir civil ou perito, possam, por temor de represálias, vir a deslocar-se para o exterior, ou de qualquer forma manifestar impossibilidade de ser ouvidas em julgamento, procede-se à tomada de declarações para memória futura na presença exclusiva do Ministério Público e do Juiz de Instrução.
3. .........................., devendo, porém, adoptar-se os procedimentos de protecção de identidade, voz e imagem nos referidos no artigo anterior.
4. É permitida a leitura em audiência de declarações do ofendido, do assistente, de testemunha, de perito ou da parte civil mesmo que prestadas perante o Ministério Público ou órgão de policia criminal quando houver entre elas e as feitas em audiência, contradições ou discrepâncias sensíveis ou o juíz o entender como necessário para a descoberta da verdade material.
Quando a busca domiciliária visar algum ou alguns dos crimes a que se referem os artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º, e 9.º, podem ser executadas independentemente da observância do disposto nos artigos 162.º, n.º 1 do Código do Processo Penal.
Aos arguidos dos crimes previstos nos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º, e 9.º, o Juiz deve aplicar a medida de prisão preventiva.
1 ... ... ... ... ... ...
2. ... ... ... ... ... ...
3. ... ... ... ... ... ...
4. ... ... ... ... ... ...
5. São declarados perdidos a favor do Território os bens, depósitos ou valores apreendidos nos termos do n.º 1, desde que não seja provada a licitude da sua origem.
O Conselho Judiciário pode, justificando-se por razões de excepcional segurança pessoal, autorizar que todos os actos de processo, incluindo o julgamento, decorram sem que a identidade e imagem das autoridades judiciárias intervenientes, sejam reveladas, para tanto fazendo uso dos meios vídeo e magnetofónicos entendidos por adequados.
1. A protecção da identidade e imagem dos intervenientes processuais especialmente tratados no âmbito da presente lei, mantem-se em segredo de justiça, mesmo após o trânsito em julgado da decisão final, incluindo a de arquivamento.
2. Quem ilegitimamente revelar factos ou actos de processo que corram seus termos ao abrigo do regime especial da presente lei, cobertos pelo segredo de justiça, é punido com a pena de prisão de 2 a 8 anos.
3. O funcionário que pratique os factos a que se refere o número anterior constitui-se em infracção disciplinar muito grave incompatível com o exercício de funções públicas.
O projecto que nos foi remtido merece globalmente a nossa aprovação.
Aliás, as linhas gerais haviam já sido expostas em reunião dos Srs. Deputados e da Dra. Leonor Assunção com os Juizes deste Tribunal.
No entanto, permitimo-nos colocar algumas dúvidas e observações.
Assim:
Artigo 2.º
a) Definindo o art.º 1.º a associação ou sociedade secreta, o art.º 3.º deverá conter como epígrafe "Crime de associação ou sociedade secreta" uma vez que os vários números do preceito se reportam à punição do mesmo crime.
b) No n.º 3 a seguir a aliciamento deveria também incluir-se "propaganda", em coerência com o que se refere no n.º 2.
Artigo 4.º
a) Não parece correcto dizer "o facto deixa de ser punível" pois isso poderia levar a pensar em exclusão de ilicitude (art.º 30.º do C. P.). Parece-nos mais correcto dizer que pode haver lugar "a isenção ou dispensa da pena" utilizando a terminologia do C. P. (art.º 68) e que o art.º 18.º n.º 2 do D.L. 5/91/M de 28/1. também consagra.
b) Ao prever-se
1. a atenuação especial da pena
2. a substituição por pena não privativa de liberdade.
3. a "não punição" (dispensa de pena)
pretende-se deixar ao critério do Tribunal a escolha dessas medidas, à semelhança do que resulta do art.º 18.º n.º 2 do D.L. 5/91/M de 28/1?
Não seria possível concretizar melhor os casos de aplicação de cada medida de modo a evitar uma certa subjectividade do julgador?
Artigo 12.º
a) O C. Penal – art.º 77.º n.º 1 – consagra a possibilidade de prorrogação da pena desde que se verifiquem cumulativamente os requisitos das alíneas a) e b). Neste preceito – art.º 12.º – a falta do "e" parece dar a entender que basta cada um dos requisitos para que a pena possa ser revogada. Há efectivamente lapso ou pretende-se a alternativa?
b) Na b) fala-se em "indícios de continuidade da vinculação à sociedade (pretende-se dizer associação?) ou sociedadas secretas" Ora, isto colou desde logo duas questões:
– em primeiro lugar determinar que indícios são esses.
– por outro lado pode acontecer que a prorrogação (3 anos) com base nesses Indícios seja superior à própria pena aplicada inicialmente (vejase o caso de ter havido uma pena especialmente atenuada).
Artigo 13.º
A expressão "fortes indícios" levante também alguns problemas. Em primeiro lugar saber quais são "esses fortes indícios".
Por outro lado, saber quem aprecia esses indícios.
Qualquer destas questões pode envolver violação do princípio da liberdade dos indivíduos.
Artigo 14.º
Quando se refere "condenar os respectivos membros" não está certamente a pensar-se na condenação de todos os membros das associações ou sociedades. Por isso, talvez fosse preferivel referir "condenar algum ou alguns dos seus membros". Uma vez que tenha sido apurada a actividade ilícita da sociedade isso será suficiente para ordenar a sua dissolução.
Artigo 15.º
Não resulta muito clara a última parte do preceito "e para tal efeito receber armas, munições, instrumentos ..."
Será que as armas, instrumentos do crime são fornecidos pela autoridade de polícia criminal ao "agente infiltrado"?
Talvez fosse melhor esclarecer este aspecto mesmo que fosse necessário desdobrar este número em dois.
Artigo 16.º
No n.º 3 refere-se "em que o Juiz determine".
Ora, não é o Juiz que indica a prova a produzir em audiência, mas sim, no caso, o M.P. Quando muito, o Juiz pode determinar a comparência, a requerimento do M.P., no decurso da audiência.
Por isso talvez fosse preferível dizer "Nos caos em que o Juiz determine, o requerimento do M.P., por indispensabilidade...
Artigo 17.º
Em obediência ao art.º 129.º n.º 4 do C.P.P. deveria fazer-se acrescentar-se após pessoa alguma,: "salvo o defensor"
Artigo 18.º
a) O n.º 3, consagrando embora a abrigatriedade de o arguido responder a perguntas, sobre..., não indica depois qualquer sanção para o caso da recusa de resposta ou de falsas declarações. Seria conveniente estabelecer desde logo as consequências da recusa ou das falsas declarações. Poderia acrescentar-se "sob pena de cometimento de crime de desobediência ou de falsas declarações". A não se estabelecer sanção a advertência não produz quaisquer efeitos ficando a colaboração com a justiça dependente da boa vontade do arguido.
b) No n.º 5 refere-se: "Provando a origem ilícita...". Talvez fosse conveniente acrescentar, até em outro número, que são também declarados perdidos os ... de proveniência licita destinados a actividade criminosa, embora isso possa já resultar da lei geral (art.º 101.º n.º 1 do C. Penal).
Artigo 19.º
Há mero lapso material quando se refere n.º 1 do art.º 17.º.
Queria referir-se art.º 18.º n.º 1.
- Analisado o Projecto de Lei apresentado pela Assembleia Legislativa a D.I.C.J., apesar de ser de opinião de que se trata de um projecto que responde às exigências de um combate eficaz ao crime organizado, julga ser pertinente a introdução das alterações sugeridas pelo Gabinete do Secretário-Adjunto para a Segurança pois entende que estas são importantes nomeadamente para enfrentar situações especiais de "crise", como aquela que presentemente o Território de Macau enfrenta.
- Para além da introdução das sugestões apresentadas pelo G. S. A. Segurança, a D.I.C.J. sugere as seguintes alterações:
a) ........................................................................................
r) Falsificação de moeda, títulos de crédito, cartões de crédito, documentos de identificação e de viagens.
1. Quem invocar a relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta ou actuar de forma a criar a convicção de tal pertença e, assim, provocar medo...
Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos, em Macau, aos 16 de Maio de 1997.
O Director, subst.º, Manuel Joaqim das Neves.
1 A condenação a pena de prisão, pela prática de qualquer crime, que tenha transitado em julgado pode ser excepcionalmente revista e aquela pena reduzida até metade da sua duração se, posteriormente, o condenado adoptar alguma das condutas mencionadas no artigo anterior.
2. À revisão prevista no artigo anterior é aplicável, com as devidas adaptações, o disposto nos artigos 433.º e 434.º, no n.º 1 do artigo 435.º e nos artigos 436.º a 438.º e 447.º do Código de Processo Penal, com as especificidades constantes dos artigos seguintes.
3. O requerimento a pedir a revisão contém a enumeração das condutas que o condenado se dispõe a adoptar.
4. Na vista que tenha no Tribunal Superior de Justiça, o Ministério Público propõe, quando seja o caso, o montante da redução da pena bem como a respectiva motivação.
5. Se for autorizada a revisão, o Tribunal Superior de Justiça fixa o montante da redução da pena de prisão a que o requerente fora condenado.
6. Da decisão do Tribunal Superior de Justiça não é admissível recurso.
O disposto no artigo 5.º aplica-se às sentenças transitadas em julgado à data da entrada em vigor da presente lei.
A razão de ser da punibilidade, ou da incriminação, das associações criminosas arranca da intranquilidade pública resultante da existência destas sociedades, na medida em que pelo facto da sua existência como pelos processos de actuação ameaçam a liberdade, a tranquilidade e a segurança dos cidadãos e até os seus bens.
Estas organizões clandestinas, conforme a sua força e expressão tem o crime como meio de conseguir proventos económicos, senão mesmo o controle do poder político, pelo que uma das suas regras de oiro é o silêncio sobre tudo quanto reporte à organização, o que acarreta uma grande dificuldade na obtenção de provas da sua própria existência.
Por isso, já em 1978, o legislador de Macau, realisticamente, se fez vaier de facto externos reveladores da existência da organização para ter esta como existente. É o que consta da segunda parte do n.º 1, do art.º 2.º da Lei 1/78/M, de 4/2.
E, neste aspecto, parece-me que o Projecto Prévio nem, sequer, consegue os mesmos objectivos da Lei 1/78, por deixar de fora quasi todos os casos que podiam cair sob a alçada da lei incriminadora actual, segundo a orientação traçada pelo Tribunal Superior, designadamente no seu acórdão n.º 592/96 de que se junta cópia.
O projecto prévio, no seu art.º 1.º, põe tantas exigências de vertificação que raros serão os casos de nele se enquadrar a conduta dos criminosos que actuam concertadamente e em conjugação de esforços.
Basta o exemplo dum grupo organizado para cometer qualquer crime, mesmo dos referidos no art.º 1, onde, confessadamente, se arrede a possibilidade dos membros dessa associação se poderem aproveitar da força de intimidação do vínculo associativo.
Ou, mesmo, quem use dessa força de intimidação apenas para a prática de crimes onde não possa obter vantagens ou benefícios ilícitos, mas apenas por mera perversão ou malvadez (como a de envenenar as águas da rede pública).
Por isso, mais perfeita, no sentido de lançar uma malha mais apertada, é a actual redacção do artigo 2.º da Lei n.º 1/78/M.
O que varelá a pena é partir da realidade criminal de Macau e punir certas actuações típicas das organizações com a pena cumulada que caiba ao próprio crime da organização criminosa e ainda sujeitar os seus autores ás medidas de apreensão de bens que normalmente serão produto do crime e da actividade criminosa.
Para tanto, se se afirmarem certas categorias de crimes como típicas das associações criminosas deve acrescer, segundo a técnica da acumulação de infracções, a pena correspondente ao crime de associação criminosa á pena, ou penas aplicadas, pela prática de crime ou crimes típicos, sempre que eles sejam levados a cabo concertadamente e em comunhão de esforço de dois ou mais indivíduos.
Aos indivíduos, tidos como autores dos crimes em causa, seriam de aplicar as normas de reacção patrimonial que se apontam no Projecto Prévio.
E mais.
Se a razão de ser da incriminação é a de restabelecer a tranquilidade da vida social normalmente organizada e reprovar, eticamente, a daqueles que têm ou mantem qualquer ligação ás associações criminosas, parece-me evidente que um Território, como Macau, onde o fenómeno é tão vivo e subiu tão alto, seja merecedora de incriminação autóma toda a qualquer manifestação de exibição da ligação dum individuo aquele mundo do crime, já que o simples alardear dessa ligação já gara, por si, intranquilidade ao cidadão de bem.
Também serão de ponderar, como dignas de censura penal, certas formas de vida socialmente improdutivas, senão parasitárias como a daqueles que não tendo ocupação vagueiam pelas salas de jogos ou pelos casinos e sua imediações.
Estes indivíduos depois de referenciados pelas autoridades políciais e verificada a falta de meios de subsistência licita, seriam impedidos de entrar nas salas de jogo, per decisão administrativa, salvo se revelassem proveniências licitas de rendimento, o que logo permitiria a sua punição subsequente por desobediência se violassem a ordem de proibição.
Consideremos, então, o aticulado do Projecto Prévio.
Quanto ao artigo 1.º.
Como se disse, melhor seria deixar como está a Lei n.º 1/78/M, no seu artigo 2.º, n.º 1, afeiçoando a terminologia usada á do Código Penal podendo, então, pertilhar-se o eienco das infrações constantes das várias alíneas do artigo 1.º do Projecto Prévio.
Quanto ao artigo 2.º.
Em primeiro lugar parece-me absolutamente desnecessário e, até, redutor estar o legislador a tipificar as circunstâncias ou factos que possam servir de indicios probatórios.
Em segundo lugar, a mera indicação legal de indícios não logrará qualquer eficácia no combate ao crime.
Por isso, o que me parece de ponderar é questão de saber se qualquer das situações referidas no art. 2.º, n.º 1 (nas várias alíneas) não são já, por is, factos cansuráveis do ponto de vista social e que por isso devem constituir crimes.
Então, nesta perspectiva, se diria no n.º 1.
Será punido como membro de associação ou socidade secreta quem:
–––
–––
–––
O número 2 diria:
Será punido como dirigente ou chefe de associação ou sociedade secreta quem use ou seja conhecido, entre outros membro da associação, pelos seguintes númerais ou títulos:
Quanto ao artigo 3.º
Devia ser aditado o n.º 4.º, com a redacção seguinte:
N.º 1 ................................
N.º 2 ................................
N.º 3 ................................
N.º 4 "O cometimento de qualquer crime dos referidos no artigo 1.º, em conjugação de esforços, de duas ou mais pessoas, é punido que couber, acumulada com a do número primeiro deste artigo.
Quanto aos artigo 4.º e 5.º
Nada a observar de substancial, embora me pareça pouco clara a redacção do artigo 5.º.
Quanto aos artigo 6.º, 7.º, 8.º e 9.º.
Seriam absorvidos se fosse aditado o n.º 4.º ao artigo 3.º como se propõe.
A filosofia do projecto parece não admitir que a prática dos crimes, que refere nestes artigos n.º 6.º, 7.º, 8.º e 9.º, se possa considerar como, logo, imputada a um grupo de indivíduos associados em organização criminosa. Ou seja, mais do que um indivíduo, actuando concertadamente e em conjugação de esforços com outrem na prática de crimes graves e usuais nas organizações criminosas não constituiriam uma organização criminosa, para o projecto.
Quanto ao artigo 10.º.
1 - A pena do n.º 1 devia ser de 1 a 5 anos.
2 - A pena do n.º 2 deveria ser de 3 a 5 anos.
Quanto ao artigo 13.º.
Deveria ser harmonizado com a sugestão feita de aditamento do n.º 4, do artigo 3.º, e dizer apenas.
"Nos crimes previstos na presente lei não obsta à reincidência o facto de terem decorrido mais de cinco anos entre os momentos da prática da primeira e das infracções subsequentes.".
Quanto ao artigo 14.º.
Bastaria harmonizar o n.º 1 com a sugestão feita no artigo 3.º e dizer:
1 - A pena de prisão efectiva pela prática de crime previsto nesta lei é prorrogada por dois período sucessivos de três anos se:
a)
b)
Quanto aos artigos 11.º, 12.º, 15.º, 16.º, 17.º e 18.º.
Nada de importante se me eferece dizer.
Quanto ao artigo 19.º.
O número 1.º deve ser afeiçoado em conformidade com o proposta em III e dizer assim:
1 - "Nos processos referentes a crime previstos nesta lei..........................".
O número 2.º deverá sem bem mais liberal nos pressupostos, uma vez que a referência ao requisito "temor de represálias" já não será fácil de invocar, precisamente por receio de represálias...
O que se vece procurar é uma recolha do testemunha ou da declaração o mais próxima possível dos acontecimentos e apenas isso.
Então a redacção para este número seria algo como:
"Nos processos por crimes da presente lei proceder-se-á à tomada de declarações para memória futura, nos termos dos artigos 253.º e 276.º e para os efeitos do artigo 337.º, n.º 2 alínea a) do Código de Processo Penal, sempre que o Ministério Público o requeira."
Quanto ao artigo 20.º diria assim:
Quando o juiz deve aplicar a medida de prisão preventiva ao arguído a quem foi imputado qualquer crime punível pelo artigo 3.º.
Quanto ao artigo 21.º.
Deveria ser harmonizado com o que se vem dizendo, normamente, com o proposta do n.º 4, ao artigo 3.º, e dizer.
"1 - ......... quando tiver razões para crer que eles estão relacionados com a prática de qualquer dos crimes previsto nesta lei ou resultam da tranformação ou converção do produto, lucro ou recompensa de qualquer actividade ilícita."
Devia também ser esclarecido o n.º 5 deste artigo do projecto de modo a clarificar o seu funcionamento.
Devia referir-se que "provada em julgamento a origem ilícita......"
Termino recuperando a ideia de determinar a interdição administrativa da entrada nos casinos àqueles que, sendo referenciados pela polícia como frequentadores, não joguem nem tenha meios de subsistência conhecida.
Nesta lei se determinaria alteração á legislação da fiscalização do jogo, para dizer algo como:
1) "Será decretada a interdição da entrada nas salas de jogos dos casinos aos individuos que sejam seus frequentadores habituais, sem efectuarem a postas, ou que as fizerem, apenas simbolicamente, para justificar a sua permanência."
2) "Considera-se como frequentador habitual para efeitos do número anterior, o indivíduo referenciado pela autoridades policiais ou funcionários da Inspecção e Coordenação de Jogos, como "bate fichas", "coça-coça" e outra actividades marginais ao acto de jogo de outrem."
1 . No catálogo de crimes constante do artigo 1.º, em face da perda de importância do contrabando perante a crescente liberalização do comércio, talvez apenas se justifique a inclusão desse crime por meras razões históricas, mas não deve deixar de refletir-se sobre a situação presente em que parte das infrações aduaneiras do interesse das associações secretas passaram a contraordenações.
Por outro lado, não seria dispiciendo que constassem do catálogo as infracções criminais referentes à "lavagem de dinheiro".
Noutro plano, seria de estudar a problemática do "tráfico internacional de mulheres" e de "obras de arte", bem como as questões que levanta a prática de garantia de emprego, ou de qualquer outra actividade lucrativa, perante desembolso inicial do trabalhador ou do interessado.
E também se pode por o problema da manipulação dos resultados do jogo, através de cartel irregular de jogadores.
2. Nos indícios de chefia 1constantes do n.º 2, do artigo 2.º poderá faltar:
e) SEONG FA, Oficial de Estado Maior;
i) CHA SO, Tesoureiro
3. No n.º 1 do artigo 3.º parece excessivo o segmento "concedendo fundos". Por um lado surge a dúvida sobre se se liga ao recrutamento de novos membros, e será assim redundante; por outro lado, se tem em vista qualquer dispendio, nesta perspectiva, poderá trazer enorme insegurança aos particulares já que no artigo 1.º se considera associação ou sociedade secreta também a organização legalmente constituida, que se apresenta em público, portanto, dissimulando os seus objectivos.
_________________
1 Os numerais e títulos dos elementos base são: 49-Combatente soldado, com iniciação, e, Lanterna Azul, sem iniciação.iminado o n.º 2 do artigo 7.º
Deixar a discussão da culpa, nestes casos, para o julgamento (tendencia errónea, mas comum) será uma nítida disfunção do sistema penal.
É de estudar porém a possibilidade de incriminação da cedência perante uma associação secreta desde que se situe abaixo de um determinado nível de constrangimento, por exemplo, quando não haja ameaça de violência física nem esta seja prevísivel, como é o caso dos pagamentos para obter emprego ou estabelecimento em ramo de negócios marginal.
Também nestes casos os arguidos deverão beneficiar de regime especial semelhante ao previsto no artigo 4.º.
4. No n.º 3 ), do artigo 3.º sugere-se a eliminação do segmento "permanecendo o límite máximo inalterável".
5. No ponto 2 do artigo 5.º sugere-se a eliminação do segmento "se o facto revelar indignidade no exercício do cargo".
6. Na redacção dos artigos 6. º, 7. º e 8.º suscita sérias dúvidas o segmento "ainda que se não prove a relação de pertença à uma associação ou sociedade secreta". É que nestas circunstâncias não se vê como distinguir dos casos de simples comparticipação.
A penalidade agravada talvez possa indexar-se aos indícios do artigo 2.º.
7. Na redacção do n.º 1, do artigo 9.º, sugere-se o início: "a exigência de contrapartida para se obter emprego, estabelecimento, praticar qualquer actividade rendosa, ou...".
8. No artigo 13.º poder-se-á estar perante a ambiguidade da competencia para ordenar a medida proposta, que parece dever ser da autoridade administrativa.
9. Parece demasiadamente curto o prazo de convalidação da infiltração urgente prevista no n.º 3, do atigo 15.º.
10. No n.º 3 do artigo 17.º sugere-se a eliminação do segmento "deve, sempre que possível, ser", a substituir por "será".
No número 4 sugere-se a eliminação do segmento "de testemunha", acrescentando-se "e serão sempre exibidas as gravações a que se refere o n.º 3".
11. Ainda no âmbito das regras especiais de processo, sugere-se a possibilidade de sempre que houver flagrante delito dos crimes do catálogo poder serguir-se a forma de processo sumário, independentemente das penas aplicáveis às infracções, com gravação da prova produzida em julgamento e possibilidade de crítica da matéria de facto na via recursiva.
Esta possibilidade poderá ser acrescentada da faculdade conferida ao Ministério Público de poder pedir a suspensão do processo por prazo razoável, desde que haja perspectiva séria de poder vir a aplicar-se o regime especial do artigo 4.º nomeadamente se algum dos arguidos solicitar o Tribunal ou a acusação nesse sentido.
12. Sugere-se a eliminação do n.º 5 do artigo 18.º, passando o n.º 4 a ter a seguinte redacção: "Serão declarados de origem ilícita e perdidos a favor do Território, os bens, depósitos ou valores a que se refere o n.º1, desde que exista uma manifesta desproporção entre o valor dos mesmos e os rendimentos mensais declarados pelo arguido quando este não logre demonstrar a proveniência bastante daquele património.
A Assembleia Legislativa de Macau, atenta ao fenómeno da criminalidade organizada e sua recente evolução no território, tem vindo a debruçar-se - no seio da Comissão especializada - sobre esta questão que a todos preocupa e incomoda.
Como primeiro e significativo resultado, surgiu jà o supra mencionado anteprojecto de lei.
Algumas palavras prévias devem ser dispensadas ao assunto, sob pena de eventuais incompreensões e expectativas infundadas que possam repousar sobre a futura legislação.
Afigura-se evidente que a lei a aprovar revestirá um profundo carácter emblemático, ou seja, funcionará como uma mensagem ao público da preocupação e vontade dos poderes públicos –particularmente da AL, no caso - em procurar resolver ou minorar a criminalidade organizada levada a efeito pelas seitas ou tríades chinesas.
A futura legislação deverá -dentro dos parâmetros de constitucionalidade a que deve obediência, e dentro de juízos de razoabilidade e frieza - proporcionar mecanismos eficazes de prevenção e repressão do fenómeno do crime organizado e, bem assim, dos crimes satélites que orbitam sobre aquele.
Constituirá, assim, um passo mais a adicionar indispensavelmente a outros, não sendo, pois, - nem nunca o poderá ser, em qualquer latitude e tempo - o PASSO de essência, a fórmula milagrosa curandeira de todas as manifestações de criminalidade organizada.
Não se deve, nesta conformidade, depositar demasiadas expectativas, elevadas esperanças num mero documento legal a sair no Jornal oficial.
Uma outra ideia preliminar, já supra insinuada, consubstancia-se na constataçnao de que a futura regulação não se encontra isolada e desgarrada de um ordenamento jurídico local; outrossim, integra-se nesse mesmo ordenamento jurídico, devendo essa integração realizar-se de forma harmónica - sem perder natureza específica e respeitadora dos princípios e normas a que deve respeito - v.g. constitucionais.
Nesta medida, e sob pena de se hipotecarem efeitos úteis decorrentes da nova lei, deverá respeitar-se o normativo constitucional.
Isto não deverá significar, no entanto, uma visão apertada e fundamentalista da realidade constitucional, mas sim - e com juízos de razoabilidade e adequabilidade - estender a teia legal com vista à concretização da eficácia pretendida.
Uma lei, em Macau, sobre criminalidade organizada deverá revestir-se de uma natureza tendencialmente especial - e prioritária - não só devido ao recente surto de crimes associados a essa realidade, mas também porque o fenómeno é já antigo e, crê-se, de grande dimensão.
Ou seja, a lei deverá ter um rumo firme, mas também sereno e estrutural.
Expostas estas primeiras observações prévias e não dcspiciendas, importa então apontar algumas ideias, breves e quase apriorísticas, sobre o articulado apresentado.
As linhas que se seguem norteiam-se, sobretudo, pelo carácter emblemático (e, díriamos mesmo, político) da legislação e pelos princípios a que deverá obediência.
Em termos de apreciação genérica, reputa-se, em nossa modesta opinião, globalmente positiva esta primeira aproximação articulada ao problema.
Uma primeira ideia a reter radica, pelas razões apontadas, na desejabilidade de emitir uma mensagem segura e determinada (mas, repete-se serena); assim, pensa-se ser importante a concretização de uma moldura mais elevada nas penas principais previstas no artigo 3.º, porquanto é na moldura penal que mais directa e rapidamente o grande público apreende e identifica uma determinada vontade do legislador penal.
Relativamente ao artigo 1.º, a referência feita na alínea t) ao crime de contrabando deverá merecer ponderação, porquanto desconhece-se (sem prejuízo de infirmação) a existência deste tipo legal de crime. De qualquer modo, o crime de descaminho poderia igualmente ser considerado.
No elenco de indícios probatórios prevê-se, a participação em cerimónias rituais; afigura-se que, actualmente, tais cenimónias possam ter caído em desuso, pelo que se poderia ponderar a sua manutenção.
Eventualmente sem dignidade para figurar em letra de lei, mas parecendo merecer de qualquer modo ponderação, uma previsão expressa de que, recaindo sobre funcionário qualquer suspeita -ainda que não provada - de pertença ou colaboração com uma associação secreta, deverá o mesmo ser celeremente colocado em outras funções sem importância dentro, ou não, da mesma instituição.
No que concerne ao artigo 6.º, se bem que na normalidade das’ coisas tais homicídios sc consumam com a intervenção de uma pluralidade de agentes, há que não distrair da possibilidade de homicídios cometidos singularmente - como parece ter sucedido recentemente.
Sobre o que vem estatuído no artigo 13.º, proibição de entrada no Território, coloca-se-nos de imediato uma questão: e o que fazer quanto aos residentes? Na verdade, parece crível que muitos dos membros das associações secretas sejam residentes locais (eventualmente, até, cidadãos portugueses).
Deveria, pois, prever-se a expulsão - e concomitante proibição de entrada - de residentes de Macau. De resto, este instituto não é novo, estando já previsto no Estatuto Orgânico de Macau, ex vi artigo 16.º, n.º 1, g).
Relativamente à protecção de funcionário e de terceiro infiltrado, artigo 16.º, colocam-se algumas reservas.
Por um lado, esta ideia de protecção deveria recair também sobre outros (testemunhas, peritos) e, por outro, com o regime previsto no n.º 3, poderá diluir-se, quiçá por completo, o intuito protector que preside ao restante normativo deste artigo ...
Sensivelmente do mesmo modo, nos permitimos criticar o regime que vem estatuído no n.º 4 do artigo 17.º.
A ser apresentada prova testemunhal em audiência de julgamento com suporte vídeo, poderia pensar-se, nomeadamente, em digitalização de imagens e distorção de voz.
Outras questões merecem também algumas palavras.
Afigura-se que a nova lei deverá ser, tanto quanto possível, auto-suficiente em termos de regime jurídico substantivo e adjectivo, e auto-centrada na criminalidade organizada. Deste modo, serão de evitar remissões de ordem penal e de ordem processual penal.
Por outro lado, regras há que poderão igualmente merecer um regime especial, designadamente no que respeita à identificação de suspeito e pedido de informações - artigo 233.º do Código de Processo Penal.
Um cuidado regime de protecção de testemunhas, magistrados, arrependidos, agentes infiltrados e outros, deverá merecer consagração imediata. Ou nesta lei, ou, em alternativa, em outra lei que, no entanto, deverá entrar em vigor simultaneamente.
A inexistir, muitos dos previsíveis efeitos da aplicação desta lei vanescerão com toda a convicção.
Poderá, dentro dos limites constitucionais, e salvo melhor opinião, avançar-se um pouco mais em matéria de recolha de provas, devendo ampliar-se os mecanismos até aos limites da constitucionalidade.
Parece importante ainda uma aposta reforçada em mecanismos que permitam uma asfixia financeira das associações secretas, designadamente através de apreensão de bens e especial fiscalização ao nível tributário e contabilístico.
Estas, em jeito telegráfico, que o tempo disponível impôs, as observações que se oferecem, sem prejuízo de eventual futura maturação e desenvolvimento.
Para efeitos do disposto na presente lei considera-se associação ou sociedade secreta, em chines "Hac Sé Vui", (......) em inglês "Triad Society", a organização clandestina ou legalmente constituida, cuja finalidade ou actividade seja dirigida à prática de crimes, quando os que dela fazem parte se aproveitam da força de intimidação do vínculo associativo, da sujeição e da regra de silêncio que dele derivam, para obter benefícios ou vantagens ilícitas, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação e para praticar, nomeadamente, os crimes seguintes:
a) Homicídio e ofensas corporais;
b) Sequestro e rapto,
c) Ameaça, coacção e extorsão a pretexto de protecção,
d) Lenocínio;
e) Tráfico de estupefacientes;
f) Agiotagem ou usura criminosa;
g) Furto, roubo e dano;
h) Aliciamento e auxílio à migração clandestina;
i) Exploração ilícita de jogo ou de lotarias e apostas mútuas;
j) Administração ilíta de substâncias ou uso de vilência em animais destinados a corridas; (ou ilícitos relacionados com corridas de animais)
l) Usura para jogo;
m) Importação, exportação, compra, venda, fabrico, uso, porte e detenção de armas proibidas e substâncias explosivas;
n) Fraude e corrupção eleitoral;
o) Especulação sobre títulos de transporte;
p) Falsificação de moeda, títulos de crédito e cartões de crédito;
q) Corrupção activa;
r) Extorsão de documento;
s) Abuso de cartão de garantia ou de crédito;
t) Contrabando e descaminho.
1 . Constituem indícios da qualidade de membro de uma associação ou sociedade secreta os seguintes factos:
a) Invocação pelo próprio da qualidade de membro, filiado ou patrocinador da associação, por aitudes, palavras ou actos adequados a criarem a convicção de tal qualidade;
b) A guarda ou o controlo de livros ou extractos de livros, ou contas da associação, relação de membros, ou trajes especificamente adequados às cerimónias rituais da associação;
c) Participação em cerimónias rituais da associção;
d) Participação em reuniões de associações ou sociedades secretas;
e) Utilização de senhas ou códigos de qualquer natureza, característicos das associações secretas.
2 . Constituem indícios de que exercem funções de chefia ou de direcção os membros das associações secretas que entre si usem ou sejam conhecidos pelos seguintes numerais ou títulos:
a) "489"- "Sán Chu" (...) - chefe supremo de associação ou sociedade secreta;
b) "438" - "Fu Sán Chu" (...) - adjunto do Chefe Supremo de associação ou sociedade secreta;
c) "Heong Chu" (...) - Mestre do Incenso, que preside às cerimónias rituais de associação ou sociedade secreta.
d) "Sin Fông" (...) - Oficial de vanguarda;
e) "426" ou "Hong Kuan"(...) - oficial combatente-;
f) "415" ou "Pák Chi Sin"(...) - oficial conselheiro;
g) "432" ou "Ch’ou Hai" (...) - oficial mensageiro ou de ligação;
h) "Cho Kun" (...) - administrador-chefe;
i) "À Kông" (...) - chefe do "Taí Kó";
j) "Tai Kó" (...) - "Tai Lou" (...) - "Teng Ié"(...) - membro de direcção com funções de chefia não especificadas.
1. Quem promover ou fundar uma associação ou sociedade secreta do tipo a que se refere o artigo 1.º, quem dela faça parte ou quem a apoie, nomeadamente fornecendo armas, munições, instrumentos de crime, guarda ou locais para as reuniões, angariando subscrições, exigindo ou concedendo fundos ou qualquer auxílio para que se recrutem novos membros, designadamente, aliciando ou fazendo propaganda, é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos.
2. Quem exercer funções de direcção ou chefia, em qualquer grau, é punido com pena de prisão de 5 a 12 anos.
3. A pena prevista no n.º 1 é agravada de um terço no seu limite mínimo, permanecendo o limite máximo inalterado, se o recrutamento, o aliciamento ou a exigência de fundos se dirigirem a menores de 18 anos.
As penas referidas no artigo anterior podem ser especialmente atenuadas, substituidas por pena não privativa da liberdade ou o facto deixar de ser punível se o agente impedir ou se esforçar seriamente por impedir a continuação das associações ou sociedades secretas ou comunicar à autoridade a sua existência, designadamente, declarando a identidade de outros membros ou apoiantes e revelando os fins, planos ou actividades dessas associações , de modo a esta poder evitar a prática de crimes.
1. Quem for condenado por crime previsto no artigo 3.º pode, atenta a concreta gravidade do facto e a sua projecção na idoneidade cívica do agente, ser incapacitado para eleger membros do orgão legislativo ou para ser eleito como tal e para integrar, por si ou por interposta pessoa, os orgãos sociais de quaisquer pessoas colectivas de direito público ou privado, por um período de 2 a 10 anos.
2. O funcionário que for condenado por crime previsto no artigo 3º. e que não for demitido disciplinarmente das funções públicas que desempenhe, pode, se o facto revelar indignidade no exercício do cargo ou implicar a perda da confiança necessária ao exercício dessas funções, ser proibido do seu exercício por um período de dois a cinco anos.
3. O disposto no número anterior é correspondentemente aplicável às profissões ou actividades cujo exercício depender de título público ou de autorização ou homologação da autoridade pública.
4. Não conta para o prazo da proibição o tempo em que o agente estiver privado da liberdade por decisão judicial.
O homicídio praticado por dois ou mais agentes, actuando concertadamente, com armas proibidas ou outros meios especialmente perigosos, ainda que não se prove a relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta, é susceptível de revelar a especial censurabilidade ou perversidade do agente nos termos e para os efeitos previstos no n.º l do artigo 129.º do Código Penal,
A ofensa à integridade física praticada por dois ou mais agentes, actuando concertadamente, com armas proibidas ou outros meios que possam por em risco a vida ou a saúde do ofendido, ainda que não se prove a relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta, é susceptível de revelar especial censurabilidade ou perversidade do agente, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 140.º do Código Penal.
O sequestro e o rapto praticados por dois ou mais agentes, actuando concertadamente, ainda que não se prove a relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta, são punidos, se outra pena mais grave não lhes couber, com as penas previstas, respectivamente, no n.º 2 do artigo 152.º e no n.º 2 do artigo 154.º do Código Penal.
1. A simples proposta ou oferta de protecção a pessoas ou bens, feita por ou em nome de uma associação secreta, ou invocando esta e mediante de represálias contra as mesmas pressoas ou outras pessoas ou bens, com o propósito de obter vantagens patrímoniais ou outras é punida com pena de prisão de 2 a 10 anos.
2. Não obstará à verificação do crime referido no número anterior o facto de a ameaça de represálias e o pedido de remuneração não serem feitos declaradamente, desde que o sejam por modo a que razoavelmente os faça pressupor no espírito do ofendido.
3. Se tais represálias forem efectuadas o agente é punido, em acumulação material com a pena do n.º 1, com a pena de prisão de 2 a 10 anos, se pena mais grave lhe não couber.
1. Quem invocar a relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta de forma a provocar medo ou inquietação noutra pessoa ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, designadamente, constrangendo-a a uma acção ou a uma omissão ou a suportar uma actividade, é punido com pena de prisão até 3 anos.
2. Se na coacção prevista no n.º 1 se verificar o requisito da alínea a) do n.º 1 do artigo 149.º do Código Penal o agente é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos.
O procedimento penal pelos crimes previstos nesta lei não depende de queixa.
Nos casos dos crimes dos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º não pode haver lugar a suspensão da pena de prisão aplicada, salvo se se verificarem os pressupostos do artigo 4.º.
Não obsta à reincidência nos crimes previstos nos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º o facto de terem decorrido mais de 5 anos entre a prática do primeiro crime e a prática do segundo.
1. A pena de prisão efectiva superior a 3 anos pela prática de crime previsto nos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º é prorrogada por dois períodos sucessivos de 3 anos se:
a) O agente tiver cometido anteriormente crime previsto nos mesmos artigos ou enunciado nas alíneas a) a t) do artigo 1.º a que tenha sido aplicada também prisão efectiva; e
b) Ao expirar da pena ou da primeira prorrogação for fundadamente de esperar, atendendo às circunstâncias do caso, à vida anterior do agente, à sua personalidade e à evolução desta durante a execução da prisão ou aos fortes indícios de continuidade de vinculação a associação ou sociedade secreta, que o condenado, uma vez em liberdade, não conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável sem cometer crimes.
2. São tornados em conta, nos termos do número anterior, os crimes referidos na alínea a) julgados fora de Macau que tiverem conduzido à aplicação de prisão efectiva por mais de 2 anos.
Será interdita a entrada no Território aos não residentes que tiverem sido condenados por crime previsto no artigo 3.º, ainda que por tribunal fora de Macau, ou contra os quais haja fortes indícios de pertencercm a associações criminosas, nomeadamente do tipo das associações ou sociedades secretas, ainda que estas não tenham sede ou filiação em Macau nem aqui desenvolvam qualquer actividade.
As associações ou sociedades do tipo a que se refere o artigo 1.º legalmente constituidas são dissolvidas na decisão judicial que condenar algum ou alguns dos respectivos membros.
1. Não é punível a conduta de funcionário de investigação criminal ou de terceiro actuando sob controlo de uma autoridade de polícia criminal que, para fins de prevenção ou repressão criminal, com ocultação da sua qualidade ou identidade, se infiltre na associação ou sociedade secreta, adquira a qualidade de- membro, e na sequência e a solicitação de quem se dedique às actividades criminosas da associação, aceite, detenha, guarde, transporte ou entregue armas, munições ou instrumentos de crime, dê guarida aos membros, angarie subscrições ou forneça locais para reuniões.
2. A conduta referida no n.º 1 depende de prévia autoriação da autoridade judiciária competente, a proferir no prazo máximo de 5 dias e a conceder por período determinado.
3. Em caso de urgência relativa à aquisição da prova, a conduta referida no n.º 1 é realizada mesmo antes da obtenção da autorização da autoridade judiciária competente mas deve ser por esta validada no primeiro dia útil posterior, sob pena de nulidade.
4. A autoridade de polícia criminal fará o relato da intervenção do funcionário ou do terceiro à autoridade judiciária competente no prazo máximo de 48 horas após o seu termo.
1 . A autoridade judiciária só ordenará a junção ao processo do relato a que se refere o n.º 4 do artigo anterior se a reputar absolutamente indispensável em termos probatórios, garantindo-se o segredo sobre a identidade do funcionário ou do terceiro.
2. A apreciação da indispensabilidade pode ser remetida para o termo do inquérito ou da instrução, ficando entretanto o expediente, mediante prévio registo, na posse da autoridade de polícia criminal.
3. Nos casos em que o juiz determine, por indispensabilidade da prova, a comparência em audiência de julgamento do funcionário ou do terceiro infiltrados, observar-se-á sempre o disposto no n.º 1 do art. 86.º do Código de Processo Penal procedendo-se de modo a garantir a ocultação da sua imagem, da sua voz e da sua identidade.
4. O conhecimento de quaisquer elementos que possam conduzir à revelação da identidade do funcionário ou do terceiro é reservado à autoridade judiciária.
1 . Nos casos dos crimes dos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º o Ministério Público pode determinar que o arguido detido não comunique com pessoa alguma, antes do primeiro interrogatório judicial.
2. Havendo fundadas razões para crer que o ofendido, uma testemunha, o assistente, a parte civil ou perito, possam, por temor de represálias, vir a deslocarse para o exterior, ou de qualquer forma manifestar impossibilidade de ser ouvidos em julgamento, a requerimento do Ministério Público, procede-se à tomada de declarações para memória futura, nos termos dos artigos 253.º e 276.º , com os efeitos da alínea a) do n.º 2 do art. 337.º do Código de Processo Penal.
3. O registo escrito do auto respeitante a recolha de declarações ou depoimentos e ao interrogatório do arguido deve, sempre que possível, ser acompanhado de registo gravado, através de meios magnetofónicos ou audiovisuais, aplicando-se o disposto no n.º 3 do artigo 91.º do Código de Processo Penal.
4. É permitida a leitura em audiência de declarações do ofendido, do assistente, de testemunha, de perito ou da parte civil mesmo que prestadas perante o Ministério Público ou orgão de polícia criminal, quando houver, entre elas e as feitas em audiencia, contradições ou discrepâncias sensíveis.
Se o crime imputado for um dos previstos nos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º, o juiz deve aplicar ao arguido a medidade prisão preventiva,
1. A autoridade judiciária procede à apreensão de bens imóveis ou móveis, direitos, vantagens, títulos, valores, quantias e quaisquer outros objectos depositados em bancos ou outras instituições de crédito, mesmo que em cofres individuais, em nome de arguido ou de terceiro, quando tiver fundadas razões para crer que eles estão relacionados com os crimes dos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º, se destinam à actividade criminosa de associação ou sociedade secreta, que constituem o produto ou lucro dessa actividade ou a recompensa emergente dos crimes dos artigos 6.º, 7.º, 8.º e 9.ºou que resultaram de transformação ou conversão do produto, lucro ou recompensa de tais actividades ilícitas.
2. As entidades públicas ou privadas, instituições bancárias ou outras instituições de crédito, instituições financeiras ou equiparadas, sociedades civis ou comerciais, repartições de registo ou fiscais não podem recusar o cumprimento de pedido de informação ou apresentação de documentos, quer estes se encontrem em suporte manual ou informático, efectuados pela autoridade judiciária, respeitantes a bens, depósitos ou quaisquer valores a que se refere o n.º 1.
3. Nos casos dos crimes dos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º o arguido está obrigado a responder com verdade às perguntas que lhe forem feitas pela autoridade judiciária sobre a sua situação económica e financeira, rendimento mensal proveniente de actividade profissional e bens próprios, sob pena de incorrer na punição prevista no artigo 323.º do Código Penal.
4. Constitui indício da origem ilícita dos bens, depósitos ou valores a que se refere o n.º 1 a sua manifesta desproporcionalidade face aos rendimentos mensais declarados pelo arguido e a impossibilidade de determinar a licitude da sua proveniência.
5. Provada a origem ilícita, são declarados perdidos a favor do Território os bens, depósitos ou valores apreendidos nos termos do n.º 1.
1. O terceiro que invoque a titularidade de coisas, direitos ou valores sujeitos a apreensão, nos termos do n.º l do artigo 21.º, pode deduzir no processo a defesa dos seus direitos, através de requerimento em que alegue boa fé, indicando logo todos os elementos de prova.
2. Entende-se por boa fé a ignorância desculpável de que as coisas, direitos ou valores se relacionavam com actividades ilícitas.
3. O requerimento a que se refere o n.º 1 é autuado por apenso, notificando-se o Ministério Público para, em 10 dias deduzir oposição.
4. A decisão é proferida pelo juiz logo que se encontrem realizadas as diligências que considere necessárias, salvo se quanto à titularidade das coisas direitos ou valores a questão se revelar complexa ou susceptível de causar perturbação ao normal andamento do processo, casos em que o juiz pode remeter o terceiro para os meios cíveis.
Para efeitos do disposto na presente lei considera-se associação ou sociedade secreta, em chinês "Hac Sé Vui" (......) em inglês "Triad Society" a organização clandestina ou legalmente constituída, cuja finalidade ou actividade seja dirigida à prática de crimes, quando os que dela fazem parte se aproveitam da força de intimidação do vínculo associativo, da sujeição e da regra de silêncio que dele derivam, para obter benefícios ou vantagens ilícitas, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação e para praticar, nomeadamente, os crimes seguintes:
a) Homicídio e ofensas corporais;
b) Sequestro e rapto;
c) Ameaça e coacção;
d) Extorsão a pretexto de protecção;
e) Lenocínio;
f) Tráfico de estupefacientes;
g) Agiotagem ou usura criminosa;
h) Furto, roubo e dano
i) Aliciamento e auxílio à migração clandestina;
j) Exploração ilícita de jogo ou de lotarias e apostas mútuas;
l) Administração ilícita de substâncias ou uso de violência em animais destinados a corridas; (ou ilícitos relacionados com corridas de animais)
m) Usura para jogo
n) Importação, exportação, compra, venda, fabrico, uso, porte, e detenção de armas proibidas e substâncias explosivas;
o) Fraude e corrupção eleitoral,
p) Especulação sobre títulos de transporte;
q) Falsificação de moeda, títulos de crédito e cartões de crédito;
r) Corrupção activa;
s) Contrabando.
1. Constituem indícios da qualidade de membro de uma associação ou sociedade secreta os seguintes factos:
a) Invocação pelo próprio da qualidade de membro, filiado ou patrocinador da associação, por atitudes, palavras ou actos adequados a criarem a convicção de tal qualidade;
b) A guarda ou o controlo de livros ou extractos de livros, ou contas da associação, relação de membros, ou trajes especificamente adequados às cerimónias rituais da associação;
c) Participação em cerimónias rituais da associação;
d) Participação em reuniões de associações ou sociedades secretas;
e) Utilização de senhas ou códigos de qualquer natureza, característicos das associações secretas.
2. Constituem indícios de que exercem funções de chefia ou de direcção os membros das associações secretas que entre si usem ou sejam conhecidos pelos seguintes numerais ou títulos:
a) "489" - "Sán Chu" ( .... ) - chefe supremo de associação ou sociedade secreta;
b) "438" - "Fu Sán Chu" ( .... ) - adjunto do Chefe Supremo de associação ou
c) "Heong Chu" ( .... ) - Mestre do Incenso, que preside às cerimónias rituais de associação ou sociedade secreta;
d) "Sin Fóng" (...) - Oficial de vanguarda;
e) "426" ou "Hong Kuan" (...) - oficial combatente;
f) "415" ou "Pák Chi Sin" (...) - oficial conselheiro;
g) "432" ou "Ch’ou Hai" (...) - oficial mensageiro ou de ligação;
h) "Cho Kun" (...) - administrador-chefe;
i) "À Kong" (...) - chefe do "Tai Kó";
j) "Tai Kó" (...) - "Tai Lou" (...) - "Teng Ié" (...) - membro de direcção com funções de chefia não especif icadas.
1. Quem promover ou fundar uma associação ou sociedade secreta do tipo a que se refere o artigo 1.º, quem dela faça parte ou quem a apoie, nomeadamente fornecendo armas, munições, instrumentos de crime, guarda ou locais para as reuniões, angariando subscrições, exigindo ou concedendo fundos ou qualquer auxílio para que se recrutem novos membros, designadamente, aliciando ou fazendo propaganda, é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos.
2. Quem exercer funções de direcção ou chefia em qualquer grau, é punido com pena de prisão de 5 a 12 anos.
3. A pena prevista no n.º 1 é agravada de um terço no seu limite mínimo, permanecendo o limite máximo inalterado, se o recrutamento, o aliciamento ou a exigência de fundos se dirigirem a menores de 18 anos.
As penas referidas no artigo anterior podem ser especialmente atenuadas, substituídas por pena não privativa da liberdade ou o facto deixar de ser punível se o agente impedir ou se esforçar seriamente por impedir a continuação das associações ou sociedades secretas ou comunicar à autoridade a sua existência, designadamente, declarando a identidade de outros membros ou apoiantes e revelando os fins, planos ou actividades dessas associações, de modo a esta poder evitar a prática de crimes.
1. Quem for condenado por crime previsto no artigo 3.º pode, atenta a concreta gravidade do facto e a sua projecção na idoneidade cívica do agente, ser incapacitado para eleger membros do órgão legislativo ou para ser eleito como tal, por um período de 2 a 10 anos.
2. O funcionário que for condenado por crime previsto no artigo 3.º e que não for demitido disciplinarmente das funções públicas que desempenhe, pode, se o facto revelar indignidade no exercício do cargo ou implicara perda da confiança necessária ao exercício dessas funções, ser proibido do seu exercício por um período de 2 a 5 anos.
3. O disposto no número anterior é correspondentemente aplicável às profissões ou actividades cujo exercício depender de título público ou de autorização ou homologação da autoridade pública.
4. Não conta para o prazo da proibição o tempo em que o agente estiver privado da liberdade por decisão judicial.
O homicídio praticado por dois ou mais agentes, actuando concertadamente, com armas proibidas ou outros meios especialmente perigosos, ainda que não se prove a relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta, é susceptível de revelar a especial censurabilidade ou perversidade do agente nos termos e para os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 129.º do Código Penal.
1. A ofensa à integridade física praticada por dois ou mais agentes, actuando concertadamente, com armas proibidas ou outros meios que possam por em risco a vida ou a saúde do ofendido, ainda que não se prove a relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta, é susceptível de revelar especial censurabilidade ou perversidade do agente, nos termos e para os efeitos previstos no art. 140.º do Código Penal.
2. O procedimento penal não depende de queixa.
O sequestros e o rapto praticados por dois ou mais agentes, actuando concertadamente, ainda que não se prove a relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta, são punidos, se outra pena mais grave não lhes couber, com as penas previstas, respectiva mente, no n.º 2 do artigo 152.º e no n.º 2 do artigo 154.º do Código Penal.
1. A simples proposta ou oferta de protecção a pessoas ou bens, feita por ou em nome de uma associação ou sociedade secreta, ou invocando esta e mediante ameaças de represálias contra as mesmas pessoas ou outras pessoas ou bens, com o propósito de obter vantagens patrimoniais ou outras, é punida com a pena de 2 a 10 anos.
2. Não obstará à verificação do crime referido no número anterior o facto de a ameaça de represálias e o pedido de remuneração não serem feitos declaradamente, desde que o sejam por modo a que razoavelmente os faça pressupor no espírito do ofendido.
3. Se tais represálias forem efectuadas o agente é punido, em acumulação material com a pena do n.º 1, com a pena de prisão de 2 a 10 anos, se pena mais grave lhe não couber.
1. Quem invocar a relação de pertença a uma associação ou sociedade secreta de forma a provocar medo ou inquietação noutra pessoa ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, designadamente, constrangendo-a a uma acção ou a uma omissão ou a suportar uma actividade, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.
2. Se na coacção prevista no n.º 1 se verificar o requisito da alínea a) do n.º 1 do artigo 149.º do Código Penal o agente é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos.
Não obsta à reincidência nos crimes previstos nos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º, o facto de terem decorrido mais de cinco anos entre a prática do primeiro crime e a prática do segundo.
1. A pena de prisão efectiva pela prática de crime previsto nos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º, é prorrogada por dois períodos sucessivos de seis anos se:
a) O agente tiver cometido anteriormente crime previsto nos mesmos artigos ou enunciado nas alíneas a) a q) do artigo 1.º a que tenha sido aplicada também prisão efectiva; e
b) Ao expirar da pena ou da primeira prorrogação for fundadamente de esperar, atendendo às circunstâncias do caso, à vida anterior do agente, à sua personalidade e à evolução desta durante a execução da prisão e aos indícios de continuidade de vinculação a associação ou sociedade secreta, que o condenado, uma vez em liberdade, não conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável sem cometer crimes.
2. São tomados em conta, nos termos do número anterior, os crimes referidos na alínea a) julgados fora de Macau que tiverem conduzido à aplicação de prisão efectiva por mais de dois anos.
Será interdita a entrada no Território aos não residentes que tiverem sido condenados por crime previsto no artigo 3.º, ainda que por tribunal fora de Macau, ou contra os quais haja fortes indícios de pertencerem a associações criminosas, nomeadamente do tipo das associações ou sociedades secretas, ainda que estas não tenham sede ou filiação em Macau nem aqui desenvolvam qualquer actividade.
sociedades legalmente constituídas)
As associações ou sociedades do tipo a que se refere o artigo 1.º legalmente constituídas são dissolvidas na decisão judicial que condenar os respectivos membros.
1. Não é punível a conduta de funcionário de investigação criminal ou de terceiro actuando sob controlo de uma autoridade de polícia criminal que, para fins de prevenção ou repressão criminal, com ocultação da sua qualidade ou identidade, se infiltre na associação ou sociedade secreta, e para tal efeito receba armas munições, instrumentos de crime ou forneça locais para reuniões.
2. A conduta referida no n.º 1 depende de prévia autorização da autoridade judiciária competente, a proferir no prazo máximo de 5 dias e a conceder por período determinado.
3. Em caso de urgência relativa à aquisição da prova, a conduta referida no n.º 1 é realizada mesmo antes da obtenção da autorização da autoridade judiciária competente mas deve ser por esta validada no primeiro dia útil posterior, sob pena de nulidade.
4. A autoridade de polícia criminal fará o relato da intervenção do funcionário ou do terceiro à autoridade judiciária competente no prazo máximo de 48 horas após o seu termo.
1. A autoridade judiciária só ordenará a junção ao processo do relato a que se refere o n.º 4 do artigo anterior se a reputar absolutamente indispensável em termos probatórios.
2. A apreciação da indispensabilidade pode ser remetida para o termo do inquérito ou da instrução, ficando entretanto o expediente, mediante prévio registo, na posse da autoridade de polícia criminal.
3. Nos casos em que o juiz determine, por indispensabilidade da prova, a comparência em audiência de julgamento do funcionário ou do terceiro infiltrados, observar-se-á sempre o disposto no n.º 1 do art. 86.º do Código de Processo Penal
1. Nos casos dos crimes dos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º Ministério Público pode determinar que o arguido detido não comunique com pessoa alguma, antes do primeiro interrogatório judicial.
2. Havendo fundadas razões para crer que o ofendido, uma testemunha, o assistente, a parte civil ou perito, possam, por temor de represálias, vir a deslocar-se para o exterior, ou de qualquer forma manifestar impossibilidade de ser ouvidos em julgamento, a requerimento do Ministério Público, procede-se à tomada de declarações para memória futura, nos termos dos artigos 253º e 276º, com os efeitos da alínea a) do n.º 2 do art.º 337.º do Código de Processo Penal.
3. O registo escrito do auto respeitante a recolha de declarações ou depoimentos e ao interrogatório do arguido deve, sempre que possível, ser acompanhado de registo gravado, através de meios magnetofónicos ou audiovisuais, aplicando-se o disposto no n.º 3 do artigo 91.º do Código de Processo Penal.
4. É permitida a leitura em audiência de declarações do ofendido, do assistente, de testemunha, de perito ou da parte civil mesmo que prestadas perante o Ministério Público ou órgão de polícia criminal, quando houver, entre elas e as feitas em audiência, contradições ou discrepâncias sensíveis.
1. A autoridade judiciária procede à apreensão de bens imóveis ou móveis, direitos, vantagens, títulos, valores, quantias e quaisquer outros objectos depositados em bancos ou outras instituições de crédito, mesmo que em cofres individuais, em nome de arguido ou de terceiro, quando tiver fundadas razões para crer que eles estão relacionados com os crimes cios artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º, se destinam à actividade criminosa de associação ou sociedade secreta, que constituem o produto ou lucro dessa actividade ou a recompensa emergente dos crimes dos artigos 6.º, 7.º, 8.º e 9.º ou que resultaram de transformação ou conversão do produto, lucro ou recompensa de tais actividades ilícitas.
2. As entidades públicas ou privadas, instituições bancárias ou outras instituições de crédito, instituições financeiras ou equiparadas, sociedades civis ou comerciais, repartições de registo ou fiscais não podem recusar o cumprimento de pedido de informação ou apresentação de documentos, quer estes se encontrem em suporte manual ou informático, efectuados pela autoridade judiciária, respeitantes a bens, depósitos ou quaisquer valores a que se refere o n.º 1.
3. Nos casos dos crimes dos artigos 3.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º, o arguido está obrigado a responder com verdade às perguntas que lhe forem feitas pela autoridade judiciária sobre a sua situação económica e financeira, rendimento mensal proveniente de actividade profissional e bens próprios.
4. Constituí indício da origem ilícita dos bens, depósitos ou valores a que se refere o n.º 1 a sua manifesta desproporcionalidade face aos rendimentos mensais declarados pelo arguido e a impossibilidade de determinar a sua proveniência.
5. Provada a origem ilícita, são declarados perdidos a favor do Território os bens, depósitos ou valores apreendidos nos termos do n.º 1.
1. O terceiro que invoque a titularidade de coisas, direitos ou valores sujeitos a apreensão, nos termos do n.º 1 do artigo 18.º, pode deduzir no processo a defesa dos seus direitos, através de requerimento em que alegue boa fé, indicando logo todos os elementos de prova.
2. Entende-se por boa fé a ignorância desculpável de que as coisas, direitos ou valores se relacionavam com actividades ilícitas.
3. O requerimento a que se refere o n.º 1 é autuado por apenso, notificandose o Ministério Público para, em 10 dias deduzir oposição.
4. A decisão é proferida pelo juiz logo que se encontrem realizadas as diligências que considere necessárias, salvo se quanto à titularidade das coisas direitos ou valores a questão se revelar complexa ou susceptível de causar perturbação ao normal andamento do processo, casos em que o juiz pode remeter o terceiro para os meios cíveis.
1- Razoabilidade e eficácia da criminalização autónoma da conduta de pertença a sociedade secreta, conhecida em chinês por "Hac Sé Vui" e em inglês por "Triad Society", face à descrição do crime de associação criminosa que consta do art. 288.º do Código Penal.
O combate ao crime organizado tem passado, em alguns países, no plano do Direito Penal, pela criminalização autónoma da pertença (ou assunção de posição de chefe ou dirigente, promotor ou fundador, apoiante ou, por qualquer forma, cumplice) a associações criminosas que actuam de forma preferencial na sua área geográfica e que representam, normalmente, um particular factor de perigosidade social e uma particular ameaça às estruturas do Estado.
Para o efeito, o legislador recorre, na definição de tal crime, a elementos que retira das características sociológicas do fenômeno, do que resulta um conceito interpenetrado por aspectos organizatórios típicos, aspectos emergentes do meio social e aspectos antropológicos que coloca a tónica nos meios ilícitos utilizados, mais que nos fins atingidos, a que, por vezes, acresce o elencar das condutas criminosas habituais perpetradas por essas associações. É, por exemplo, o caso da Itália1 ou o caso de Hong-Kong2.
Esta estratégia que se salda, de quando em quando, em dificuldades no domínio da interpretação e aplicação da norma que descreve o crime, devido ao défice de rigor técnico que patenteia, tem vindo, não obstante, a ser considerada de razoável importância simbólica, dada a mensagem (sobretudo, no plano da emoção) que transmite à população que, julgando ver reflectida na norma a realidade, reconhece a preocupação do legislador de aproximação a essa mesma realidade, Por aqui se reforçando a finalidade preventiva perseguida pela pena que se comina para o crime.
O recrudescimento da criminalidade violenta, em Macau, nestes últimos tempos, a qual poderá estar relacionada com as organizações criminosas que actuam no Território, ainda que não signifique um acréscimo de actividade dessas organizações, tem gerado sentimentos comunitários de instabilidade e insegurança que, a não serem tomadas medidas, poderão conduzir a um nocivo desequilíbrio das expectativas de confiança da população na eficácia das instituições com competência em matéria de segurança e aplicação das leis, mormente dos orgãos de administração da justiça e, até, do próprio sistema jurídico.
Neste contexto, a não contemplação no diploma legal que virá a alterar ou a revogar a Lei n.º 1/78/M de uma norma correspondente à norma constante do art. 2.º, desta Lei que, na sequência do estipulado no art. 1.º, identifica as organizações clandestinas ou seitas que operam em Macau com organizações criminosas, é, particularmente, desaconselhável. Tal opção legislativa poderia significar, face a uma opinião pública pouco sensível a razões que se prendem com a dificuldade exegética do Tribunal e pouco conhecedora das motivações de política criminal que a justificariam, uma incompreensível "descriminalização" da conduta de "pertença às seitas" com os prejuízos que daí adviriam no plano dos sentimentos comunitários de confiança e adesão à Lei e, naturalmente, no âmbito da finalidade de dissuasão da prática do crime de associação criminosa, em particular, e dos crimes, em geral.
Sugere-se, por agora, tão só como reflecção ou ponto de partida para a discussão, a seguinte redacção:
"Para efeitos do disposto na presente lei considera-se associação ou sociedade secreta, em chinês "Hac Sé Vui"3, em inglês "Triad Society", a organização clandestina ou legalmente constituida, cuja finalidade ou actividade seja dirigida à prática de crimes, quando os que dela fazem parte se aproveitam da força de intimidação do vinculo associativo, da sujeição e da regra de silêncio que dele derivam para obter benefícios ou vantagens ilícitas, por si ou por interposta pessoa com o seu consentimento ou ratificação e para praticar, nomeadamente, os crimes seguintes:
a) Homicídio e ofensas corporais;
b) Sequestro e rapto;
c) Extorsão a pretexto de protecção;
d) Lenocínio;
e) Tráfico de estupefacientes;
f) Agiotagem ou usura criminosa;
g) Furto, roubo e dano;
h) Aliciamento e auxílio à migração clandestina;
i) Exploração ilícita de jogo ou de lotarias e apostas mútuas;
j) Administração ilícita de substâncias ou uso de violência em animais destinados a corridas. (ou ilícitos relacionados com corridas de animais)
1) Usura para jogo;
m) Importação, compra, venda, fabrico, uso, porte e detenção de armas proibidas e substâncias explosivas;
n) Fraude e corrupção eleitoral;
o) Especulação sobre títulos de transpor-te;
p) Falsificação de cartões de crédito;
q) Corrupção Activa;"
2- Razoabilidade e eficácia da alteração das reacções criminais que correspondem ao crime de associação criminosa do tipo sociedade secreta, i. e., da moldura penal e das eventuais medidas de segurança.
A- Pena principal.
Nesta matéria não pode deixar de se levar em conta o entendimento da mais moderna doutrina penal e os estudos que vêm sendo efectuados na área de política criminal que apontam, convictamente, a diminuta eficácia dissuasora da prática do crime que representa o agravamento da pena, particularmente, se desacompanhada da confiança no funcionamento do aparelho de administração da justiça e, portanto, da convicção da eficiência quanto à investigação do crime e da rápida descoberta do seu autor e, sobretudo, da certeza das subsequentes aplicação e execução da pena respectiva.
Pontue-se que as molduras penais correspondentes ao crime de associação criminosa, no Código Penal de Macau (art. 288.º ) e na Lei n.º 1/78/M4, nas diversas formas de realização típica aproximam-se, numa perspectiva comparativa das leis de Taiwan5, de Hong-Kong6, de Itália7, apresentando mesmo, em determinados casos, limites mínimos e máximos mais elevados.
Sem prejuízo de se avaliar a adequação, numa análise de política criminal, do agravamento da pena face a condutas como o aliciamento, o recrutamento ou recolha de fundos, quando se dirijam a menores de dezoito anos, atento os elevados graus de ilicitude e de censura que apresenta tal conduta e o concomitante repúdio social que ela desencadeia ou nas situações em que o crime épraticado por funcionário, tomando em conta o especial dever que recai sobre o agente e o perigo contido na conduta para bens jurídicos como seja a "legalidade da administração".
B- Penas acessórias
Questão a analisar é a estatuição de uma pena acessória do tipo das sanções consagradas nas leis de Taiwan e Itália as quais, tendo como ratio preponderante o prevenir ou minimizar o perigo de infiltração no aparelho de Estado de membros de organizações criminosas, fazem acrescer àpena principal a pena de incapacidade para ser eleito8 ou nomeado9 para orgão público. Refira-se a propósito que a pena acessória de incapacidade para eleger membros do orgão legislativo ou para ser eleito pode, nos ter-mos do art. 238.º do Código Penal de Macau ser aplicada aos agentes dos crimes contra a paz e a humanidade, "atenta a concreta gravidade do facto e a sua projecção na idoneidade cívica do agente".
Finalmente, deverá decidir-se da consagração de uma pena acessória de proibição de exercício de funções públicas quando o crime for praticado por funcionário (vs art. s 60.º e 61.º do Código Penal), a qual, será, obviamente, aplicada sem prejuízo dos regimes especiais previstos na lei, bem como da sanção disciplinar de que venha a ser objecto o mesmo agente. Solução aproximada parece ser a acolhida na lei italiana10.
C- Medidas de segurança.
Quanto à eventualidade de se cominarem medidas de segurança, continua a justificar-se, naturalmente, sobretudo no que toca à medida de segurança expulsão, a qual, diga-se, deverá, forçosamente, ser aplicada no final de um processo jurisdicionalizado, por imposição do princípio da legalidade com a densificação de sentido que ele tem no sistema jurídico de Macau, a distinção entre residentes e não residentes.
Sobre a sanção que o art. 8.º, n.º 2 da Lei n.º 1/78/M faz corresponder à conduta do agente não residente que, tendo sido objecto de tal medida de expulsão proferida na sentença que o condenou pelo crime de associação criminosa, volta ao Território, ela deverá ser, por razões de coerência intrínseca do sistema, equivalente à sanção constante do art. 317.º do Código Penal de Macau (pena de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias) que descreve o crime de violação de proibições impostas por sentença.
No que toca ao reforço das medidas de combate ao crime organizado, poderá justificar-se uma norma com sentido aproximado à norma do n.º 1 do art. 8.º da Lei n.º 1/78/M que encontre correspondência na disposição constante do art. 10.º do D.L. n.º 59.º/93 de 3 de Março vigente na República relativo à "Expulsão de Estrangeiro". Assim, sugere-se a sequinte redacção:
"Será interdita a entrada neste Território aos não residentes (inscritos nas listas elaboradas pela Policia de Segurança Pública) em virtude de terem sido condenados pelo crime de associação criminosa ou de haver fortes indícios defazerem parte de associações criminosas do tipo das sociedades secretas a que se refere a presente Lei, ainda que estas não tenham sede ou filiação em Macau nem aqui desenvolvam qualquer actividade."
3- Razoabilidade e eficácia do agravamento das penas correspondentes aos ilícitos penais habitualmente praticados pelas sociedades secretas e criminalização de outras condutas que, de alguma forma se relacionem com o crime organizado.
A- Agravamento das penas.
No que respeita à decisão a tomar em matéria de agravamento das molduras penais previstas no Código Penal ou em legislação avulsa, mormente, para os crimes habitualmente praticados por organizações criminosas que actuam em Macau, que prossiga, quer um reforço no plano da dissuasão, quer a concretização de um processo que permita tornear as dificuldades conhecidas em sede de prova do crime de asssociação criminosa, ela deverá atender aos problemas emergentes dos eventuais concurso de normas e concurso de infracções.
B- Criminalização de novas condutas.
Sobre a criminalização da mera declaração de pertença a uma associação criminosa do tipo das associações secretas que actuam no Território, seguindo o exemplo de Hong-Kong11, ela levanta as maiores dificuldades no plano da sua admissibilidade face à função do Direito Penal que vem definida no art. 40.º do Código Penal- "protecção de bens jurídicos". A verdade é que essa declaração, por si só, não configura uma lesão ou perigo de lesão para interesses comunitários relevantes e, por essa razão, só ganha dignidade penal quando acompanhada de elementos fácticos que constituam uma ofensa para os bens que incumbe ao Direito Penal tutelar, estando neste caso, nomeadamente, bens individuais como a vida, a integridade física, a saúde, a liberdade e a auto-determinação, o património (ou bens supra-individuais como a ordem e a tranquilidade públicas, o sistema político, económico e social, o ambiente, de entre outros). Em conformidade, a conduta a criminalizar, e, ainda, assim, com as maiores reservas, poderá, quando muito, ter a seguinte conformação típica:
" Quem declarar que faz parte de uma associação secreta, de forma a provocar medo ou inquietação noutra pessoa ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, designadamente, constrangendo-a a uma acção ou omissão ou a suportar uma actividade, é punido com pena de..." 12
4 - Razoabilidade e eficácia da enunciação das associações criminosas.
A nomeação das sociedades secretas, tal como consta do art. 3.º da Lei n.º 1/78/M, parece não se revestir, hoje, de qualquer valor, no plano da eficácia no combate ao fenómeno da criminalidade organizada em Macau. Diga-se, aliás, que a aludida nomeação peca por defeito dado que, actualmente, operam no Território várias outras sociedades secretas, das quais só se conhecem alguns dos nomes, a par de outras organizações criminosas.
5 - Problema da estipulação de consequências jurídicas aplicáveis à associação criminosa.
Parece continuar a justificar-se a sanção de extinção da associação nos casos de associações ou sociedades legalmente constituidas que venham a ser declaradas, em sentença proferida pelo tribunal penal e nos termos da lei, sociedades secretas.
6 - Problema da consagração de um regime mais gravoso para a reincidência.
Pode justificar-se, politico- criminalmente, um regime mais gravoso para a reincidência nos crimes de participação em associações ou sociedades secretas, no sentido da norma do art. 9.º da Lei n.º 1/78/M que consagra um alargamento do chamado prazo de prescrição da reincidência13.
Se acaso for essa a opção legislativa forçoso é atender às regras que em Macau regulam o instituto de reabilitação, sobretudo aos prazos que a lei estabelece, cujo decurso desencadeia, automaticamente, o cancelamento da decisão inscrita no registo criminal14.
7- Normas constantes dos art.s 5.º e 10.º da Lei n.º 1/78/M.
As mencionadas normas são tautológicas e, por isso desnecessárias.
Na verdade, a norma do art. 5.º que estabelece um critério de validade espacial da lei não se justifica face ao princípio da territorialidade que consta do art. 4.º do Código Penal.
Do mesmo passo se dispensa a norma do art. 10.º. A solução que aí vem preconizada para resolver problemas no domínio da interpretação é superada através de uma descrição típica do crime de participação em sociedade secreta correspondente à do crime de associação criminosa do art. 288.º do Código Penal, bem como da definição de sociedade secreta nos termos sugeridos no ponto 1.
8- Razoabilidade e eficácia da inclusão de uma norma onde se preveja a figura do arrependido.
Refira-se que a Lei n.º 1/78/M, no art. 11.º , enquanto consagra o instituto da isenção de pena e medida de segurança para "todo aquele que espontaneamente, declarar a identidade de outros membros ou participantes e revelar os fins, planos ou actividades da associação, desde que tais revelações se mostrem profícuas à acção da justiça" atribui já relevância à conduta de "colaboração com a justiça" que se encontra na base da figura do arrependido, o "collaboratore di giustizia" na lei penal italiana ou a "crown-witness" do direito anglo-americano (e que se encontra contemplada, também, nos sistemas jurídicos francês e de Hong-Kong). E, pode dizer-se que a fundamentação de política-criminal que justifica o acolhimento daquela situação de isenção de sanção criminal no direito de Macau corresponde à que preside aos mencionados institutos do "collaboratore di giustizia" e da "crown-witness". Trata-se, afinal, de valorar especialmente a colaboração que os agentes dos crimes de associação criminosa prestam às autoridades encarregadas da investigação de tais crimes, de grande importância para o êxito da investigação ( e em certos casos indispensável, dado o muro de silêncio que rodeia a actividade das organizações criminosas) e, em certa medida (embora nem sempre e de modo secundário), estimular a desistência da prática do crime.
Note-se que situações semelhantes de valoração especial da atitude de colaboração com a justiça encontram-se no art.18.º, n.º 2 do D.L. n.º 5/91/M (que estabelece um regime de atenuação ou isençao de pena nos casos de prática de um crime de tráfico de droga para o agente que abandone voluntariamente a sua actividade, afaste ou faça diminuir consideravelmente o perigo por ela causado, auxilie concretamente na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura dos outros responsáveis, sobretudo no caso de crime organizado) e no art. 4.º da Lei n.º 8/96/M (que prevê a suspensão da pena correspondente aos crimes de exploração ilícita de prática ilícita de jogo se o autor fizer declarações que contribuam para o descobrimento do crime ou para a identificação dos seus principais agentes).
Não se questionando, ela é hoje reputada como indiscutível, a importância da consagração do "arrependido", que pode constituir um instrumento fundamental no plano da investigação, deve reconhecer-se que ela suscita três ordens de problemas.
Em primeiro lugar a definição dos seus pressupostos que deverá colocar a tónica na "natureza" do arrependimento, e não nos efeitos que dele decorrem, ou seja, a relevância da atitude do agente, da qual dependerá o regime particularmente benévolo que a lei consagra, deverá entender-se, num sentido afeiçoado ao da norma do n.º 4 do art. 288.º do Código Penal, mais uma obrigação de meios do que uma obrigação de resultados. Dito por outras palavras, à concessão dos benefícios legais deverá importar, sobretudo, a atitude do agente, o esforço sério que a actividade de colaboração com as autoridades encarregadas da investigação revela, no sentido de impedir a continuação da actividade criminosa,. Por exemplo, o ter comunicado às aludidas autoridades toda a informação que conhece, mesmo que essa informação venha a revelar-se desnecessária àactividade investigatória ou o orgão competente (a polícia) tenha falhado, censuravelmente, no obstar à continuidade da actividade criminosa15.
Em segundo lugar, necessário se torna determinar o âmbito do regime especial que deverá corresponder ao agente que colabora com a justiça, tendo em conta que em alguns sistemas jurídicos como, por exemplo o de Itália, tal regime integra, para além de regras particularmente benévolas no domínio da aplicação da pena, que passam pela consagração de um regime excepcional de substituição da pena de prisão por penas não privativas de liberdade, um sistema especial no que toca à concessão da liberdade condicional16.
Em terceiro e último lugar, é indispensável reconhecer a verdade que as experiências levadas a cabo noutros sistemas jurídicos têm vindo a demonstrar. Que não pode, verdadeiramente, concretizar-se o instituto do arrependido, tenha ele a configuração que tiver, se a sua inclusão na lei penal, pela definição dos pressupostos e regime que lhe corresponde, não fôr acompanhada de um sistema de protecção destinado a garantir, até ao limite do possível, a inviolabilidade pessoal dos agentes que venham a integrar a categoria de "arrependido".
Recorrendo aos exemplos de sistemas jurídico-penais diferentes como o de Itália17 e o de Hong-Kong18 verifica-se a tendência para materializar o sistema de protecção a conferir àquele que colabora com a justiça no caso da criminalidade organizada em diplomas legais autónomos e de natureza diversa dos diplomas penais que respeitam a esse fenómeno. Tendência que se compreende se se pensar na complexa teia de incidências que os sistemas de protecção desencadeiam em distintos planos da administração pública, requerendo a intervenção de vários departamentos, a criação de estruturas de apoio e de uma dotação orçamental própria19.
Tais sistemas de protecção compreendem, designadamente,
Em Itália:
a) A transferência da pessoa objecto de protecção (que, deve, para o efeito preeencher determinados requisitos legais) para comuna diversa da da sua residência, ou, caso se encontre a cumprir medida de detenção (fermo), medida processual de prisão preventiva ou pena de prisão, do cárcere ou estabelecimento prisional, para outro lugar. Esta transferência, que tem por finalidade garantir a inviolabilidade pessoal dessa pessoa, é efectuada com a intervenção da polícia, com a autorização do Procurador da República e, excepto em casos urgentes, mediante decisão dos Ministros da justiça e da Administração Interna (antes, também, do Procurador Anti-MAFIA)20
b) Nos casos em que especialmente se justifique, mediante proposta do interessado, pode ser obtida autorização junto dos Ministros da justiça e da Administração Interna para efectuar a mudança de identidade da pessoa objecto de protecção21, a qual pode tornar-se extensiva aos seus filhos menores, neste caso, com o consentimento do outro progenitor ou autorização do Tribunal de Menores22. Tal mudança de identidade resulta coberta pelo segredo de justiça e não pode ser revelada mesmo perante outros departamentos da Administração.
9- No âmbito do reforço da eficácia da investigação e aplicação da lei no que respeita ao crime organizado, admissibilidade e razoabilidade de um sistema de presunções legais, do instituto do "agente infiltrado", de regras especiais em matéria de recolha e valoração da prova e de aplicação de medidas cautelares processuais.
A- Sistema de presunções legais.
O art. 12.º da Lei n.º 1/78/M consagra um conjunto de presunções legais quanto à qualidade de membro ou de chefe ou de dirigente de uma sociedade secreta23.
Tais presunções, que prosseguem o objectivo de superação das dificuldades no que toca àprova do crime, resultam, por um lado, de diminuto ou, mesmo, nulo interesse prático, dado não serem aplicadas pelo Tribunal e, por outro lado, dificilmente se compatibilizam com o princípio da presunção de inocência que em Macau dispõe de tutela constitucional24.
Na verdade, sendo seguro que essas presunções nunca podem significar a restrição do direito de defesa do arguido, privando-o da possibilidade material de as impugnar e afastar, o que significaria violar o princípio do contraditório, um outro princípio fundamental do direito processual penal de Macau25, e que tais presunções não se referem à culpa e sim ao facto e, ainda, que a valoração da dúvida joga a favor do arguido como impõe o princípio in dubio pro reo, sempre ficam reservas relativamente à admissibilidade de uma norma que acolha um sistema de presunções legais, face ao perigo de ser interpretada no sentido de se vir a instaurar um regime de inversão do ónus da prova em processo penal, absolutamente ofensivo do princípio da presunção de inocência.
B- Instituto do "agente infiltrado".
A figura do agente infiltrado não é, completamente, desconhecida no sistema jurídico-penal de Macau, tendo em conta a norma do art. 36.º do D.L. n.º 5/91/M de 28 de Janeiro relativa ao tráfico e consumo de estupefacientes. Aí se estipula que "não é punível a conduta do funcionário de investigação criminal que, para fins de inquérito, e sem revelação da sua qualidade e identidade, aceitar directamente ou por intermédio de um terceiro a entrega de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas" (n.º 1) e que "o relato de tais factos será junto ao processo no prazo máximo de 24 horas" (n.º 2).
Esta norma teve como fonte a norma correspondente do D. L. n.º 430/83 de 13 de Dezembro, vigente em Portugal e, entretanto revogado pelo D.L. n.º 15/93 de 22 de Janeiro, alterado pela Lei n.º 45/96 de 3 de Setembro.
Refira-se que, hoje, no domínio dos crimes de tráfico de droga, procedeu-se, em Portugal, a um alargamento da dimensão e ao aperfeiçoamento do instituto.
A aludida Lei n.º 45/96, conferiu nova redacção à norma que, no D.L. n.º 15//93, se lhe referia (constante do art. 59.º), dela resultando, agora, a não punibilidade "da conduta de funcionário de investigação criminal ou de terceiro actuando sob controlo da Policia Judiciária que, para fins de prevenção ou repressão criminal, com a ocultação da sua qualidade e identidade, aceitar, detiver, guardar, transportar ou, em sequência e a solicitação de quem se dedique a essas ectividades, entregar estupefacientes, substâncias psicotrópicas, precursores ou outros produtos químicos susceptíveis de desvio para o fabrico ilícito de droga ou precursor".
Pontue-se que a descrita actuação depende de prévia autorização da autoridade judiciária competente ou, em casos de urgência, de validação pela mesma, no primeiro dia útil posterior, devendo a Polícia judiciária fazer a essa autoridade judiciária o relato da actuação no prazo máximo de quarenta e oito horas.
Acresce que se acrescentou um artigo, o do art. 59 A, que contém normas de protecção do funcionário e do terceiro infiltrados. Assim, o relato da actuação só será junto ao processo se a autoridade judiciária o reputar indispensável, podendo tal apreciação de indispensabilidade ser remetida para o termo do inquérito ou da instrução. E, o funcionário ou terceiro infiltrados só comparecerão em julgamento no caso de o juiz o determinar por indispensabilidade da prova, restringindo-se sempre, neste caso, a assistência do público ao acto26.
A figura do "agente infiltrado" é acolhida, de entre outras, na lei americana27 e na lei italiana. No caso de Itália, na sequência da criação da D.I.A. (Direcção de Investigação Anti-Mafia) e o do Conselho Geral de Luta contra a Criminalidade Organizada28, consideram-se agentes infiltrados os oficiais de polícia judiciária da D.I.A. ou dos serviços centrais e inter-provinciais. A operação a efectuar pelo agente depende de decisão de qualquer uma das seguintes entidades: Comandante de Polícia Director Geral da Segurança Pública, Comandante Geral do Corpo de Carabineiros ou da Guarda (nas situações que envolvam crimes relacionados com armas proibidas) e o Alto comissário na Luta contra a delinquência mafiosa e, dessa operação, é dada imediata notícia à autoridade de polícia judiciária competente29.
Numa análise de política criminal que atenda às características geográficas e culturais do Território de Macau, a consagração da figura do agente infiltrado no diploma legal referente às sociedades secretas que, do ponto de vista da sua admissibilidade, não parece levantar quaisquer problemas, reveste-se de particular complexidade quanto à sua realização prática. Com efeito, a exiguidade do Território torna muito difícil, se não impossível, a criação de condições que garantam a inviolabilidade pessoal do agente infiltrado que dependem, inevitavelmente, do sigilo que tem que rodear a sua actuação, sobretudo do desconhecimento do vínculo que o liga a um organismo policial. Acresce que o risco para a integridade física e para a vida do agente (que, em certos casos, se torna extensivo aos familiares e pessoas mais próximas), cujo reconhecimento conduz, invariavelmente, a uma compensação pecuniária sob a forma de reforço de salário30 caso se trate de um agente policial, dificilmente poderá ser compensado.
Diga-se que o eventual reforço salarial não conseguirá, de todo o modo, aproximar-se dos montantes pecuniários elevadíssimos que os membros da organização criminosa que o agente investiga auferem, o que pode constituir um estímulo, às vezes irresistível, à inversão de papéis, ou seja, à aquisição por parte do "infiltrado" da qualidade de membro da associação criminosa, passando a desempenhar no corpo de polícia a que pertence um papel de "agente" da dita associação criminosa.
Pontue-se que não deverá confundir-se a figura do agente infiltrado com a figura do "informador" que vem referenciada no art. 37º do D.L. nº 5/91/M de 28 de Janeiro ( Lei da Droga). Aí se dispõe que "nenhum funcionário de investigação criminal declarante ou testemunha éorigado a referir ao tribunal a identificação ou qualquer elemento que leve à identificação de um informador ou pessoa que tenha colaborado com a polícia na descoberta da infracção prevista no presente diploma ".
Tal figura não aparece, enquanto tal, no diploma legal que, em Portugal, respeita aos ilícitos relacionados com a droga, parecendo que, dado o alargamento da dimensão do "agente infiltrado", a lei não impõe que se trate de funcionário, podendo ser qualquer pessoa e, tendo em conta o regime de protecção constante do art. 59 A, a figura do "informador" não mereceu cobertura legal.
C- Regras especiais em matéria de recolha e valoração da prova.
O novo Código de Processo Penal de Macau contem regras precisas em matéria de recolha e valoração da prova.
Quanto aos meios coactivos de obtenção de prova, ou seja, os processos que implicam restrições aos direitos fundamentais das cidadãos, são admissíveis os exames (art. s 156.º a 158.º) a busca e a revista (art. s 159.º a 162.º), a apreensão de objectos (art. 163.º), nomeadamente de correspondência ( art. 164.º) e de objectos depositados em bancos ou instituições de crédito (art. 166.º), a intercepção ou gravação de conversações ou comunicações telefónicas (art. s 172.º a 174.º) ou efectuadas através de outro meio técnico (art. 175.º) e, desde que não sejam ilícitas, as reproduções mecânicas (art. 153.º).
Regra geral, tais meios de obtenção de prova são autorizadas ou ordenados pelo juiz (normalmente o juiz de instrução), ou pelo Ministério Público os quais, devem, dependendo das situações, sempre que possível, presidir à diligência e, são concretizados pelos orgãos de polícia criminal31. Todavia, em determinados casos, devido a razões de urgência, que se prendem com finalidades preventivas, a diligência de prova pode ser efectuada pelo orgão de polícia criminal e validada, posteriormente, pelo juiz. Estes casos reconduzem-se às situações em que há razões para crer que a demora na realização de uma revista ou uma busca, poderia representar grave perigo para bens jurídicos de valor relevante (alínea a) do n.º 4 do art. 159.º) e a outras situações em que são admitidas medidas cautelares ou de polícia, as buscas, revistas e apreensão de correspondência que vêm referidas nos art. s 234º e 235.º, em caso de fuga iminente ou susceptibilidade de perda dos elementos probatórios.
Note-se que as escutas telefónicas só são admitidas nos casos de crimes graves, puníveis com pena de prisão de limite máximo superior a 3 anos, como dispõe a alínea a) do art. 172.º), ou nos casos dos crimes elencados nas alíneas b) a e) do mesmo artigo.
Sem prejuízo de se vir a entender que deve expressamente fazer-se constar da lista constante das referidas alíneas o crime de associação criminosa e, diga-se que a admissibilidade da utilização das escutas telefónidas no âmbito da investigação de tais crimes resulta já da alínea a), parece que a actividade investigatória relativamente ao crime de pertença a sociedade secreta, particularmente, no que toca aos meios de recolha de prova, se encontra suficientemente coberta pela nova lei processual penal.
De referir que em outros sistemas jurídicos, como o de Itália, ou dos E.U. A. o tratamento dos processos de obtenção de prova não difere substancialmente daquele que lhe faz corresponder a lei de Macau. Em Itália, que apresenta profusa legislação de combate à criminalidade organizada, alguma dela entrada em vigor recentemente, os elementos de prova obtidos, designadamente, através de escutas telefónicas, ou intercepção de outras formas de telecomunicação, relativas a sistemas informático ou telematico, autorizadas pelo Procurador da República junto do tribunal onde a diligência tem lugar, sob proposta do Ministro da Administração Interna ou por sua delegação, do Director da D.I.A. e outras entidades policiais, durante a fase investigatória, não têm valor processual, não constituindo prova a apresentar em julgamento 32
No que à valoração da prova respeita, não pode deixar de se atender ao princípio da legalidade da prova (art. 112.º) e à consequência que a lei estabelece para a utilização de meios de prova ilegais: o art. 113.º declara a nulidade e a impossibilidade de utilização das provas obtidas através de tais meios.
Questão complexa, que deverá merecer um juizo de ponderação, é a que toca a criação de mecanismos que permitam um reforço da eficácia em matéria de produção e valoração da prova testemunhal, tradicionalmente limitada, quando não impossibilitada, no âmbito da criminalidade organizada, pelo receio de represálias que venham a ser praticadas, quer na pessoa da eventual testemunha, quer na pessoa de um membro do seu agregado familiar.
Recorrendo a uma analise de direito comparado verifica-se que em Taiwan, na tentativa de estimular à denúncia dos crimes de associação criminosa, se prevê a concessão de um prêmio pecuniário ao denunciante dos crimes relativamente aos quais venha a ser proferida sentença condenatória e o cumprimento de regras que garantam a reserva das informações referentes àidentificação, quer do aludido denunciante, quer do ofendido, quer da testemunha, designadamente perante o réu ou o seu advogado, caso haja elementos que comprovem que aqueles possam vir a sofrer represálias33.
Também na vizinha Hong-Kong, o Witness Protection Bill contempla um programa de protecção e assistência às pessoas cuja segurança tenha sido colocada em perigo pelo facto de serem testemunhas de um crime. Tal programa abrange a realização de todos os actos que a autoridade competente considere necessários e adequados à protecção da pessoa abrangida pelo mesmo programa34.
Avulta que a pessoa a proteger é sujeita a um apertado inquérito, bem como a testes médicos, psicológicos e psiquiátricos35.
Prevê-se a deslocação da testemunha para local diverso do da sua residência e a mudança de identidade mediante competente autorização do Governador, neste último caso, não podendo a verdadeira identidade ser revelada, mesmo perante outras entidades públicas36.
De notar, ainda, que se estabelecem penas de prisão, até um máximo de 10 anos, para aqueles que, em virtude da sua profissão, tenham acesso a dados relativos ao programa de protecção por que se encontra abrangida uma testemunha e os revelem a terceiras pessoas37.
Finalmente, quando a testemunha se desloca a tribunal para ser ouvida em audiência, prevê-se a identificação e a revista das pessoas que pretendem assistir e a possibilidade de ser vedado o acesso à sala onde decorre a audiência a todos quantos recusem cumprir as regras cautelares impostas pela polícia38.
Quanto a Macau, sem prejuízo da concretização de um sistema de protecção e assistência à testemunha que venha a merecer acolhimento pela Administração, que, pelas razões aduzidas a propósito da concretização de um sistema de protecção do arrependido39, deve ser objecto de um diploma legal autónomo, qualquer regime especial tendo por finalidade a obtenção e valoração da prova testemunhal não pode deixar de se conformar com os princípios fundamentais do processo penal de Macau que dispõem de tutela constitucional40 e se encontram consagrados quer na lei processual penal quer nos diplomas que se referem à Organização Judiciária do Território.
São esses princípios o princípio do acusatório41 que determina a diferenciação material e não meramente formal entre a entidade que julga e a entidade que investiga, o princípio do contraditório42 que impõe a materialização do direito que assiste ao arguido (bem como, de resto, ao Ministério Público e ao Assistente43), de contraditar a prova e impugnar os factos trazidos ao processo que lhe sejam desfavoráveis e o princípio da oralidade e audiência que estabelece a obrigatoriedade de prestação pública e oral da prova perante o juiz do julgamento.
O que significa que a prova produzida durante a fase investigatória presidida pelo Ministério Público ou pelo Juiz de Instrução só serve para fundamentar a acusação, e justificar o despacho de pronúncia, ou seja, a certificação de que existem suficientes elementos probatórios para justificar a submissão a julgamento do arguido.
Pelo que emerge da compreensão que os princípios aludidos têm no sistema processual penal de Macau que a prova testemunhal só ganha a sua verdadeira importância no momento em que éprestada na audiência de julgamento. Essa importância é realçada pela norma do art. 333.º n.º 1 alínea a) do novo Código de Processo Penal de Macau que, tendencialmente, se dirige à criação de um mecanismo de protecção que possibilite a prestação do depoimento por parte da testemunha e, ou, das declarações por parte do ofendido. Com efeito, aí se consagra a possibilidade de o juiz ordenar o afastamento do arguido da sala de audiência, durante a prestação dedeclarações se "houver razões para crer que a presença do arguido inibiria o declarante de dizer a verdade". Não obstante e sob pena de nulidade do acto, cumprindo-se por aqui o princípio do contraditório, voltando o arguido à sala de audiência é resumidamente instruído pelo juiz do que se tiver passado na sua ausência44.
Por ser de interesse, refira-se, ainda, o n.º 3 do art. 134.º do mesmo diploma que no âmbito das diligências de "reconhecimento de pessoas" dispõe que "se houver razões para crer que a pessoa chamada para fazer a identificação pode ser intimidada ou perturbada pela efectivação do reconhecimento e este não tiver lugar em audiência, deve o mesmo efectuar-se, se possível, sem que aquela pessoa seja vista pelo identificando".
Não sendo de recusar, liminarmente, a consagração na lei de uma norma que preveja o alargamento do instituto de "declarações para memória futura "Previsto no ari. 253.º do Código de Processo Penal que permite a valoração em julgamento de prova por declarações prestada durante a fase investigatória nos casos de "doença grave, de deslocação para o exterior ou de falta de autorização de residência em Macau" que, previsivelmente, impeça a pessoa a quem interessa tomar declarações (pode ser uma testemunha, o assistente, a parte civil ou um perito) de ser ouvida em julgamento, de modo a que dele possam beneficiar as testemunhas admitidas ao regime especial de protecção no domínio dos crimes de pertença a sociedade secreta, deve tal alargamento ser consentâneo com os princípios do contraditório e obedecer a criteriosa ponderação45.
D- Aplicação de medidas cautelares processuais
No plano das medidas processuais de natureza cautelar, i. e. , das medidas que são aplicadas ao arguido durante o processo, com a finalidade de prevenir a ocorrência de factos que perturbem a investigação (por exemplo, destruição da prova, atemorização de declarantes, testemunhas e peritos) ou impossibilitem a execução da sentença condenatória que vier a ser proferida (devido a fuga do arguido) ou impedir a continuação da actividade criminosa, parece que não se configura a necessidade de inovar, atenta a panóplia de medidas previstas na lei, designadamemte na nova lei processual penal46.
Poderá, todavia, expressamente, tornar-se extensivo aos casos de crime de pertença às sociedades secretas o regime particularmente severo que vem contemplado no art. 193.º quanto àprisão preventiva, a qual é de aplicação obrigatória no caso dos crimes que aí vêm elencados. Diga-se que, de todo o modo, a aplicação da medida de prisão preventiva obrigatória no caso da criminalidade organizada resulta, em determinados casos, já, coberta pelas normas dos n.ºs 1 e 2 do mencionado artigo47.
Sobre o regime das medidas de prevenção48 anti-MAFIA que, pretendendo superar as dificuldades de prova no domínio da criminalidade mafiosa onde predomina a lei do silêncio, faz depender a sua aplicação (a qual, note-se, ocorre na pendência de um processo com uma natureza diversa do processo penal)unicamente da existência de meros indícios probatórios49, deverá dizer-se que constando, principalmente, dos seguintes diplomas, Lei n.º 327 de 3/9/88, D.L. n.º 230 de 14/6/89, alterado pela Lei n.º 282 de 4/8/89, Lei n.º 55 de 19/3/90, têm sido objecto de constantes e repetidas dclarações de inconstitucionalidade.
Na sequência de um Referendo à população, em 28 de Julho de 1995, por Decreto do Presidente da República, foi, em Itália, revogada a medida de fixação obrigatória de residência aplicada aos agentes suspeitos de estarem prestes a cometer um crime mafioso50.
10. Outras medidas consideradas, político-criminalmente, eficazes no combate à criminalidade organizada.
Ultimamente, tem vindo a reconhecer-se, que a tarefa de prevenção e repressão do crime organizado impõe uma opção legislativa multidisciplinar e diversificada que, sem descurar o plano do direito penal e processual penal tende a abranger outros ramos do direito.
Na verdade, não pode desconhecer-se que as organizações criminosas, estrutural e final istic amente concebidas como empresas prosseguem, ainda que através da prática de crimes, "lucros" que, depois de "recielados" ou depois de dissimulada a sua origem criminosa, são investidos em diversas actividades da área económica consideradas legais. Não é difícil prever que os lucros provenientes dessas actividades legais, venham a ser, a seguir, de novo investidos na prática de crimes.
Nos sistemas jurídicos dos vários países da Europa, em alguns países da Asia e em diplomas legais de natureza internacional, com a finalidade de desferir um golpe às associações do crime, precisamente na fase do circuito em que se realiza a sua actividade que lhes permite adquirir fundos financeiros que estimulam, possibilitam e potenciam a continuidade da prática criminosa, contemplam-se, hoje, normas destinadas a detectar as fortunas ilicitamente acumuladas e efectuar a apreensão dos bens que as integram51.
Considerando as características que, a avaliar pelos estudos criminológicos efectuados52, apresentam as organizações criminosas que actuam no espaço geográfico asiático e, particularmente, em Macau, conhecidas por sociedades secretas, em que a estrutura, contrariamente à MAFIA, não é vertical e em que as relações de hierarquia que se estabelecem entre os membros são de molde a possibilitar a actuação individual de cada um deles, quer na prática de crimes, quer na disstmulação da. origem criminosa dos proventos do crime, quer no reinvestimento desses proventos após "branqueados", impôe-se uma análise do fenómeno, tendente ao estabelecimento de mecanismos legais e instrumentais que permitam uma intervenção eficaz com vista ao seu combate.
Em conformidade, justifica-se uma norma que determine a perda a favor do Território53 dos direitos e objectos ou recompensa que, através do crime de associação criminosa tenham sido adquiridos pelo agente, compreendendo móveis, imóveis, aeronaves, barcos, veículos, depósitos bancários ou de valores ou quaisquer outros bens de fortuna, e bem assim como os bens em que foram aqueles transformados e os juros, lucros e outros benefícios obtidos com os aludidos bens54.
Questão diversa e que apresenta contornos delicados, é a possibilidade de actuação, durante o processo em que se imputa a uma pessoa a prática de um crime de associação criminosa,55 sobre os bens dessa pessoa, com a finalidade de, prevendo-se a alta probabilidade de uma condenação futura, virem tais bens a ser objecto de declaração de perda a favor do Território.
A aludida diligência de apreensão de bens é acolhida, designadamente, na lei de Taiwan e na Lei de Hong-Kong56.
A questão, repete-se, é delicada uma vez que não havendo suficientes indícios probatórios quanto à origem criminosa dos bens, fazendo depender a "apreensão" da impossibilidade de prova por parte do arguido da origem lícita dos mesmos, pode configurar-se uma "inversão do ónus da prova" que resulta inadmissível face ao57.
O instituto de "apreensão" a consagrar no domínio das medidas de luta contra o crime organizado deverá, com vantagem, tomar em atenção a norma do art. 166º do novo Código de Processo Penal onde se dispõe: "a autoridade judiciária procede à apreensão de títulos, valores, quantias e quaisquer outros objectos depositados em bancos ou outras instituições de crédito, mesmo que em cofres individuais, quando tiver fundadas razões58 para crer que eles estão relacionados com um crime e se revelarão de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, mesmo que não pertençam ao arguido ou não estejam depositados em seu nome", sem, obviamente, prejudicar os direitos de terceiro de boa fé.
Maria Leonor Machado Esteves de Campos e Assunção
Macau, aos 12 de Março de 1997
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1 Vs. Código Penal Italiano, art. 416.º (bis) introduzido pelo art. 1.º do D.L. 13/9/82 N.º 646
2 Vs os art. s 18.º, 20.º n.º 2 da Lei das Sociedades de Hong-Kong e, particularmente, o art. 391 do mesmo diploma que, em matéria de apreciação da prova nos casos de crime de associação criminosa sociedade secreta/tríade, manda atender a monografias ou outras publicações que contenham estudos de carácter sociológico ou histórico sobre o fenómeno reputados como cientificamente sérios.
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3 Este último o termo que, de acordo com dicionários chineses consultados corresponde, de modo mais perfeito, ao sentido que o termo tem em português.
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4 Penas de prisão de 3 a 10 anos para os promotores ou fundadores, membros, apoiantes e cúmplices e de 5 a 12 anos para os chefes ou dirigentes.
5 Vs. art.s 3.º a 6.º do decreto presidencial sobre a criação de legislação para a prevenção de crimes organizados que estabelecem penas de prisão de 6 meses a 5 anos para os participantes e apoiantes, de 3 a 10 anos para os fundadores, dirigentes ou chefes, que em casos determinados casos são, todavia agravadas em metade no seu máximo, a que acresce uma agravação relativa à prática efectiva de crimes e uma medida trabalho obrigatório de 5 a-nos no seu máximo.
6 De acordo com o disposto nos art. s 20.º a 23.º da Lei sobre sociedades as penas são de prisão até 3 anos nos casos de pertença e apoio, e até 2 anos no caso de aliciamento ou recrutamento.
7 Vs art. 416 bis do C.P., que comina com a pena de prisão de 3 a 6 anos os membrosde uma associação de tipo mafioso, de 4 a 9 anos os promotores e dirigentes, penas a que acresce uma medida de segurança e que são agravadas no caso de associação armada para 4 a 10 anos e 5 a 15 anos.
8 Assim art. 15.º da Lei Italiana de 19/3/90 nº 55 relativa à "prevenção da delinquência de tipo mafioso e outras formas graves de manifestação de perigosidade social" que estipula uma incapacidade para ser eleito, designadamente, nas eleições regionais provinciais e comunais, bem como de ser prsidente da junta regional ou provincial, síndico, acessor e consiglieri (no original).
9 Vs. art. 13.º da Lei de Taiwan (Decreto Presidencial de 11 de Dezembro do 85.º Ano da República da China) que, para os casos de condenação em pena mais grave do que a pena de prisão de duração limitada proibe o registo do agente como candidato aos lugares da função pública.
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10 Vs. o art. 15 bis da Lei de 19/3/90, n.º 55 onde se prevê a demissão das autoridades comunais e provinciais suspeitas de pertencerem à MAFIA, norma que, de resto tem sido entendida, se não, como inconstitucional, ao menos de duvidosa constitucionalidade.
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11 Vs. Art. 20.º, n.º 2 da Lei das Sociedades. Pontue-se que a opção legislativa em Hong-Kong parece dever ser entendida como uma forma de presumir legalmente a pertença à associação criminosa àqual a declaração respeita e, do mesmo passo, de presumir legalmente a sua existência, face às tradicionais dificuldades em sede de prova.
12 Necessário se toma, neste caso, prever a existência de situações de concurso entre esta norma e a que vier a descrever o crime de "extorsão a pretexto de protecção" que, agora consta do art. 16.º da Lei n.º 1/78/M.
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13 Isto é, o período de tempo que, atenta a regra geral do art. 65.º do Código Penal de Macau, decorre entre a prática de um crime pelo qual o agente foi julgado e condenado e a prática de novo crime.
14 Vs os art.s 23.º e 24.º do D.L. n.º 27/96/M de 3 de Junho.
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15 Entendimento idêntico tem, actualmente a jurisprudência italiana, correspondendo à posição tomada, neste âmbito, pelo Tribunal Constitucional, in, Anotação aos diplomas relativos aos Collaboratori di Giustizia, D.L. n.º 8 de 15 de janeiro de 1991, alterado pela Lei n.º 82 de 15 de Março de 1991 e D.L. n.º 119 de 29 de Março de 1993 e D.R. n.º 687 de 24 de Novembro de 1994.
16 Vs. os diplomas indicados na nota supra, particularmente, o art. 13.º bis do D.L. n.º 15/1/91.
17 Ibid.
18 Vs. "Witness Protection Bill", ainda não entrado em vigor.
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19 Em Itália fazem-se intervir no sistema de protecção as seguintes entidades: Departamento de Segurança Pública que centraliza o serviço de protecção, Ministério da Administração Interna, Ministério da Justiça e Ministério das Finanças. Vs. art.s 14.º, 15.º e 17.º do D.L. n.º 8 de 15/1/91.
Em Hong-Kong, a realização prática do programa de protecção à testemunha coenvolve autoridades cuja nomeação será da competência do Governador e os Comissariados de Polícia e da Comissão Autónoma de Luta Contra a Corrupção.
20 Diplomas citados na nota 14.
21 Cf. com os art. s 7.º a 12.º do Witness Protection Bill de Hong-Kong.
22 Ibid, particularmente, o D.L. n.º 119 de 29/3/93.
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23 Cf. com o n.º 2 do art. 13.º da Lei n.º 8/96/M referente ao jogo ilícito.
24 Art. 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa e art. 29.º da Lei Básica da Futura Região Administrativa de Macau.
25 Art. 32.º da Constituição, art. 29.º da Lei Básica e art. s 126.º n.º 2, 283.º n.º 3 e 308.º n.º 2 do novo Código de Processo Penal de Macau.
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26 Nos termos da parte final do n.º 1 do art. 87.º do vigente Código de Processo Penal de Macau que encontra correspondência no n.º 2 do art. 77.º do novo Código de Processo Penal de Macau.
Cf. com o disposto quanto à protecção da testemunha no Witness Protection Bill de Hong-Kong.
27
28 Vs. o D.L. n.º 345 de 29 de Outubro de 1991, alterado pela Lei n.º 410 de 30 de Dezembro de 1991, "Disposições urgentes para a coordenação da actividade de informação e investigação na luta contra a criminalidade organizada".
Vs. art. 12 quater do D.L. n.º 306 de 8 de Junho de 1992, alterado pela Lei n.º 356 de 7 de Agosto de 1992, "Modificações urgentes ao novo Código de Processo Penal e regras pro-cedimentares na luta contra a criminalidade mafiosa".
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Em Hong-Kong, ao que se supõe, corresponde a cerca de 5.000 HKD.
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De acordo com a alínea c) do n.º 1 do art. 1.º do Código de Processo Penal órgãos de polícia criminal são todas as entidades e agentes policiais a quem caiba levar a cabo quaisquer actos ordenados por uma autoridade judiciária ou determinados pelo Código.
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32 Vs. art. 25 er do D.L. n.º 306, de 8 de Junho de 1992, alterado pela Lei n.º 356, de 7 de Agosto de 1992, Modificações urgentes ao novo Código de Processo Penal e medidas procedimentares de combate à criminalidade organizada.
33 Vs. art. s 10.º a 12.º do diploma legal citado na nota 8.
34 Vs. art. s 3.º e 7.º.
35 Art. 5.º.
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36 Art. s 8.º, 9.º e 10.º.
37 Art. 17.º.
38 Art. 19.º.
39 Vs. as considerações tecidas no n.º 8, p. 10.
40 Vs. art. 32.º da Constituição da República Portuguesa.
41 Vs. art. 19.º do D.L. n.º 17/92/M.
42 Vs, art. s referidos na nota 24.
43 A pessoa, regra geral a vítima ou um seu familiar, a quem a lei confere legitimidade para assistir o Ministério Público na tarefa de exercer a acção penal.
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44 Art. 3 13.º n.º 5
45 Interessa, por isso, tomar em atenção as regras constantes dos n.ºs 2, 3 e 5 do referido art. 313.º
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46 Atente-se nos art. s 181.º e seguintes que regulam a aplicação das medidas de coacção: "termo de identidade e residência", "caução", "obrigação de apresentação periódica", "proibição de ausência e de contactos", "suspensão do exercício de funções, profissão ou direitos" e "prisão preventiva".
47 Nos casos em que o crime tenha sido cometido com violência, quer dizer, que suponha ou seja acompanhado de uma agressão à vida, à integridade física ou à liberdade das pessoas e for punível com pena de prisão de limite máximo superior a 8 anos.
Não pode deixar de se atender, quanto à opção tomada pelo legislador de Macau, mesmo que afastada a dúvida quanto à sua constitucionalidade, às críticas que a doutrina entendeu fazer àexpressa obrigatoriedade de aplicar a prisão preventiva em casos determinados, a qual, na verdade, excepciona os princípios fundamentais que presidem à aplicação de tal medida, os princípios da necessidade, da proporcionalidade e da subsidiariedade vertidos na lei processual penal de Macau e correspondentes aos mandatos constantes do Pacto Internacional Sobre os Direitos Civis e Políticos (art.9, particularmente n.º 3).
48 Essas medidas abrangem a obrigação de fixação de residência, da qual é proibido ausentar-se, a apreensão (e posterior confisco) e a suspensão temporária da administração dos bens relativamente aos quais há a suspeita de proveniência ilícita e a demissão da função pública.
Tais medidas são de aplicar aos "soggetti indiziati di appartenere ad associazioni dí tipo mafiosi". Esta qualificação ocorre, não durante um processo tendo por finalidade a investigação da responsabilidade penal do agente, com as garantias próprias de um processo penal, mas durante um procedimento de natureza essencialmente policial, destinado aplicar uma medida de prevenção correspondente a um juízo de perigosidade social que se fundamenta, muito mais, no
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50 O Tribunal Constitucional interveio em 1994, afirmando na sentença n.º 419 a necessidade de considerar a decisão da autoridade competente para aplicar tal medida, ( o procurador junto do tribunal do local da residência do agente), provisória e sujeita a controlo judicial.
51 Vs., por exemplo o D.L. n.º 325/95 que, em Portugal estabelece medidas de natureza preventiva e repressiva contra o branqueamento de capitais e outros bens provenientes dos crimes.
Cf. com a Directiva n.º 91/308 de 10 de Junho, da Comunidade Económica Europeia relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento, e com a Convenção do Conselho da Europa de 1990 sobre "branqueamento".
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52 Vs., entre outros, Martin Booth, "As Tríades", Fabrízio Calvi, "A Europa dos Padrinhos", 1995, "Australian Paper on the Role of Legislation in the Development of Action Against Organized Crime" Havana, 1990, Giuseppe Spagnolo, "L’Associazione di Tipo Mafioso", Padova, 1984, Gordon Fung Siu-Yuen, "Organized Crime in Hong-Kong", Robert Harnischmacher "Chinese Triads and Japonese Yakusa - How Dangerous is the Asian Mafia?", Criminal Inteligence Bureau, Royal Hong-Kong Police Force, "Triads in Hong-Kong Past and Present", 1988.
53 Vs. sobre a perda de bens a favor do Território, os art. s 101.º e seguintes do Código Penal.
54 Cf. com os art. s 35.º a 39.º do D. L. n.º 15/93 (Lei da Droga), vigente em Portugal.
55 Durante o processo e não como medida prévia cautelar de índole policial, como é o caso dos diplomas legais italianos citados, supra, número 9, letra D.
Vs. "Organized and Serious Crimes Ordinance".
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57 Refira-se que foi a incompatibilidade com o princípio da proibição da inversão do ónus da prova que explica o facto de Portugal não ter, no âmbito da Lei da Droga, adoptado a sugestão do art.5.º, n.º 7 da Convenção das Nações Unidas de 1988.
58 O sublinhado não consta do texto legal.