NOTA JUSTIFICATIVA

O Estatuto dos Magistrados, aprovado pela Lei n.º 10/1999, estabelece, na alínea 3 do n.º 1 do seu artigo 3.º, como requisito especial de provimento nas categorias de juiz de primeira instância e magistrados do Ministério Público, a frequência com aproveitamento de um curso e estágio de formação.

O n.º 2 da citada disposição prevê, ainda, que a duração, os conteúdos e as regras de frequência e disciplina do curso e estágio de formação, a avaliação e a classificação final, o prazo de validade, bem como o estatuto dos respectivos formandos são regulamentados por diploma autónomo.

O presente projecto de proposta de lei pretende desenvolver os referidos normativos, estabelecendo o regime do curso e estágio de formação para ingresso nas magistraturas judicial e do Ministério Público.

As regras relativas à matéria em apreço encontram-se actualmente previstas no Decreto-Lei n.º 6/94/M, de 24 de Janeiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 18/97/M, de 19 de Maio.

Contudo, tais disposições, tendo sido elaboradas num contexto legal diferente ao nível do sistema judiciário, apresentam-se ora profundamente desadaptadas face à nova Lei de Bases da Organização Judiciária, ao mencionado Estatuto dos Magistrados e ao Regulamento Administrativo n.º 5/2001, que define a organização e funcionamento do Centro de Formação Jurídica e Judiciária.

No Decreto-Lei n.º 6/94/M encontram-se referências expressas ao Conselho Judiciário de Macau, ao Estatuto dos Auditores Judiciais e ao Decreto-Lei n.º 55/92/M, de 18 de Agosto, os últimos revogados, respectivamente, pela alínea 2) do artigo 114.º da Lei n.º 10/1999 e pelo n.º 4 do Anexo I da Lei n.º 1/1999 - Lei da Reunificação.

Nesta medida, torna-se imperioso alterar o regime vigente relativo à formação para ingresso nas magistraturas, no cumprimento do disposto na Lei n.º 10/1999 e em conformidade com o enquadramento legal do sistema judiciário da Região Administrativa Especial de Macau.

 


 

REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU

Lei n.º /2001

(Proposta de Lei)

Regime do curso e estágio de formação para ingresso

nas magistraturas judicial e do Ministério Público

A Assembleia Legislativa decreta, nos termos da alínea 1) do artigo 71.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau, para valer como lei, o seguinte:

 

Artigo 1.º

Ingresso nas magistraturas

Sem prejuízo do disposto na Lei n.º 10/1999, o ingresso nos quadros das magistraturas judicial e do Ministério Público depende da frequência, com aproveitamento, de um curso e estágio de formação, a realizar no âmbito das atribuições do Centro de Formação Jurídica e Judiciária, adiante designado por Centro de Formação.

 

Artigo 2.º

Concurso

O concurso para admissão ao curso e estágio de formação é organizado pelo Conselho Pedagógico do Centro de Formação, adiante designado por Conselho Pedagógico, sendo a sua abertura anunciada por aviso publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau.

 

Artigo 3.º

Requisitos de candidatura

Os requisitos de candidatura ao concurso para admissão ao curso e estágio de formação são os definidos na lei geral para o desempenho de funções públicas na Região Administrativa Especial de Macau, adiante designada por RAEM, e ainda os seguintes:

1) Licenciatura em direito legalmente reconhecida;

2) Reconhecida idoneidade cívica;

3) Residência em Macau há, pelo menos, 7 anos;

4) Domínio das línguas chinesa e portuguesa.

 

Artigo 4.º

Número de vagas

O número de vagas a abrir para o curso e estágio de formação é fixado por despacho do Chefe do Executivo, tendo em conta a informação sobre as necessidades de serviço nos tribunais e no Ministério Público, prestada, respectivamente, pelo Conselho dos Magistrados Judiciais e pelo Procurador.

 

Artigo 5.º

Métodos de selecção

Os métodos de selecção utilizados no concurso para admissão ao curso e estágio de formação são os seguintes:

1) Provas de conhecimentos jurídicos que versam as seguintes matérias:

i) Organização e sistema político da RAEM;

ii) Sistema jurídico-material e processual vigente na RAEM;

iii) Sistema judiciário da RAEM;

2) Provas de conhecimentos linguísticos;

3) Avaliação do perfil psicológico.

 

Artigo 6.º

Nomeação e posse

1. Os candidatos admitidos são nomeados como estagiários por despacho do Chefe do Executivo a publicar no Boletim Oficial da RAEM.

2. Os estagiários nomeados tomam posse no Centro de Formação perante o seu director.

 

Artigo 7.º

Estatuto de estagiário

1. Os candidatos admitidos frequentam o curso e estágio de formação com o estatuto de estagiário.

2. Sem prejuízo do disposto na presente lei, aos estagiários aplicam-se, com as necessárias adaptações, as disposições do Estatuto dos Magistrados, aprovado pela Lei n.º 10/1999, e, em matéria de deveres e direitos apenas os artigos 22.º a 26.º, 28.º, 29.º, 31.º a 33.º, 35.º, 39.º e 40.º.

3. Os estagiários estão especialmente obrigados aos deveres de assiduidade e pontualidade e de disciplina previstos na presente lei.

 

Artigo 8.º

Regime de frequência do curso e estágio de formação

1. A frequência do curso e estágio de formação faz-se em regime de comissão de serviço pelo período da sua duração global.

2. A comissão de serviço considera-se automaticamente renovada:

1) Até à publicação da informação final do curso e estágio de formação;

2) Para aqueles que tenham obtido aproveitamento, até à publicação da nomeação de, pelo menos, um deles como magistrado, ou até 60 dias após a publicação a que se refere a alínea anterior quando a publicação da nomeação não tenha ocorrido dentro deste prazo;

3) Para aqueles cuja nomeação tenha sido publicada no prazo de 60 dias após a publicação a que se refere a alínea 1), até à data da respectiva posse.

 

Artigo 9.º

Estagiários que sejam trabalhadores da

Administração Pública

1. Caso o estagiário seja trabalhador da Administração Pública, o período de duração da comissão de serviço como estagiário conta, para todos os efeitos legais, como tempo de exercício efectivamente prestado no cargo, carreira e categoria de origem.

2. O prazo dos contratos além do quadro e de assalariamento e da comissão de serviço dos titulares de cargos de direcção e chefia é suspenso enquanto durar a comissão de serviço como estagiário.

 

Artigo 10.º

Remuneração

1. Os estagiários são remunerados pelo índice 700 da tabela indiciária para a função pública.

2. Os estagiários que sejam trabalhadores da Administração Pública podem optar pela remuneração do cargo, carreira e categoria que detêm à data da nomeação como estagiários.

 

Artigo 11.º

Duração e conteúdo do curso e estágio de formação

O curso e estágio de formação tem uma duração global de dois anos e compreende duas fases:

1) A fase do curso, com a duração de um ano, de habilitação para o exercício de funções judiciárias, que se realiza no Centro de Formação;

2) A fase do estágio, com a duração de um ano, de adaptação ao exercício de funções, que se realiza nos tribunais e no Ministério Público.

 

Artigo 12.º

Actividades nos tribunais e no Ministério Público

As actividades de estágio nos tribunais e no Ministério Público são definidas no plano e programa do curso e estágio de formação e realizadas sob a orientação e responsabilidade de magistrados formadores, podendo o estagiário, nomeadamente:

1) Coadjuvar o respectivo magistrado formador em actos de investigação ou instrução criminal;

2) Colaborar na preparação de promoções, despachos e outras decisões;

3) Assistir às deliberações dos órgãos judiciais;

4) Intervir nos actos preparatórios do processo;

5) Proferir despachos de mero expediente.

 

Artigo 13.º

Validade do aproveitamento no

curso e estágio de formação

Para efeitos de ingresso nos quadros das magistraturas judicial e do Ministério Público, o aproveitamento no curso e estágio de formação é válido pelo prazo de três anos, contado da data de publicação da informação final do curso e estágio de formação.

 

Artigo 14.º

Dever de assiduidade e pontualidade

1. Os estagiários estão obrigados a seguir com assiduidade e pontualidade as actividades pedagógicas e a justificar as suas ausências e atrasos.

2. No período de duração global do curso e estágio de formação, determinam a exclusão:

1) Cinco faltas injustificadas, seguidas ou interpoladas; ou

2) Vinte faltas justificadas.

 

Artigo 15.º

Dever de disciplina

1. Os estagiários estão obrigados a executar os trabalhos que lhes forem distribuídos de acordo com o plano e programa do curso e estágio de formação.

2. Os estagiários devem participar na organização de actividades pedagógicas sempre que para tal forem solicitados.

 

Artigo 16.º

Infracção disciplinar

A violação dos deveres dos estagiários, nomeadamente os previstos no artigo 14.º e no artigo anterior, constitui infracção disciplinar.

 

Artigo 17.º

Penas disciplinares

Aos estagiários são aplicáveis as seguintes penas disciplinares:

1) Advertência;

2) Exclusão.

 

Artigo 18.º

Pena de advertência

A pena de advertência é aplicável por faltas leves, que não tenham trazido prejuízo para o normal funcionamento do curso e estágio de formação, mas que não devam passar sem reparo ou repreensão.

 

Artigo 19.º

Pena de exclusão

A pena de exclusão consiste na impossibilidade do estagiário continuar a frequentar o curso e estágio de formação, fazendo cessar a respectiva comissão de serviço.

 

Artigo 20.º

Pena acessória

Pode ser aplicada, cumulativamente com a pena prevista no artigo anterior, a pena acessória de impossibilidade de admissão a curso e estágio de formação para ingresso nas magistraturas que venha a ser aberto no prazo de dois anos.

 

Artigo 21.º

Suspensão preventiva do estagiário

1. O presidente do Conselho Pedagógico pode suspender preventivamente, até cinco dias, os estagiários sujeitos a procedimento disciplinar cuja permanência no Centro de Formação ou nos tribunais e no Ministério Público se revele gravemente atentatória da disciplina.

2. Caso o procedimento disciplinar venha a ser arquivado ou considerado improcedente, são consideradas justificadas as faltas relativas ao período de suspensão, não sendo, no entanto, as mesmas contadas para os efeitos da alínea 2) do n.º 2 do artigo 14.º.

 

Artigo 22.º

Aplicação das penas

1. A aplicação da pena disciplinar prevista na alínea 1) do artigo 17.º, compete ao Conselho Pedagógico.

2. A aplicação da pena disciplinar prevista na alínea 2) do artigo 17.º, bem como da pena acessória prevista no artigo 20.º, é da competência do Chefe do Executivo, podendo ser delegada no Secretário para a Administração e Justiça.

3. Nenhuma pena será aplicada sem prévia audição do arguido.

 

Artigo 23.º

Regulamento do curso e estágio de formação

O regulamento do curso e estágio de formação, contendo disposições relativas ao concurso, ao conteúdo e funcionamento do curso e estágio de formação e ao corpo docente, é aprovado por regulamento administrativo.

 

Artigo 24.º

Norma revogatória

São revogados:

1) Os artigos 3.º a 13.º do Decreto-Lei n.º 6/94/M, de 24 de Janeiro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 18/97/M, de 19 de Maio;

2) Os capítulos IV a IX e XIII do Regulamento Interno do Centro de Formação dos Magistrados de Macau, publicado no Boletim Oficial n.º 33, de 14 de Agosto de 1995, com as alterações publicadas no Boletim Oficial n.º 26, I Série, de 25 de Junho de 1996.

 

Artigo 25.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Aprovada em de de 2001.

A Presidente da Assembleia Legislativa, Susana Chou.

Assinada em de de 2001.

Publique-se.

O Chefe do Executivo, Ho Hau Wah.