2.3 Criação dos Serviços de Polícia Unitários

 

2.ª COMISSÃO PERMANENTE

PARECER N.º 1/2001

Assunto: Proposta de lei intitulada "Criação dos Serviços de Polícia Unitá-rios"

 

I - INTRODUÇÃO

1. Por despacho da senhora Presidente da Assembleia Legislativa, datado de 12 de Dezembro de 2000, foi distribuída a esta Comissão a proposta de lei relativa à criação dos Serviços de Polícia Unitários (SPU), para efeitos de apreciação na especialidade e elaboração de parecer.

2. A Comissão reuniu diversas vezes para proceder à análise da proposta de lei, tendo, na reunião realizada no dia 3 de Janeiro do corrente ano, contado com a participação do senhor Secretário para a Segurança e respectivos assessores, com a presença do senhor Comandante da PSP, assim como com outros elementos do Executivo, designadamente, do Gabinete da Secretária para a Administração e Justiça.

3. A Comissão fez incidir a análise da proposta de lei em duas vertentes distintas. Em primeiro lugar considerou a opção legislativa do Executivo no que se refere a não fundir as duas polícias responsáveis pela segurança interna da RAEM, optando antes por unir estas duas polícias num comando conjunto, considerando que esta opção, que foi aprovada na generalidade em Plenário, é a mais correcta.

4. Num segundo momento fez uma apreciação pormenorizada de cada norma no sentido de verificar de que forma aquela opção se encontrava consagrada no texto proposto. Nesta conformidade, apreciou as competências do Comandante-geral dos Serviços de Polícia Unitários e da compatibilização destas competências com as do Secretário para a Segurança, tendo a Comissão suscitado ainda várias questões como as referentes ao Subgabinete da Interpol, a atribuição da qualidade de autoridade de polícia criminal através de regulamento administrativo aos membros dos SPU, a necessidade de adequação dos diplomas referentes aos serviços que integram o sistema de segurança interna, etc..

5. Foi, assim, com o objectivo de esclarecer estas questões, que são as que mais preocupam, quer os Deputados, quer a opinião pública, que a Comissão convidou o Executivo para uma reunião, tendo este explicado as ideias e os pressupostos que estiveram na origem das opções tomadas em cada norma.

6. Em termos gerais, os esclarecimentos prestados pelo Executivo clarificaram as questões levantadas, quer no Plenário aquando da discussão na generalidade da proposta de lei, quer no seio da Comissão. A Comissão sugeriu também algumas alterações de redacção do articulado, que, de uma forma geral, foram bem recebidas por aquele, que veio posteriormente apresentar alterações em relação a determinados artigos.

 

II – APRECIAÇÃO NA ESPECIALIDADE

Artigo 1.º

A Comissão manifesta a sua concordância relativamente a esta norma, considerando que a mesma define com clareza a natureza dos Serviços de Polícia Unitários ao qualificá-los como órgão de natureza operacional responsável pela segurança pública interna da RAEM. Por outro lado, especifica a relação entre o Secretário para a Segurança, o Comandante-geral e a Polícia Judiciária e Corpo de Polícia de Segurança Pública, dentro das atribuições dos SPU. Entende igualmente que, ao determinar que os SPU integram o sistema de segurança interna da RAEM, esclarece que ficarão a fazer parte deste sistema, reforçando-o.

Artigo 2.º

Este artigo especifica as atribuições dos Serviços de Polícia Unitários, que se enquadram dentro das premissas do sistema de segurança interna da RAEM. Considera a Comissão que a abrangência das atribuições e o carácter eminentemente operacional atribuído aos Serviços de Polícia Unitários são de molde a contribuir para o aperfeiçoamento e eficácia do sistema de segurança interna, previsto no Decreto-Lei n.º 76/90/M.

Artigo 3.º

O nº. 1 desta norma foi largamente discutido no seio da Comissão. O Comandante-geral é, sem dúvida, titular de um principal cargo, respondendo por isso, nos termos da Lei n.º 2/1999 (Lei de Bases da Orgânica do Governo), perante o Chefe do Executivo. No entanto, ao abrigo da alínea 1 do artigo 4.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, o Secretário para a Segurança tem competências na área da segurança pública interna da RAEM. Assim sendo, o Secretário para a Segurança, no âmbito das competências que lhe foram atribuídas por aquele Regulamento, tem poderes de direcção sobre os Serviços de Polícia Unitários.

No entanto, detectou-se alguma dificuldade em equacionar este entendimento com o facto de, nos termos da Lei n.º 2/1999, tanto o Secretário para a Segurança como o Comandante-geral dos Serviços de Polícia Unitários serem titulares de principais cargos estando por isso, em princípio, ao mesmo nível em termos hierárquicos.

A Comissão questionou o Executivo acerca do modo como, com a configuração dada a este artigo na proposta de lei, se relacionariam entre si estes dois responsáveis e que competências cabiam a cada um deles no âmbito do sistema de segurança interna do qual os SPU, após a entrada em vigor da lei ora em discussão, passariam a fazer parte. Mais concretamente, a Comissão desejou saber qual o âmbito do poder de supervisão atribuído ao Secretário para a Segurança nesta lei.

Acerca desta problemática foi referido pelo Executivo que o Secretário para a Segurança mantém todos os poderes para a execução das Linhas de Acção Governativa no seu domínio de governação, sendo o responsável pela definição e execução da política de segurança interna da RAEM. Assim sendo, os poderes que lhe são atribuídos nesta matéria, quer pela Lei de Bases da Orgânica do Governo, quer pelo Regulamento Administrativo n.º 6/1999, mantêm-se inalterados, mantendo o poder de direcção sobre todos os organismos policiais que lhe estão subordinados.

A razão de se ter equacionado o poder do Secretário para a Segurança como um poder de supervisão, decorre das limitações que são impostas pela Lei de Bases da Orgânica do Governo, que qualifica o principal responsável pelos serviços de polícia como titular de um principal cargo e estes titulares a responderem ao Chefe do Executivo. Por outro lado, teve de ser equacionada a problemática decorrente das competências dos Tribunais, uma vez que a impugnação contenciosa dos actos do principal responsável são para o Tribunal de 2.ª Instância, nos termos do n.º 7 do artigo 36.º da Lei de Bases da Organização Judiciária. Portanto, este conjunto de normas leva a equiparar o principal responsável dos serviços de polícia a titular de um cargo principal e como tal com a mesma dignidade da de outros titulares de principais cargos.

A Comissão entendeu as razões invocadas pelo Executivo, mas considerou que a norma carecia de ser alterada no sentido de permitir a clarificação das competências do Secretário para a Segurança, uma vez que, tal como a Comissão, o Governo também entende que aquele tem poderes de direcção sobre os SPU.

Nesta conformidade, sugeriu ao Executivo que a redacção do n.º 1 do artigo 3.º fosse alterada, mantendo o Comandante-geral a responder perante o Chefe do Executivo, mas eliminando a referência na parte final ao Regulamento Administrativo n.º 6. Por outro lado, como tanto o Comandante-geral, como o Secretário para a Segurança são titulares de principais cargos, o Governo, através de Regulamento Administrativo, conferirá poderes de supervisão ao Secretário sobre o Comandante-geral. Desta forma fica definida, de forma clara, a hierarquia entre estes dois responsáveis.

De modo a que não restem dúvidas sobre as competências do Secretário sobre os SPU, o Governo propõem-se alterar o Regulamento Administrativo n.º 6, designadamente o Anexo IV, no sentido de aí ficarem também elencados os SPU, e desta forma, ficar claramente definido que estes Serviços ficam na dependência do Secretário para a Segurança.

Julga a Comissão que a solução encontrada clarifica as competências de um e de outro órgão, o que é extremamente importante em termos de procedimento administrativo, pois assim se consegue identificar, dentro do sistema de segurança pública interna da RAEM, os diversos graus hierárquicos e dentro destes as competências de cada um dos responsáveis por esse sistema.

O n.º 5 deste artigo mereceu também alterações por parte do Executivo, uma vez que se entendeu que o termo "envolve", no que se refere à competência disciplinar do Comandante-geral sobre os comandantes dos organismos policiais que lhe estão subordinados, não seria o que melhor define o âmbito da competência nesta matéria que é atribuída àquele Comandante.

O Executivo substituiu em conformidade esta palavra pelo termo "abrange" que está aliás em consonância com a terminologia utilizada no Decreto-Lei n.º 66/94/M (Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau), designa-damente em matéria disciplinar.

Referiu ainda o Executivo e no que diz respeito ao poder disciplinar, que este seria exercido pelo Secretário para a Segurança com exclusão do que decorresse de actos praticados no âmbito das acções de natureza estritamente operacional, sendo, no entanto, esta matéria, objecto de melhor clarificação, através de ordem executiva, logo após o início da vigência da lei.

Artigo 4.º

O artigo 4º. atribui ao Comandante-geral dos SPU o poder de, em casos excepcionais devidamente identificados no corpo da norma, ordenar a prática de actos cautelares. Este poder é tanto mais especial quanto a prática daqueles actos cabe, normalmente, às autoridades judiciárias. Considera, apesar disso, a Comissão, apreciar favoravelmente a norma uma vez que estão definidas as situações em que pode ser ordenada a prática destes actos. No entanto, por razões de ordem técnica, sugeriu ao Executivo que a parte final da norma fosse alterada de forma a ser adoptada a terminologia do Código de Processo Penal, tendo a sugestão sido aceite e constando da versão actualizada da proposta de lei apresentada por aquele.

Artigo 5.º

Esta norma suscitou uma profunda análise por parte da Comissão, tendo o Executivo sido questionado sobre as razões que levaram a que fosse proposta uma solução para as ausências e impedimentos do Comandante-geral dos SPU que não é usual na nossa prática administrativa.

O Executivo esclareceu a Comissão acerca das razões que levaram a que esteja na proposta de lei que nas ausências do Comandante-geral seja o Secretário para a Segurança a assumir as funções daquele e que foram essencialmente as seguintes:

Considera o Executivo que as funções de Comandante-geral dos Serviços de Polícia, ao ter sob a sua responsabilidade a complexa função de responsável pela segurança pública interna da RAEM, obrigam à assumpção de uma grande responsabilidade e implicam um alto grau de autoridade. Por outro lado, ao ficar consagrado no número 4 do artigo 3.º da proposta de lei que o Comandante--geral dos SPU exerce as funções de Comandante de Acção Conjunta nos termos e para os efeitos do disposto na Lei de Segurança Interna, (vide n.º 4 do artigo 1.º, alíneas f), g), h) e i) do artigo 7.º e n.º 7 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 76/90//M), atribuem-se também, ao Comandante-geral responsabilidades sobre outras áreas relativas à segurança pública interna, nomeadamente em matéria de protecção civil em caso de calamidade pública. Parece assim ao Executivo que só o responsável pela política de segurança pública interna da RAEM está em condições de assegurar o lugar de Comandante-geral dos Serviços de Policia Unitários nas ausências e impedimentos deste.

A Comissão aceitou esta explicação apreciando a norma positivamente.

Artigo 6.º

A Comissão questionou o Executivo acerca da necessidade de constar nesta norma que o Subgabinete da Interpol faculta ao Comandante-geral dos SPU toda a informação relevante uma vez que, aquele Comandante tem o comando e direcção sobre a Polícia Judiciária a cuja estrutura pertence o Subgabinete da Interpol.

O Executivo esclareceu argumentando que este Subgabinete tem características muito específicas relacionadas com as funções que lhe estão atribuídas, designadamente as de assegurar as relações dos órgãos e autoridades de polícia criminal da RAEM com os gabinetes da Interpol a nível internacional. A sua inserção na Polícia Judiciária tem menos a ver com questões de ordem prática do que de ordem funcional, uma vez que apenas recebe orientações do gabinete da Interpol da China, quando antes as recebia do gabinete da Interpol de Portugal.

Assim, atentas estas especificidades, por um lado, e a necessidade de manter o Comando geral dos SPU na posse de todos os elementos que lhe permitam salvaguardar a segurança pública interna da RAEM, por outro, o Executivo considera dever prever que o Subgabinete da Interpol de Macau deve facultar directamente ao Comandante-geral dos SPU toda a informação considerada importante para a prevenção e manutenção da segurança pública de Macau, da qual ele é um dos principais responsáveis.

A Comissão entendeu, em conformidade, que os esclarecimentos prestados pelo Executivo justificam a oportunidade da norma.

Artigos 7.º 8.º e 9.º

Estas normas não suscitaram à Comissão qualquer dúvida pelo que as aprecia favoravelmente.

Artigo 10.º

A Comissão concorda com a necessidade de ser concluída, com a maior brevidade possível, a harmonização dos diplomas referentes ao sistema de segurança interna. Mas, dado o número de diplomas a alterar, o prazo de 180 dias referido no artigo 10.º suscitou algumas dúvidas no sentido de se saber se seria suficiente ou se não se daria o caso de os Serviços de Polícia Unitários estarem a funcionar sem estarem devidamente adaptados os respectivos diplomas de suporte. Por outro lado, questionou-se ainda o Executivo se não deveriam estes diplomas ser submetidos a apreciação da Assembleia Legislativa.

Acerca desta problemática, o Executivo esclareceu que os diplomas a harmonizar serão essencialmente as leis orgânicas das diversas corporações de polícia que integram o sistema de segurança pública interna da RAEM e que os trabalhos se encontram adiantados, pelo que consideram que o prazo referido neste artigo será suficiente para finalizar o trabalho. Apresentou, no entanto, uma alteração a este artigo, no sentido de ficar definido que os diplomas que carecem de ser harmonizados, após a entrada em vigor desta lei, são tão só as leis orgânicas dos organismos policiais que integram o sistema de segurança pública interna da RAEM.

A Comissão entende que, existindo na proposta de lei alguma indefinição de conceitos e falta de objectividade relativamente à subordinação hierárquica entre os diversos intervenientes destes Serviços de Polícia Unitários, devem ficar definidas com clareza, nos regulamentos administrativos a que nos estamos a referir, as competências, em matéria de impugnação graciosa, de cada responsável dentro da hierarquia dos diversos órgãos que integram o sistema de segurança interna da RAEM. É extremamente importante que esta clarificação seja feita com o maior cuidado, a fim de, tendo em conta os corolários da segurança e certeza jurídicas, se saber exactamente quem é que tem competência para decidir dos actos praticados neste âmbito que sejam susceptíveis de impugnação administrativa. Recomenda, pois, ao Executivo, a maior urgência na regulamentação desta matéria.

Artigo 11.º

A Comissão considerou que esta norma deveria prever quem, de entre os elementos dos SPU, deveria gozar da qualidade de autoridade de polícia criminal ou então, ser excluída do corpo da lei. Este entendimento decorre do facto de parecer à Comissão que a atribuição desta qualidade se deve revestir do maior cuidado, atento o facto de, quem dela estiver imbuído, poder praticar actos que são normalmente da competência das autoridades judiciárias. Por outro lado, e caso o Executivo assim o não entendesse, então a norma careceria de oportunidade de constar deste articulado, pois estar-se-ia a sancionar uma situação e a criar um precedente para que matéria desta importância seja tratada através de regulamento administrativo e não de lei.

O Executivo compreendeu as objecções da Comissão e propôs uma alteração à norma, ficando a prever a mesma que ao Comandante-geral dos SPU é atribuída a qualidade de autoridade de polícia criminal.

Artigo 12.º

Esta norma foi alterada pelo Executivo, uma vez que o texto inicial apontava a data de 1 de Janeiro do corrente ano como prazo para a produção de efeitos da lei, prazo este, nesta data, largamente ultrapassado. O Executivo propôs que a lei entre em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação, alterando a norma em conformidade.

 

III - CONCLUSÃO

Apreciada e analisada a proposta de lei, a Comissão é de parecer que aquela reúne os requisitos necessários para apreciação, na especialidade, em Plenário.

Macau, aos 12 de Janeiro de 2001.

A Comissão, Leong Heng Teng (Presidente) –– Ng Kuok Cheong –– Au Chong Kit, aliás, Stanley Au –– Cheng Vai Kei –– Leonel Alberto Alves –– Vong Hin Fai (Secretário).