2.5 Poluição sonora

 

RELATÓRIO

 

Assunto: reunião realizada a 27.02.2002 com membros do Executivo da RAEM para discussão e análise de assuntos relativos à poluição sonora.

 

I

A 2.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa convidou o Executivo da RAEM para uma reunião, a fim de discutir com os membros daquele a problemática relativa à poluição sonora. Entendeu a Comissão - face aos problemas de poluição sonora existentes em Macau que têm gerado inúmeras queixas da população - ouvir os órgãos do Governo com responsabilidades na matéria, com vista a ser esclarecida acerca das medidas que o Executivo se propõe implementar com vista à resolução do problema. A preocupação da Comissão decorre do facto de se verificar o aumento, em número e em intensidade, das fontes de poluição sonora com consequências cada vez mais nefastas para a saúde da população e para o ambiente urbano. Por outro lado, e não obstante a degradação da qualidade de vida dos cidadãos sujeitos a um ambiente urbano deteriorado, as Linhas de Acção Governativa para o ano 2002 não eferem a implementação de medidas significativas em matéria de política do ambiente. A Comissão entende que a política do ambiente pode e deve constituir um elemento importante da especificidade de Macau e, por isso, revestir uma importância estratégica para o seu futuro e o da sua população. A Comissão está consciente que existe legislação apropriada em matéria de poluição sonora, parecendo no entanto que a sua aplicação se depara com vários obstáculos a que acresce a falta de monitorização dos seus resultados. Neste sentido, gostaria de saber quais os motivos que levam à não resolução dos problemas de ruído ambiental; se se deve a qualquer lacuna existente na legislação actualmente em vigor ou à falta de meios humanos e técnicos para implementarem e fiscalizarem o seu cumprimento. Gostaria ainda de ser esclarecida acerca dos processos de licenciamento dos estabelecimentos geradores de poluição sonora e dos meios de que o Executivo dispõe para fiscalizar a sua actividade, nomeadamente no controlo do ruído ambiental.

Ainda neste âmbito, a Comissão quer saber qual o calendário do Executivo para a implementação das medidas que se impõe sejam tomadas com vista a prevenir e a controlar este fenómeno.

Ao convite da Comissão respondeu o Executivo com uma ampla delegação, que se deslocou à Assembleia Legislativa. Assim, estiveram presentes na reunião o Presidente do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, a Presidente substituta do Conselho do Ambiente, o subdirector da Direcção dos Serviços de Turismo, um chefe de divisão da Direcção dos Serviços de Turismo, um chefe de divisão e dois juristas do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais.

Esteve ainda presente, por parte da Assembleia Legislativa, o deputado Au Kam Sam.

O presidente do Instituto para os Assuntos Cívicos, e Municipais fez uma breve apresentação do problema, referindo que a questão da poluição sonora e o seu controlo implicam o envolvimento de vários serviços públicos, sendo diversas as competências de cada um nesta matéria. O IACM promoveu uma reunião com a Direcção dos Serviços de Obras Públicas com o objectivo de fazerem um levantamento exaustivo dos problemas existentes, com vista a encontrar soluções que levem à sua resolução. Solicitou neste âmbito, ao subdirector dos Serviços de Turismo, que fizesse uma apresentação do trabalho desenvolvido por este organismo durante os últimos dois anos.

Este responsável fez uma explanação das competências do serviço que dirige no âmbito do licenciamento administrativo dos estabelecimentos hoteleiros e similares e da fiscalização desses mesmos estabelecimentos. A competência para intervir no licenciamento dos estabelecimentos similares que congregam para além de outros estabelecimentos as salas de dança e os bares, encontra-se prevista no Decreto-Lei n.º 16/96/M. Assim, antes de ser emitida qualquer licença para aqueles dois tipos de estabelecimentos (que serão os maiores geradores de ruído ambiental que agora nos ocupam) a DST deve solicitar os pareceres das entidades com competências nas áreas urbanística, sanitária e de segurança contra incêndios, ou seja, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, os Serviços de Saúde de Macau, o Corpo de Bombeiros e o Corpo de Polícia de Segurança Pública. Só após a emissão dos pareceres de todas estas entidades e se os mesmos atestarem a conformidade do estabelecimento aos requisitos exigidos pela lei é que a DST emitirá a respectiva licença. Posteriormente, caberá a esta Direcção dos Serviços fazer a fiscalização do estabelecimento.

Quanto ao controlo dos equipamentos é feito pelo IACM em colaboração com a DST. No que respeita ao controlo do ruído é feito de acordo com o previsto no Decreto-Lei n.º 54/94/M, intervindo na medição deste o IACM e a DST. Com base nestas medições, se o nível do ruído for superior aos valores previstos na Portaria n.º 241/94/M que aprovou a Norma sobre Acústica prevista naquele Decreto-Lei, há lugar à aplicação das multas ali estipuladas. No entanto, existem muitas dificuldades na medição do ruído, uma vez que quando se vão fazer as medições é necessário ter em conta diversos factores, como sejam o ruído do próprio edifício, o ruído de fundo, etc. Face a estas dificuldades foi solicitado ao Laboratório de Engenharia Civil que elaborasse recomendações com soluções técnicas de isolamento a ter em conta aquando da "construção" deste tipo de estabelecimentos. Assim, desde Janeiro de 2001 que a DST entrega a todos os donos de salas de dança, bares e "karaokes" as recomendações daquele Laboratório e que consistem essencialmente na introdução, nas instalações destes estabelecimentos de tectos falsos, pinturas absorventes do ruído, materiais isolantes, etc.

Os responsáveis do Governo referiram ainda que a aplicação da Portaria 241/94/M acarreta vários problemas, uma vez que contém regras de difícil aplicação prática face ao ambiente urbano de Macau. Desde logo, existem discrepâncias entre esta e o Decreto-Lei n.º 54/94/M no que se refere à definição do conceito de ruído de fundo que não é a mesma nos dois diplomas. Esta discrepância leva a que o que pode ser considerado ruído de fundo ao abrigo do Decreto-Lei n.º 54/94/M pode não o ser segundo o conceito estipulado na Portaria n.º 241/94/M.

Por outro lado, esta Portaria apenas se refere à transmissão de ruídos por meio aéreo, ficando sem se saber se a transmissão de ruído por meios sólidos (por exemplo, as paredes), também é abrangida .

Acresce ainda que, a medição de ruído no interior dos espaços objecto de fiscalização tem de ser feita com três aparelhos específicos, a fim de ser obtido um valor médio. No entanto, considerando a reduzida dimensão dos espaços em Macau, é difícil trabalhar com estes três objectos em simultâneo nas condições estipuladas naquela Portaria e que obrigam à observação de um determinado espaço (1,0 m) entre os aparelhos e as paredes, e entre os aparelhos e o pavimento (1,2 e 1,5 m). A fim de obviar a esta dificuldade, o Conselho do Ambiente, em Outubro de 2001, emitiu instruções no sentido de, quando não for possível utilizar os três aparelhos ao mesmo tempo, utilizar apenas os possíveis, respeitando no entanto as condições de medição quanto às distâncias previstas na Portaria. Este método encontra-se a ser testado.

Existe ainda o problema com o conceito "percursões" previsto no ponto 11.3.1 da Portaria 241/94/M, uma vez que não existe uma definição clara do que deve ser considerado neste termo. Esta falta de rigor na definição é importante, uma vez que se o ruído for considerado proveniente de "percursões" é feita correcção na medição de mais 5db (décibeis).

Outra dificuldade com que os técnicos responsáveis pela medição do ruído se conrontam tem a ver com o valores de ruído previstos no n.º 3, do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 54/94/M. Assim, quando o valor do nível sonoro contínuo equivalente ponderado A (Leq (A) ) é superior ao valor do nível sonoro do ruído de fundo que é excedido num período de referência em 95% da duração deste (L95) em 10 décibeis, considera-se que é produzido ruído perturbador. Ora, este valor, considerando as características de Macau, é facilmente ultrapassado, o que pode ser um factor de injustiça para os estabelecimentos sujeitos a fiscalização.

A Presidente do Conselho do Ambiente referiu que o Decreto-Lei n.º 54/94/M foi elaborado de acordo com a situação de poluição sonora existente no ano da sua publicação. Os critérios de medição alí previstos são os utilizados a nível internacional. No entanto, a situação no Território alterou-se com o aumento das fontes de poluição sonora. Esta situação é tanto mais evidente quanto de 1995 a 1998 as queixas devidas a problemas de ruído foram muito poucas, tendo aumentado vertiginosamente de 1999 a 2001, em que se verificaram 2883 queixas. As causas motivadoras das queixas são sobretudo os "karaokes", música, barulho na rua, barulho dos carros, conversas e ruído devido aos jogos de majongue. As queixas, como é normal, são sobretudo à noite, verificando-se neste período uma incidência de 90%.

O problema da poluição sonora, referiu esta responsável, tem de ser resolvido tendo em conta a fonte do ruído. Neste sentido, está o Conselho do Ambiente a fazer um inquérito em toda a cidade de Macau, para determinar com clareza as principais fontes de ruído ambiental. Só após a conclusão do inquérito e a análise dos dados recolhidos é possível proceder a alterações ao regime jurídico que regulamenta esta matéria. É uma tarefa difícil tendo em conta as especificidades de Macau que é uma cidade pequena, com uma grande densidade demográfica, a que é inerente um parque automóvel grande e onde o planeamento urbanístico está sujeito a múltiplas pressões.

No que se refere à fiscalização dos níveis de ruído, o Presidente do IACM referiu que as dificuldades não resultam só dos critérios estabelecidos na Portaria 241/94/M, que obedece a critérios internacionalmente reconhecidos. A questão, referiu, é um pouco mais complicada, uma vez que a medição é feita à posteriori A equipa que se desloca ao local é constituída por várias pessoas que devem ter determinados conhecimentos técnicos para fazerem a medição. Normalmente quando a equipa se desloca, a situação que gerou a queixa e que determina a intervenção da equipa de fiscalização já não existe ou porque os infractores foram avisados que a equipa vai a caminho ou porque pura e simplesmente a fonte geradora do ruído cessou. A poluição sonora não é equiparável à poluição atmosférica. Cessando o ruído cessa a poluição. Ora, não é possível fazer chegar ao local qualquer equipa em menos de 45 minutos, o que é tempo suficiente para que a situação geradora da infracção deixe de existir e não é possível fazer a medição à posteriori. A Polícia debate-se com o mesmo problema, uma vez que só após receber a queixa se desloca ao local, o que pode levar entre 45 minutos e uma hora. A medição do ruído à posteriori não é susceptível de ser apresentada como prova, uma vez que as condições em que é feita podem alterar completamente os valores daquele.

Outra vertente do problema tem a ver com o número de bares por rua. Obviamente que quanto mais bares e salas de dança houver mais ruído haverá, mas também não é viável limitar o número destes estabelecimentos, uma vez que sendo Macau uma cidade de turismo é necessário que seja dotada destes equipamentos. O problema tem de ser analisado de várias perspectivas.

Neste momento, a fiscalização à posteriori passa pela verificação do som produzido pelas máquinas em funcionamento e pela calibragem do equipamento no sentido de verificar se é o mesmo que consta do processo de licenciamento. Em caso de discrepância procede-se à autuação do infractor.

A Comissão quis saber se o Conselho do Ambiente já analisou os problemas quanto à medição do ruído, apresentados pelo IACM, e se tem algumas soluções para obviar a essas dificuldades. Desejou igualmente saber se existe enquadramento legal para as queixas apresentadas pelos cidadãos. Por outro lado, questionou os responsáveis presentes sobre a possibilidade de ser criada uma equipa técnica dentro da PSP para proceder à medição acústica e se haveria algum estudo sobre o custo que esta equipa acarretaria para os cofres públicos. Adiantou, ainda, que o problema tem necessariamente que ser resolvido, uma vez que com a liberalização do sector do jogo a tendência será para haver cada vez mais estabelecimentos a funcionar durante as 24 horas do dia. Em sua opinião, deve dar-se especial atenção ao planeamento urbanístico no sentido de, no futuro, a instalação destes estabelecimentos ser autorizada em zonas fora dos bairros residenciais.

Relativamente aos problemas de ruído que decorrem da utilização do Porto Interior, nomeadamente da utilização das pontes-cais, assunto que mereceu tratamento na Ordem Executiva n.º 5/2002, quis saber se existem entidades envolvidas na fiscalização do cumprimento do preceituado nesta Ordem Executiva e se o Conselho do Ambiente foi ouvido aquando da sua elaboração. Questionou ainda esta entidade acerca da sua capacidade técnica para intervir nesta matéria, caso seja chamada a fazê-lo.

Relativamente a toda esta problemática foi referido que o Decreto-Lei n.º 54/94/M, que estabelece as normas a aplicar na prevenção e no controlo do ruído ambiental, apenas se encontra a ser aplicado nos dois últimos anos. No entanto, face à relevância que este assunto assumiu, os diversos organismos da Administração encontram-se a estudar, em conjunto, soluções que possam resolver ou atenuar o problema da poluição sonora, que é sentido com mais acuidade em Macau. Quanto à equipa sugerida pela Comissão seria difícil proceder à sua criação imediata, uma vez que não existem meios para tal. Por outro lado, a experiência demonstra que a eficácia destas equipas é reduzida. No que se refere ao limite de ruído é muito difícil determinar qual o limite razoável para impor como média de ruído e se proceder às medições. Na fase actual, encontram-se a estudar várias soluções que passam por aplicar as medidas previstas actualmente nas leis em vigor, por criar equipas que possam actuar em tempo útil para procederem à medição do ruído ou ainda continuar a utilizar os limites máximos de ruído previstos na Portaria 241/94/M. Ainda não foi possível concluir quais das medidas devem ser aplicadas. No entanto, referiram, das 2800 queixas recebidas, 1000 tiveram como alvo um só estabelecimento, o que leva a que a dimensão do problema tenha de ser devidamente equacionada, reduzindo-o à sua verdadeira dimensão.

No que se refere à Ordem Executiva sobre a utilização das pontes-cais do Porto Interior, o Conselho do Ambiente foi ouvido e deu parecer sobre o assunto. recomendando que fosse utilizado equipamento adequado à redução do ruído.

Quanto ao aumento de estabelecimentos decorrente da liberalização do sector do jogo e que poderão funcionar durante 24 horas, a DST está a estudar a alteração do Decreto-Lei n.º 16/96/M, que regulamenta o licenciamento das actividades hoteleiras e similares, no sentido de incluir no âmbito deste normativo o licenciamento dos "karaokes", uma vez que a experiência demonstra que, muitas vezes, estes estabelecimentos não se enquadram na finalidade para que foram licenciados. Assim, verifica-se que muitos estabelecimentos licenciados como "karaokes" funcionam como bares, como discotecas, bares com música ao vivo, etc, sendo por isso fontes geradoras de muito ruído, o que não se verificaria se funcionassem apenas como "karaokes". Para além desta medida, ou seja, de sujeitar os "karaokes" às normas de licenciamento dos bares e discotecas, está igualmente a estudar-se a possibilidade de prever a consagração legal de medidas técnicas de isolamento a serem obrigatoriamente observadas na construção dos bares, discotecas, "karaokes" e estabelecimentos similares. Está igualmente a equacionar-se a introdução de medidas específicas relativamente ao controlo do som dos equipamentos sonoros destes estabelecimentos. No entanto, não obstante a implementação destas medidas, não é possível garantir a 100% a eliminação do ruído:

A Comissão questionou os responsáveis do Executivo acerca das medidas que é usual serem tomadas acerca do ruído originado pelas conversas dentro das habitações e se no caso das "rave-parties" é adoptado algum procedimento espeçial para minorar os efeitos do ruído causado por estas.

Acerca destes problemas, nomeadamente do ruído qentro das habitações, o Presidente do IACM referiu que a esta questão do ruído é inerente alguma subjectividade. Assim, o que para uma pessoa pode constituir motivo de incómodo para outra já o não é. Quanto à fiscalização do ruído causado pelas conversas é feita pela PSP e pelos funcionários do IACM. Mas, mesmo nestes casos, as dificuldades para se fazer a fiscalização existem, pois se recebem uma queixa e entram no edifício pela porta principal é certo e sabido que quando chegam à residência o ruído que motivou a queixa já não existe, uma vez que o porteiro se encarregou de avisar as pessoas da presença da equipa de fiscalização.

No que se refere às "rave-parties", os inspectores deslocam-se para inspeccionar o horário de funcionamento do estabelecimento que não pode ultrapassar a meia-noite.

O responsável dos Serviços de Turismo referiu que quando se coloca a questão da renovação das licenças é sempre considerado se o estabelecimento em causa viola algumas das regras previstas no artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 47/98/M, que regula o licenciamento dos "karaokes". Caso se conclua que, efectivamente, a actividade do estabelecimento viola o alí previsto, nomeadamente causando perturbação da ordem, segurança ou tranquilidade públicas ou cause grave inconveniente para a saúde pública, a licença não é renovada. Este responsável referiu ainda que das 36 queixas que a DST recebeu em 2001, fundamentadas em poluição sonora, apenas 2 se concretizaram efectivamente como sendo decorrentes de problemas de ruído. Todas as outras tinham a ver com o funcionamento ilegal dos estabelecimentos. Foi ainda referido que a DST não limita a sua acção fiscalizadora apenas quando há queixas dos cidadãos fazendo também fiscalizações periódicas aos estabelecimentos sob a sua alçada. No entanto, esta fiscalização incide apenas sob a prevenção de incêndios, a saúde pública e os cheiros e óleos. No que se refere à poluição sonora ‘actuam apenas mediante queixa, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 54/94/M.

Os deputados presentes na reunião, face às responsabilidades que têm perante os cidadãos, quiseram saber qual é o calendário do Executivo para proceder às diversas alterações da legislação que foram mencionadas, no decorrer da reunião, uma vez que parece claro que alguns diplomas necessitam de reajustamentos.

A Presidente do Conselho do Ambiente referiu que se encontram neste momento a recolher dados de diferentes países e territórios sobre os níveis de ruído para poderem determinar qual o critério adequado para Macau, julgando poder fazer esta recolha até ao fim do presente ano. Quanto à restante legislação, encontra-se neste momento a ser analisada e equacionadas as alterações a introduzir. Por outro lado, o subdirector dos Serviços de Turismo mencionou que se encontra em estudo a inserção dos "karaokes" no regime de licenciamento das actividades hoteleiras e similares e ainda a alteração da lei no sentido de tornar obrigatória a inclusão de materiais isolantes na arquitectura e decoração dos bares, discotecas, salas de dança e afins. Esta é, no entanto, uma actividade complexa que necessita de téçnicos especializados em diversas matérias, referiram.

 

II

A Comissão considera que a qualidade do ambiente é uma questão estratégica para Macau e que deve por isso constituir uma prioridade do Governo. Sendo o turismo um dos motores principais da economia do Território e quando se pretende que este sector assuma uma importância cada vez maior no seu futuro, a preservação de um ambiente urbano de qualidade deve merecer, da parte das autoridades com responsabilidades na matéria, uma atenção acrescida. Para além deste factor devem ser criadas as condições que permitam aos cidadãos de Macau viver na sua cidade num ambiente confortável e despoluído.

A Comissão tem consciência de que este objectivo se confronta com características intrínsecas próprias do Território, como sejam uma natureza fortemente urbanizada e densificada. Verifica-se assim que, não obstante os progressos que têm sido feitos, nomeadamente com a criação de zonas industriais especificas ainda subsistem, lado a lado, zonas habitacionais, industriais e comerciais com uma densidade que ultrapassa o que seria razoável permitir mesmo numa cidade com uma concentração demográfica tão densa como é Macau.

Não obstante as dificuldades inerentes à criação de um bom ambiente urbano decorrentes das especiais características do Território, entende a Comissão que na área da poluição sonora – que é a que agora nos ocupa – existe legislação com base na qual é possível promover um ambiente sonoro de qualidade.

Assim, existem diplomas legais que cobrem os problemas do ruído de obras e respectiva maquinaria, aparelhos de climatização e ventilação de ar, espectáculos, indústria, comércio e serviços, do ruído ocupacional, do ruído associado à utilização dos veículos motorizados, do ruído produzido pelos sistemas sonoros de alarme contra intrusão em residências e estabelecimentos, estando também estabelecido um limite horário de restrição à produção de ruídos que decorre entre as 20h e as 8h.

Mau grado o quadro normativo existente e que é relativamente moderno, a Comissão considera que subsistem algumas fragilidades que importa superar.Verifica-se assim que, o Decreto-Lei n.º 54/94/M, que estabelece as normas a aplicar na prevenção e controlo do ruído ambiental e define os diferentes tipos de ruído, assim como a Portaria n.º 241/94/M que aprovou a Norma sobre Acústica, com base na qual são feitas as medições do ruído, estabelecem valores que, considerando o explanado pelos responsáveis do Governo, parecem ser demasiado exigentes portanto pouco exequíveis para a realidade da vida urbana de Macau, que tem tendência para ser ruidosa. Parece, pois, impor-se a revisão da Norma sobre Acústica consagrada naqueles diplomas de forma a tornar a sua aplicação exequível. A revisão desta Norma encontra-se, aliás, prevista na Portaria n.º 241/94/M, que dispõe, no artigo 2.º que a Norma sobre Acústica deve ser revista no prazo máximo de 2 anos. Por aqui se vê que o legislador da altura, tinha consciência da necessidade de adaptação dos valores e definições de ruído alí previstos ao ambiente sonoro de Macau. Acresce ainda que, o preambulo do Decreto-Lei n.º 54/94/M, refere a necessidade de ser posteriormente aprovado um regulamento geral sobre o ruído ambiental, o que não se veio a verificar. Ora, existem situações de poluição sonora (ruído de vizinhança ou seja ruído associado ao uso habitacional susceptível de causar incomodidade aos vizinhos, ruído produzido pelas infra-estruturas de transporte, pelos alarmes contra intrusão em veículos) que não se encontram previstas no actual regime legal sobre poluição sonora e que, constituindo motivo de conflitualidade social, deveria a sua prevenção e controlo merecer intervenção legislativa.

Por outro lado e a outro nível a Comissão considera que a quase completa ausência de requisitos ambientais no licenciamento, quer das actividades ligadas à industria, ao comércio e à diversão, pode criar nos agentes económicos uma atitude de desresponsabilização em matéria de protecção ambiental, nomeadamente na redução e controlo da poluição sonora. A permissividade da lei é susceptível de levar a que não sejam consideradas soluções de insonorização na construção dos edifícios que poderiam contribuir para atenuar os efeitos do ruído dentro daqueles espaços. Esta permissividade é patente no Regulamento Geral da Construção Urbana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 79/85/M, que não contém qualquer norma que obrigue à introdução de soluções com vista ao tratamento sonoro dos edifícios.

Quanto ao regime de licenciamento dos "karaokes", previsto no Decreto--Lei n.º 47/98/M, é completamente omisso em matéria de controlo do ruído como requisito para o licenciamento, contrariamente ao regime que o antecedeu (Decreto-Lei n.º 31/93/M), que previa como requisito e condição para o licenciamento a "observância das normas de controlo de poluição sonora". O regime actual limita-se a fazer o controlo à posteriori – que será bastante mais difícil – ao dispor que a autorização para o exercício da actividade é revogada sempre que se verifique "infracção reiterada (...) às normas de controlo de poluição sonora ou outras normas técnicas de protecção ambiental".

Já o Regulamento da Actividade Hoteleira e Similar, aprovado pela Portaria n.º 83/96/M dispõe de forma diferente, uma vez que exige que quer as salas de dança, quer as instalações onde seja oferecida música, "devem ser objecto de soluções técnicas de construção que limitem a passagem do ruído emitido para o exterior". Este diploma contém, no entanto, uma norma excepcional que permite que muitos destes estabelecimentos possam funcionar sem obedecerem às exigências de controlo de ruído estipuladas. O artigo 134.º da Portaria n.º 83/96/M ao dispor que os requisitos técnicos alí exigidos "não se aplicam aos estabelecimentos hoteleiros e similares já existentes à data da sua entrada em vigor, nem aos pedidos que se encontrem em tramitação" possibilita que continuem a funcionar bares e salas de dança cujas instalações não disponham de qualquer tratamento técnico de insonorização.

A Comissão considera, ainda, que o Conselho do Ambiente deve ser ouvido pelas entidades licenciadoras aquando da emissão das licenças para os estabelecimentos, assim como deve fazer parte da comissão de vistoria das instalações, não obstante esta exigência não estar consagrada nos regimes de licenciamento. A emissão de pareceres sobre pedidos de licenciamento de indústrias susceptíveis de áfectar o ambiente faz parte das atribuições do Conselho do Ambiente, conforme dispõe a alínea g), do n.º 1, do artigo 2.º da Lei n.º 2/98/M, que reestruturou o Conselho do Ambiente. Nesta medida, faz todo o sentido que esta entidade seja auscultada.

 

III

Face à inegável actualidade do assunto em causa, considera a Comissão que deve continuar a acompanhar esta problemática e que outras reuniões devem ser realizadas a fim de tomar conhecimento das medidas implementadas pelo Executivo. Entende que a questão da poluição sonora, que tem efeitos nefastos na saúde e no bem estar da população, deve merecer a atenção do Executivo e que este deve tomar as medidas apropriadas para, se não resolver, pelo menos melhorar a situação. Estas medidas são tanto mais necessárias quanto o período que se avizinha, com a abertura de novos casinos como consequência da liberalização do sector dos jogos de fortuna e azar, trará problemas acrescidos de ruído ambiental se não forem tomadas as medidas apropriadas.

Nesta conformidade, a Comissão considera que a actuação do Executivo deve incidir nas seguintes áreas:

- planeamento urbanístico, afastando das zonas residenciais bares, "karaokes", salas de dança e outros estabelecimentos susceptíveis de serem fontes de poluição sonora;

- introdução da obrigatoriedade de serem utilizadas técnicas e materiais na construção e decoração capazes de insonorizar, tanto quanto seja tecnicamente possível, os estabelecimentos em questão;

- imposição do controlo do ruído como um dos elementos essenciais para o licenciamento de qualquer instalação susceptível de ser fonte de poluição sonora;

- definição de critérios de medição do ruído consentâneos com as características do Território;

- estipulação da obrigatoriedade de o Conselho do Ambiente ser ouvido nos processos de licenciamento dos estabelecimentos similares considerados como tais pelo regime de licenciamento previsto no Decreto--Lei n.º 16/96/M e nos processos de licenciamento dos "karaokes";

- criaxão de campanhas na comunicação social de forma a sensibilizar a população para a questão do ruído, incentivando hábitos de respeito e boa convivência entre a vizinhança;

- divulgação da legislação existente em matéria de ruído ambiental de forma a consciencializar os cidadãos sobre os seus direitos e obrigações;

- melhoramento do regime jurídico vigente de forma a corrigir as insuficiências entretanto detectadas, nomeadamente ao nível da construção urbana, do licenciamento dos estabelecimentos cujas actividades são geradoras de ruído ambiental e do regime sobre a prevenção e controlo do ruído ambiental.

Macau aos 12 de Abril de 2002.

A Comissão, Leong Heng Teng (Presidente) — Cheong Vai Kei —Leong lok Wa — Kuan Tsui Hang — Jorge Manuel Fão — Au Chong Kit aliás Stanley Au — Ng Kuok Cheong — Vong Hin Fai (Secretário).